Projecto de Lei n.º 334/VII, do PCP, que regula as condições de financiamento público de projectos de investimento respeitantes a equipamentos destinados à prevenção secundária da toxicodependência
Intervenção do deputado António Filipe
22 de Outubro de 1997

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

A situação muito grave que o nosso país atravessa no que diz respeito à toxicodependência, exige uma firme acção de combate à droga aos mais diversos níveis. Face à complexidade deste fenómeno e à dimensão com que se apresenta, mais do que publicitar programas e projectos, ou dinamizar iniciativas de reflexão, impõe-se levar a cabo políticas coordenadas que conjuguem o esforço de repressão do tráfico com medidas de prevenção primária, secundária e terciária da toxicodependência.

O facto de ser indispensável, do ponto de vista do PCP, levar a cabo políticas coordenadas, não exclui, antes pressupõe, que cada domínio específico do combate à toxicodependência seja objecto das medidas legislativas que se imponham face aos problemas concretos que urge resolver. É assim que a presente iniciativa legislativa incide especificamente sobre um aspecto particular da prevenção secundária: O financiamento público de projectos de investimento respeitantes a equipamentos destinados ao tratamento de toxicodependentes.

O tratamento de toxicodependentes constitui, para o PCP, uma vertente essencial da política de combate à droga. É indispensável que os milhares de cidadãos - jovens, na sua grande maioria - afectados por toxicodependência, tenham asseguradas as condições que lhes permitam ter acesso a serviços de atendimento e de tratamento que possibilitem a sua desabituação e reinserção social.

A existência de uma rede de serviços públicos destinada a possibilitar, em todo o país, o tratamento de toxicodependentes em condições de gratuitidade, é um objectivo que o PCP considera prioritário e que esteve na base da apresentação do Projecto de Lei n.º 29/VII, parcialmente consagrado por lei da Assembleia da República.

Sendo reconhecida a importância e a responsabilidade dos serviços públicos no tratamento de toxicodependentes, não pode deixar de ser reconhecido o facto desta área constituir também objecto privilegiado de investimento por parte de entidades privadas. Facto que nuns casos justifica apreço. Noutros casos suscita apreensão.

Perante a insuficiência dos serviços públicos de tratamento face ao elevadíssimo número de toxicodependentes, têm-se verificado dois tipos de realidades: por um lado, uma actividade dinâmica da parte de muitas Organizações Não Governamentais sem fins lucrativos, e particularmente de Instituições Privadas de Solidariedade Social, seriamente empenhadas em minorar as pesadas consequências sociais e humanas da toxicodependência, que merece sem qualquer dúvida ser apoiada. Por outro lado, o aparecimento de serviços privados, a praticar preços exorbitantes e a publicitar soluções infalíveis de tratamento, que se aproveitam do flagelo social da toxicodependência e do desespero de muitas famílias, para obter vultuosos lucros. Estando em causa o apoio do Estado, esta é uma área em que é decisivo separar o trigo do joio.

O financiamento das ONG com actividades na âmbito da toxicodependência foi definido através dos Despachos Conjuntos da Presidência do Conselho de Ministros e dos Ministérios da Saúde, da Qualificação e Emprego e da Solidariedade e Segurança Social publicados em 10/10/96, 19/2/97 e 5/3/97. Estes diplomas estabelecem os critérios gerais de candidatura das ONG, incluindo IPSS, a apoios a projectos de desenvolvimento de actividades no domínio da prevenção secundária e terciária da toxicodependência, destinados a comparticipar investimentos em bens de equipamento, bem como à manutenção das actividades das ONG no âmbito da prevenção da toxicodependência.

Porém, enquanto na vertente de apoio à manutenção de actividades, designadamente a equipas de apoio social directo e a admissões em centros de dia, comunidades terapêuticas ou apartamentos de reinserção, se estabelecem critérios objectivos para a atribuição de comparticipações, tal não acontece no que se refere à comparticipação em projectos de investimento.

Assim, não havendo uma definição mais precisa dos critérios a que deve obedecer a concessão de apoios por parte do Estado a projectos de investimento, permanece neste domínio uma excessiva margem de discricionariedade que não garante dois aspectos fundamentais:

Não garante que só sejam concedidos apoios a entidades que apresentem garantias de qualidade e idoneidade dos serviços prestados, nem garante que não prevaleçam critérios de natureza política na decisão de atribuição de apoios para investimento.

É, por isso, objectivo do presente Projecto de Lei, criar um regime legal que estabeleça estas garantias e que assegure que as verbas disponibilizadas nomeadamente através do "Joker" sejam utilizadas de forma adequada e socialmente útil. O presente Projecto de Lei estabelece assim um conjunto de elementos que devem constar obrigatoriamente dos projectos de candidatura; delimita objectivamente as condições para o financiamento; determina os limites de comparticipação; condiciona o financiamento ao compromisso de um período mínimo de funcionamento; e estabelece ainda mecanismos de fiscalização da aplicação das verbas concedidas.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

Este Projecto de Lei do PCP visa colmatar uma lacuna existente na legislação em vigor, tornando mais transparente o financiamento público de projectos apresentados por organizações não governamentais no âmbito do tratamento de toxicodependentes. Com a aprovação deste Projecto de Lei têm a ganhar todos os que estão realmente interessados em garantir condições de idoneidade na prevenção secundária de toxicodependentes e em garantir uma correcta utilização dos dinheiros públicos. Têm a ganhar os toxicodependentes e as suas famílias. Só terão a perder aqueles que estejam interessados em obter dinheiros públicos para fazer chorudos negócios à custa das desgraças alheias.

Apresentamos este Projecto de Lei com um espírito de total abertura para, em comissão, podermos debater as melhores soluções para resolver um problema que consideramos relevante. Fazemos votos para que deste processo legislativo resulte um contributo legal positivo para a luta contra a toxicodependência em Portugal.

Disse.