Tratado entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para a Repressão e Tráfico Ilícito de Droga no Mar
Intervenção do deputado António Filipe
17 de Novembro de 1999

 

Senhor Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Senhores Deputados,

Este acordo bilateral celebrado com Espanha, embora correspondendo a um apelo que foi feito na última Assembleia Geral das Nações Unidas, especialmente dedicada ao problema da droga, no sentido de que os vários Estados celebrassem acordos bilaterais destinados a combater o grande tráfico de droga, particularmente em alto mar, visa corresponder a uma forma de cooperação bilateral possível entre dois Estados vizinhos. É uma forma particular de cooperação no combate ao tráfico de droga.

Este Tratado não tem o alcance que se poderia pensar face a algumas intervenções que aqui foram feitas - vários Srs. Deputados falaram dela quase como se estivessem a falar da própria Convenção das Nações Unidas em matéria de droga -, na medida em que tem um aspecto particularizado. Portanto, não tem uma importância tão global como lhe foi atribuída.

De qualquer forma, é um aspecto importante. Tem a ver com o combate ao tráfico de droga que se processa no alto mar, sendo que, através deste acordo bilateral, Portugal e Espanha acordam reciprocamente que, fora das águas territoriais de cada um - como é evidente, cada um dos Estados mantém integralmente a jurisdição sobre as respectivas águas territoriais -, cada um dos Estados pode pedir ao outro autorização para intervir relativamente a um navio que navegue sob o respectivo pavilhão, mantendo o Estado do pavilhão do navio uma jurisdição preferencial em relação aos eventuais traficantes. Portanto, é disto que se trata e, nesse sentido, tem alguma importância.

De facto, tem havido apelos das Nações Unidas, já desde a Convenção de 1988, na qual este tipo de cooperação, relativamente ao alto mar, vem previsto no respectivo artigo 17.º e, como disse há pouco, isso foi reafirmado na Assembleia Geral das Nações Unidas realizada em 1998, ou seja, no ano passado, tendo sido feito um apelo para que sejam adoptadas entre os vários Estados formas de cooperação bilateral, designadamente em matéria de combate ao tráfico de droga no alto mar.

Daí que seja importante que possam ser celebrados acordos destes entre Portugal e Espanha, porque, seguramente, poderão vir a contribuir para combater o grande tráfico de droga, sabido como é que Portugal e Espanha se situam geograficamente num espaço bastante vulnerável e que correspondem a uma das portas de entrada de droga no continente europeu. Isso é conhecido, pelo que é importante que se estabeleça uma cooperação bilateral entre ambos os Estados. Simplesmente, não é, sobretudo, através deste Tratado que esse problema se resolve!

Como tal, o problema da vulnerabilidade das fronteiras marítimas, quer de Portugal, quer de Espanha - e falo de Portugal porque é a que nos diz directamente respeito -, não é por via deste Tratado que se poderá vir a resolver, mas através da resolução dos muitos problemas que ainda afectam a capacidade de Portugal defender as suas costas do grande tráfico de droga.

Há pouco, o Sr. Deputado, e meu amigo, Telmo Correia referia a escassez de lanchas rápidas e eu permitir-me-ia fazer uma precisão: é que elas não são escassas! Não são, nem deixam de ser!

Nos programas dos vários governos e em sucessivos Orçamentos do Estado as lanchas têm sido mencionadas. Não queria exagerar, mas creio que, na última década, poucos terão sido os Orçamentos do Estado, se é que houve algum, que não tivesse inscrita uma verba para as tais lanchas rápidas!

Numa interpelação ao Governo que fizemos mais ou menos a meio da legislatura anterior, tive oportunidade de dizer que as lanchas rápidas demoram mais a chegar ao Tejo do que demorou Vasco da Gama a chegar à Índia em 1498!

De facto, tivemos oportunidade de reparar que, no Programa do Governo, vêm, mais uma vez, referidas as lanchas rápidas, agora prometidas para a próxima legislatura. Vamos ver se quem cá estiver, na IX Legislatura, não estará ainda a exigir, pelo menos - que diabo! -, alguma lancha rápida, dado que continuamos a não ter nenhuma!

Isto para não falar no célebre sistema LAOS, pois, reconhecidamente, são mais os espaços da costa que não estão vigiados do que aqueles cujos sistemas de vigia estão a funcionar.

Há, de facto, um problema de combate ao tráfico de droga que utiliza as costas portuguesas que está por resolver e para o qual é necessário que sejam postos a funcionar os meios que estão, desde há muito, prometidos para que haja uma vigilância mínima das costas portuguesas. Há também toda uma colaboração com autoridades de outros Estados que deve ser mantida e intensificada para que esse tráfico de droga seja impedido. É que isso é muito importante!

Mais do que uma política assente na repressão dos consumidores, que, quanto a nós, devem ser tratados como doentes e não como criminosos, o importante é que os esforços da repressão se concentrem na alta criminalidade associada à droga. Daí que também o combate ao tráfico de droga no alto mar, que constitui o objecto deste Tratado, tenha a sua importância como aspecto complementar de um esforço muito mais profundo que é necessário desenvolver.