Sr. Presidente,
Sr.as Deputadas,
Srs. Deputados:
O projecto de lei n.º 56/VIII que agendámos hoje, para discussão
pretende responder a mais uma situação de trabalho precário,
que, progressivamente, se generaliza como se de um direito se tratasse e não
da ausência dele, atingindo, sem excepção, todos os sectores
laborais.
Hoje, falamos de milhares de professores e educadores de todos os níveis
do sistema educativo que, de norte a sul do País, constituem uma mão-de-obra
barata, indispensável ao funcionamento das escolas, das universidades,
dos institutos politécnicos e dos jardins de infância. Todos
os anos lectivos eles são imprescindíveis ao sistema educativo
e, por isso, são contratados pelo Ministério da Educação,
mas, quando não há espaço para o contrato, ficam no desemprego,
sem direito a qualquer direito, esperando, na melhor das hipóteses,
o ano seguinte.
Petições, audiências, acampamentos junto ao Ministério
da Educação, marchas de denúncia pelas cidades e vilas
de todo o País têm demonstrado, à exaustão, a indigna
e insustentável situação destes educadores e professores.
O Partido Socialista e o Governo do Partido Socialista assumiram compromissos
relativamente a estes trabalhadores: comprometeram-se não só
a criar condições para a sua integração nos quadros
da Administração Pública mas também a aprovar
legislação que viabilizasse a existência de um subsídio
de desemprego. Mas promessas leva-as o vento e, terminada a legislatura, com
excepção de algumas integrações, nada mais foi
feito. Mas veio a campanha eleitoral de 1999 e com ela, mais uma vez, um enunciado
de promessas a cumprir de imediato, dizia-se.
No entanto, o tempo passa e não só o Governo do PS não
cumpre o que havia prometido como executa um conjunto de práticas políticas
lesivas dos interesses destes professores e educadores e de toda a escola
pública.
Foi assim que, no términos do ano lectivo transacto e no início do actual, o Ministro da Educação decidiu aumentar o número de alunos por turma nas áreas periféricas dos grandes centros e encerrar cursos nocturnos em várias escolas. Só na área da Grande Lisboa encerraram já, pelo menos que tenhamos conhecimento, cursos em 17 escolas.
Isto, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, num País em que é preocupante
a taxa de abandono precoce no ensino básico e em que apenas 10% da
população activa entre os 25 e os 64 anos conclui o ensino secundário.
Mas o actual Ministério da Educação decidiu mais: decidiu
publicar e aplicar legislação penalizadora das condições
de trabalho das escolas, procurando que os docentes exerçam todo um
conjunto de funções, que anteriormente implicavam redução
da componente lectiva, agora sem qualquer redução e com um número
de horas mais escasso ainda
Claro que estas medidas viabilizaram uma substancial redução do número de contratos assinados. O Governo despediu, assim, deste modo, cerca de 13% dos educadores e dos professores relativamente ao último ano e acrescentou mais: até ao ano de 2003, prevê o despedimento de cerca de 25% dos professores e educadores do sistema educativo.
Só que o sistema não tem excesso de professores, portanto, esta obsessiva política de redução de custos vai contribuir, natural e obrigatoriamente, para a diminuição da qualidade de trabalho nas escolas públicas portuguesas.
Mas, Srs. Deputados, para que não fiquem dúvidas, justificam-se
alguns dados suficientemente esclarecedores da frágil saúde
do nosso sistema educativo.
Dos 8780 candidatos ao segundo ciclo do ensino básico, com habilitação
profissional, que significa com estágio realizado, e com habilitação
própria, que significa licenciatura ou bacharelato, estes últimos
com dois ou mais anos de serviço, apenas 916 conseguiram vincular-se,
o que corresponde a 10,4%. Mais tarde, no entanto - e esta atitude é
paradoxal -, foram contratados 944 professores, ficando ainda por colocar
6920 candidatos, portanto, foram contratados mais professores do que os que
estão vinculados ao sistema.
No terceiro ciclo do ensino básico e secundário, dos 13 198
candidatos com habilitação profissional e própria obtiveram
colocação apenas 6682, cerca de 50%.
Na educação pré-escolar, apesar do alargamento da rede
pública e apesar de existirem milhares de crianças que ainda
não frequentam regularmente os jardins de infância, algumas centenas
de docentes deste sector estão ainda por colocar.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: O projecto que o PCP, hoje,
traz, aqui, pretende resolver um dos muitos problemas que caracterizam o quotidiano
das nossas escolas, mas outras medidas urgentes têm de ser tomadas para
acautelar, no futuro próximo, os direitos dos cidadãos que pretendem
fazer da docência a sua profissão e os direitos das crianças
e dos jovens que frequentam o sistema educativo.
É imperioso alertar as instituições de formação
de docentes para a urgência em ponderar as ofertas de formação
em função das necessidades do País.
É ilegítimo ignorar o cada vez maior número de jovens
frustrados por terem escolhido fazer formação orientada exclusivamente
para a docência e por não terem qualquer possibilidade de entrar
na profissão, pela qual optaram, a curto e, até, a médio
prazos.
Quem contactou com os milhares de professores que, nos últimos meses,
têm feito ouvir a sua voz, ouviu relatos cruéis, resultantes
da difícil situação de instabilidade e de desemprego
que bate anualmente à porta de professores e educadores com 6, 8, 10
e mais anos de serviço.
