Intervenção da Deputada
Odete Santos

Regime de organização e funcionamento das actividades
de segurança, higiene e saúde no trabalho

2 de Fevereiro de 2001

Sr. Presidente,
Srs. Secretários de Estado,
Srs. Deputados,

Numa intervenção muito breve, gostaria de dizer que os dois diplomas ora em discussão têm de ser apreciados no seu conjunto, embora nós apenas apresentemos alterações ao Decreto-Lei n.º 110/2000, que cremos resolverem o problema que nos foi apresentado.

Concretamente, os pontos que suscitaram protestos da parte de alguns técnicos de segurança do trabalho foi a redacção do n.º 4 do artigo 18.º e do artigo 20.º.

A situação é a seguinte: por um diploma anterior, cujo artigo 30.º foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 109/2000, técnicos, alguns deles já há 40 anos nessa profissão, não tendo uma licenciatura ou um bacharelato - aliás, este diploma nem sequer exige que seja uma licenciatura em matéria de trabalho, podendo ser um curso de matemática, por exemplo -, verificam que os licenciados ou bacharelados com três ou cinco anos de exercício de actividade teriam direito a ser classificados como técnicos superiores de segurança e higiene do trabalho.

Ora, por causa destas normas constantes do artigo 18.º, algumas dessas pessoas, muitas delas com 40 anos de profissão, quer trabalhando em serviços internos quer trabalhando nos serviços externos de empresas, vêem vedada a possibilidade de requererem e verem conseguida a sua certificação. A não ser que seja efectivamente entendido pelos técnicos da inspecção do trabalho que eles possuem conhecimentos e habilitações práticas para conseguirem a categoria correspondente às funções que vêm exercendo há longuíssimos anos, caso em que é passada a referida certificação.

Como é evidente, entendemos que esta avaliação deve ser rigorosa. Aliás, tal como referimos ontem em declaração política sobre matéria de sinistralidade laboral e de prevenção, pensamos, efectivamente, que deve haver rigor na avaliação e que o Governo deve promover, de facto, cursos de formação complementar da prática que as pessoas têm para que elas apurem os seus conhecimentos.

Mas não consideramos que só pelo facto de as pessoas não terem uma licenciatura ou um bacharelato qualquer se deve concluir que já não podem aceder à categoria de técnicos superiores de segurança e higiene do trabalho. Aliás, creio que, neste país, há apenas um instituto, se não me engano, na Maia, que dá formação nesta matéria de segurança e higiene no trabalho, o que é, obviamente, muito pouco.

Ainda em relação às pessoas que não têm uma licenciatura ou um bacharelato - e algumas até se inscreveram nesse curso leccionado no instituto da Maia, mas ainda não o completaram, e só por isso também não podem ter a categoria de técnicos superiores de segurança e higiene do trabalho -, pensamos que, a nível do artigo 20.º, deve ser incluída também uma alteração, para que, desde que as pessoas provem que estão inscritas num curso a fim de tirarem uma licenciatura ou um bacharelato ou que reingressaram nesse curso até ao final do ano 2001, lhes seja passada, como aí está dito em relação às pessoas referidas no artigo 18.º, e que necessitem da formação complementar, uma autorização provisória para o exercício de funções como técnicos superiores de segurança e higiene do trabalho por um período máximo de quatro ou sete anos, consoante se trate de bacharelato ou de licenciatura.

A nível do artigo 18.º, n.º 4, a exclusão de pessoas que estão, algumas há 40 anos, a exercer as funções que agora se chamam de técnicos superiores de segurança e higiene do trabalho resulta, efectivamente, da exclusão da alínea c) da possibilidade de terem essa classificação de técnico superior.

Assim, como reflexão final, deixaria o seguinte: os saberes que as pessoas adquirem durante a sua prática e a sua experiência valem, efectivamente, muito e têm um capital acumulado.
O autodidatismo foi, durante muitos anos, de facto, uma menção honrosa em relação às pessoas consideradas autodidatas. Até temos experiências interessantes de autodidatismo através das universidades populares Bento de Jesus Caraça.

Creio que, tal como aqui está, embora, de qualquer forma, se tenha alguma contemplação em relação a estes trabalhadores neste segundo diploma, não há justiça na discriminação que se faz de alguns.

Assim, vou entregar a Mesa as propostas que anunciei nesta minha intervenção.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados

Gostaria de referir ainda um aspecto relacionado com a intervenção do Sr. Deputado Gonçalo Velho, que não ouviu o que eu disse ou, então, ouvindo, já tinha escrito o seu discurso em casa e, por isso, não soube alterá-lo na altura, de forma a adequar a sua intervenção ao que eu tinha dito.

Quero dizer que existe um manual, chamado Manual do Estaleiro, usado no instituto que dá formação na área da segurança no trabalho e no próprio IDICT, cujo autor, se ainda fosse técnico superior de segurança e higiene do trabalho (hoje já não exerce essas funções, mas já exerceu), ficaria no nível 3 de qualificação, embora tenha elaborado manuais que são utilizados oficialmente para ministrar formação.

Concordamos com estes diplomas em muitos outros aspectos, como, por exemplo, no rigor, mas o importante era que o Governo desse, de facto, formação profissional, que não dá, porque não tem cursos de formação profissional para estas áreas - ou, se tem algum, não é em número suficiente. Aliás, nem sequer existem inspecções de trabalho em quantidade suficiente para fiscalizarem o que se passa nas empresas.

Quanto à maior parte do diploma, estamos de acordo, mas ao invés de virem aqui dizer que o mesmo, em relação a esta matéria específica, promove a competência, vejam se entendem o exemplo que o Sr. Deputado Arménio Santos citou e que vem no artigo do tal senhor que hoje já não é técnico superior de segurança e higiene do trabalho mas que é autor do Manual do Estaleiro!

O que consta do diploma é o seguinte: se um formado ou bacharelado em direito quiser ser técnico superior de higiene e segurança do trabalho e não tem o tempo mínimo de exercício efectivo das funções, os tais três anos, ou, pior do que isso, se lhe fizeram uma avaliação curricular e consideraram que, de facto, não respeitava as condições, então, o que faz? Usando o famoso artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 110/2000, de 30 de Junho, de que temos estado a falar, e o n.º 3 do artigo 18.º - porque pode ter prestado provas de avaliação, segundo o n.º 2 do artigo 18.º, por não reunir os requisitos de tempo exigidos, os três anos de prática, e ter chumbado (não é uma avaliação curricular) -, pede uma autorização provisória para exercer a função de técnico superior de higiene e segurança do trabalho na empresa. E é-lhe dada autorização provisória!

É assim que se promove a competência em relação a uma pessoa que foi chumbada numa avaliação e que vai exercer as funções? Não é, Sr. Secretário de Estado!