Intervenção da Deputada
Odete Santos
Declaração Política
sobre acidentes de trabalho
e doenças profissionais
1 de Fevereiro de 2001
Senhor Presidente
Senhores Deputados
Acidentes de trabalho brutais irrompem com frequência nas notícias, não sendo possível esconder com o malabarismo dos números as más condições de trabalho de que dispõem os trabalhadores portugueses. Sobretudo no Norte, na Região de Lisboa e Vale do Tejo, nos Distritos do Porto, Lisboa e Aveiro.
O próprio Governo se vê obrigado a reconhecer que as coisas vão mal em matéria de prevenção.
E tanto assim é que os Jornais noticiaram no início do ano que o Governo assumira o compromisso com os parceiros sociais, de diminuir o número de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
Mas chega tarde o Ministério do Trabalho.
É que a situação da vitimização resultante do infortúnio laboral arrasta-se há longos anos e o PCP denunciou-a por diversas vezes.
Perante a própria Agência Europeia para as questões de Saúde e Segurança no Trabalho, o Governo reconheceu que a situação em Portugal necessitava de ser alterada.
E apesar de tudo isto, apesar das reivindicações dos trabalhadores sobre as condições de trabalho, como acontece, por exemplo com o caderno reivindicativo dos trabalhadores da Somincor, muito pouco se fez para debelar o flagelo, e muito se tem feito, objectivamente, para criar as condições que levam ao aumento da sinistralidade laboral. Referimo-nos ao trabalho precário apontado num Estudo da Agência Europeia referida, como causador de más condições de saúde. Referimo-nos ao aumento alucinante dos ritmos de trabalhado exigido em nome da competitividade sem respeito pelo ser humano. Aos períodos longos de duração de trabalho, entre os quais a Agência situa os períodos de duração de trabalho de 40 horas. Referimo-nos ao trabalho clandestino de que são vítimas os imigrantes. Referimo-nos ao trabalho sem direitos que grassa em Portugal, que, claro, não destoa da União Europeia.
Tudo isto, com a inexistência de uma verdadeira política de prevenção, e com a ineficácia da Inspecção de Trabalho, com o facto de ainda ser mais barato reparar do que prevenir, agrava a situação da sinistralidade laboral.
Depois de longos anos de protestos contra a iniquidade resultante da legislação laboral da década de 60, depois de lutas dos trabalhadores a que o PCP deu voz com os vários projectos de Lei para alteração das leis em vigor, a Assembleia da República aprovou finalmente em 1997, uma nova lei. Com alguns aspectos positivos, é certo, mas com injustiças que, logo na altura denunciámos.
Porque visavam, tão só, proteger os interesses das seguradoras.
Sendo sintomático que o tratamento desta questão se situe no Ministério das Finanças, sem que o Ministério do Trabalho assuma o protagonismo que deveria ter nesta matéria, já que, para mais, também da solidariedade traz o nome.
É certo que na regulamentação, o Governo acabou por aceitar uma ou outra solução, que logo quisemos exarar, por via das dúvidas, na lei em debate.
Como o pagamento do subsídio de férias e do subsídio de Natal aos trabalhadores. Proposta contra a qual o Partido Socialista votou. Leia-se o Diário da Assembleia, e a elucidação será completa sobre as posições dos socialistas.
Mas é verdade que muitas das soluções hoje em vigor tiveram
por horizonte os lucros das seguradoras que não os dramas dos trabalhadores
e das suas famílias.
As pensões das vítimas do trabalho continuam baixas.
Em primeiro lugar porque os salários dos trabalhadores portugueses são baixos. São os mais baixos da Europa da União.
E o Governo parece apostado em manter a situação de degradação salarial.
Bastando-lhe em certas situações, ser abstencionista, e alhear-se da sorte da contratação colectiva.
É o que se passa, por exemplo, no sector têxtil. O impasse a que se chegou no processo de negociação colectiva, recomendaria medidas urgentes, ainda que no quadro de uma lei de contratação colectiva desfigurada, para garantir uma digna sobrevivência dos trabalhadores. Para lhes garantir direitos humanos radicados na dignidade do ser humano.