Um dos professores presentes explicava por que é que não tinha
sido contratado e dizia: "A escola onde trabalhei, no ano passado, nos
arredores de Lisboa, funciona hoje com várias turmas de 30 e mais alunos.
Dois dos clubes ainda não arrancaram. Os apoios pedagógicos
acrescidos e os apoios individualizados estão ameaçados por
falta de professores; e eu estou aqui à espera de colocação
(...)".
Por todas estas razões, urge discutir e aprovar legislação
que garanta aos milhares de professores, a quem tem sido negada a estabilidade
de emprego e que são indispensáveis à melhoria do funcionamento
do sistema educativo, os mais elementares direitos consagrados constitucionalmente:
a assistência médica e social e o subsídio de desemprego.
A este propósito, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, vale a pena lembrar que, em 1995, o Sr. Provedor de Justiça requeria ao Tribunal Constitucional "a verificação do não cumprimento da Constituição por omissão das medidas legislativas necessárias para conferir exequibilidade, no que aos trabalhadores da função pública diz respeito, à norma contida no artigo 59.º, n.º 1, alínea e), da Constituição, na qual se inscreve o direito dos trabalhadores à assistência material, quando, involuntariamente, se encontram em situação de desemprego".
Sr. Presidente,
Sr.as Deputadas,
Srs. Deputados:
O nosso projecto de lei pretende garantir aos educadores de infância,
aos professores do ensino básico e secundário e também
aos professores do ensino superior universitário e politécnico
a atribuição do direito ao subsídio de desemprego, porque
consideramos inaceitável que se exclua algum nível de ensino
e se legisle parcial e intencionalmente para o sector onde a quantificação
dos números é mais visível.
Tratando-se de legislação própria para uma área
laboral particular, propomos ainda um regime específico, no que se
refere aos prazos de garantia, de acordo com o Decreto-Lei n.º 119/99,
que estabelece, no âmbito do regime geral de segurança social
dos trabalhadores por conta de outrem, o quadro legal da reparação
da eventualidade de desemprego, porque é exactamente na definição
destes prazos de garantia que se determina e condiciona o número de
professores e educadores que terão acesso a este direito.
Não é possível ignorar que muitos e muitos educadores
e professores são contratados exclusivamente durante um período
lectivo, durante a ausência por doença de um trabalhador do quadro,
durante a ausência de uma trabalhadora por licença de maternidade,
etc., etc.
Não equacionar este quadro particular da actividade educativa é
discriminar, à partida, negativamente os seus agentes relativamente
a outros trabalhadores.
Propomos, ainda, que a obrigação contributiva para o regime
geral da segurança social seja integralmente assumida pela entidade
contribuinte, regime que já se pratica em relação aos
educadores e professores do ensino particular e cooperativo.
Finalmente, o nosso projecto determina que todos os professores e educadores,
beneficiários do direito a subsídio de desemprego, continuarão
a usufruir dos benefícios concedidos pela ADSE, impedindo, por exemplo,
que uma professora ou educadora, quando terminado o seu contrato e encontrando-se
no gozo da licença de maternidade, tenha de a interromper, porque perde
o direito à assistência na maternidade, consagrado na Constituição
da República Portuguesa.
Estamos convictos de que esta Assembleia não deixará de reparar
tão gravosa injustiça; estamos convictos de que o nosso projecto
é exactamente a contribuição que queremos dar à
resolução desta inqualificável discriminação
de que são alvo milhares de educadores e professores.
Serão bem-vindas, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, todas as sugestões
que tiverem como objectivo melhorar o texto apresentado, os professores e
os educadores deste país merecem-no!
(...)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Não queremos terminar este debate sem deixar claras algumas questões,
fundamentalmente para o Sr. Deputado do Partido Socialista, pois da primeira
intervenção entende-se o desconhecimento que tem daquilo que
foi a discussão deste problema na anterior legislatura.
Então, Sr. Deputado, para que conste da sua memória, pois nos
Diários da Assembleia da República já consta, devo dizer
que, no dia 18 de Outubro de 1997, o então Secretário de Estado
da Administração Educativa, hoje Ministro da Educação,
disse nesta Casa que estavam preocupados, que estavam naquele momento, com
a Secretaria de Estado da Administração Pública e com
a Secretaria de Estado da Segurança Social, a trabalhar nessa questão
e que iriam resolvê-la urgentemente.
E até me agradeceu, por, mais uma vez, ter trazido a esta Casa esta
questão fundamental, pedindo-me que o mantivesse informado, no desenrolar
da situação, no que tinha a ver com apoios da ADSE aos professores
contratados.
Portanto, Sr. Deputado, o que o Governo do Partido Socialista pediu à
bancada do PCP foi que o mantivéssemos informado daquilo que o PS não
sabia.
Lembro também, Sr. Deputado, que o Governo do Partido Socialista anda,
há cinco anos, a tentar elaborar um projecto de decreto-lei.
Para terminar, devo dizer que a grande diferença entre aquilo que o
Governo anda a fazer e aquilo que o PCP hoje apresenta tem a ver com uma questão
importante: os prazos de garantia.
O que o Governo quer são prazos de garantia que não abranjam
um único professor contratado; o que o Governo quer é um decreto-lei
para os professores dos ensinos básico e secundário, porque
isso é visível, é mediático, esquecendo professores
do ensino politécnico, do ensino universitário e educadores
de infância, os quais - imagine-se! - o Sr. Deputado nem sequer sabia
que também são docentes, que também têm um estatuto
da carreira docente. Mas é natural
foi um esquecimento!