Percebe-se em que redundam algumas das disposições da nova legislação sobre a reparação do infortúnio laboral. Percebe-se que as seguradoras conseguiram segurar o ramo acidentes de trabalho nas suas mãos. Segundo elas teria sido uma atitude benfazeja.
É que nas audições havidas na Comissão de Trabalho que antecederam a aprovação da lei de 97, repetidamente afirmaram que o ramo lhes dava prejuízo, e que era o ramo de vida que lhes dava lucros.
Eis senão quando, em finais do ano passado, conforme noticiado pela comunicação social, a Associação Portuguesa de Seguradores, divulgou que o melhor desempenho a nível do ramo segurador, se registou no segmento dos acidentes de trabalho, que passou de uma produção de 81,4 milhões de contos nos primeiros 10 meses de 99, para uma produção de 108 milhões de contos em período homólogo do ano 2000. Afinal havia lucros.
É claro que as Seguradoras contaram, entretanto, com o adiamento da entrada em vigor da legislação, tendo o Governo aprovado um diploma - O Decreto-Lei 382-A/99 para que a mesma só entrasse em vigor em 1 de Janeiro de 2000, mais de 1 ano depois do consagrado em lei.
Quer dizer que foi muito mais tarde que os trabalhadores puderam contar com a melhoria das pensões.
E as seguradoras também contaram com uma sombra benfazeja quando viram garantida a obrigatoriedade de remição de maior parte das pensões: As relativas a desvalorizações até 30%.
Os trabalhadores são assim mercadoria descartável. E por baixo preço.
É que, para cálculo da remição, construíram-se bases técnicas com base numa tábua de mortalidade de 88/90, considerando-se uma taxa ténica de juro baixíssima- 5,25%.
Como agora é maior a esperança de vida, porque as reservas matemáticas são calculadas visando o ramo vida, a tabela é agora mais baixa do que o era a tabela que esteve em vigor desde 1971 até 1985.
Mas esta é uma filosofia incorrecta para o ramo acidentes de trabalho. Porque a remição obrigatória vai dar-se quando os trabalhadores têm agora mais anos de vida do que tinham na década de em 1971.. Portanto, se a remição não fosse obrigatória, as seguradoras estariam a pagar aos trabalhadores durante muito mais anos do que nos anos de vigência da tabela de 1971.E, portanto, o montante da remição devia ser agora superior ao que era naquela altura.. Se não queremos lesar os trabalhadores.
Mas não acontece assim.
Para dar apenas um exemplo: um trabalhador com uma pensão anual de 121.800$00 , uma desvalorização de 30% e a idade de 44 anos. receberia com base na Tabela de 1971, se a pensão pudesse ser remida( que não o era) a quantia de 2.243.385$00. Enquanto pela tabela que o Governo fez publicar, recebe hoje, obrigatoriamente, apenas a quantia de 1.808.851$00. Trinta anos depois recebe muito menos. Com isto as seguradoras amealham milhares e milhares de contos.
Temos outra grande iniquidade que não foi reparada, apesar do que foi proposto pelo PCP.
Há pensões baixíssimas que durante larguíssimos anos nunca foram aumentadas, e que só agora tiveram um aumento. Baixo, como é óbvio.
Citando os dados do Instituto de Seguros, a média de pensões pagas em 1998 para incapacidades até 30%, foi de 6.113$00 por mês.
Esta situação deve ser reparada, urgindo que se proceda à revalorização destas pensões.
Senhor Presidente
Senhores Deputados:
O PCP apresentará alterações à legislação sobre acidentes de trabalho e doenças profissionais, para pôr cobro a gritantes injustiças.
Não será ainda o regime que defendemos para defesa da dignidade do Trabalhador, enquanto ser humano social, e não apenas uma mera máquina de ganho que se descarta.
Porque isso só acontecerá quando a reparação da vitimização laboral deixe de visar o lucro.
Porque a perda de saúde e da integridade física dos trabalhadores não pode gerar lucros.
Os direitos dos trabalhadores não estão em leilão.
Disse.