Lei das Comunicações Electrónicas
Intervenção de João Oliveira
8 de Março de 2006

 

 

Sr. Presidente,
Sr. as e Srs. Deputados:

Com a aprovação da Lei das Comunicações Electrónicas, Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, estabeleceram-se as condições para a criação pelos municípios de uma taxa municipal de direitos de passagem. Esta taxa tem como objectivo o essarcimento dos municípios pela oneração dos seus territórios e utilização do seu domínio público pelas empresas que exploram as redes físicas de comunicações.

De acordo com a referida lei, a taxa municipal de direitos de passagem é determinada com base na aplicação de um percentual sobre cada factura emitida pelas empresas que fornecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público, em local fixo, sendo incluído nessa factura o valor da taxa a pagar pelo consumidor.

Reconhecendo como justa a reivindicação, há muito feita pelos municípios, da necessidade de serem ressarcidos pela utilização do seu domínio público, entende o PCP que a forma como esta taxa se encontra prevista na lei levanta, entre outros, um problema fundamental de identificação dos sujeitos da relação tributária.

Apesar de ter como objectivo a fixação de contrapartidas pelo uso do domínio público municipal (o uso do solo ou subsolo), a taxa em questão acaba por fazer recair o ónus do seu pagamento no cidadão consumidor dos serviços de comunicações, sendo o seu valor determinado pela aplicação de critérios que nada têm que ver com aquela utilização.

Trata-se, com efeito, de uma prestação tributária cobrada ao sujeito errado. A utilização do domínio público é levada a cabo pelos operadores que exploram as infra-estruturas físicas de comunicações e que são os beneficiários directos dessa actividade económica. Terão de ser eles, por isso, os responsáveis pelo pagamento da taxa municipal de direitos de passagem.

A este propósito, como de resto tínhamos já por várias vezes afirmado, podem ser levantadas questões de inconstitucionalidade, uma vez que à taxa cobrada aos munícipes não corresponde qualquer prestação de serviço associado a esse valor, por parte de quem procede à cobrança.

A realidade tem vindo, infelizmente, a confirmar as preocupações levantadas pelo PCP aquando da discussão da Lei n.º 5/2004. Na altura, denunciámos o carácter profundamente injusto de uma medida que isentava as empresas de telecomunicações e transferia para os consumidores o ónus do pagamento de uma taxa com a qual nada tinham a ver. A criação e aplicação das taxas e o consequente protesto das populações aí estão para confirmar o que dizíamos.

E nem o argumento de que só paga quem utiliza os serviços de comunicações convence aqueles que todos os meses têm de suportar o que devia ser um encargo das empresas que lucram com a exploração das comunicações.

A utilização de taxas através deste mecanismo, que apenas oneram os munícipes e consumidores e não as empresas operadoras, não podem, de forma nenhuma, constituir um mecanismo à margem da lei para obviar ao incumprimento da Lei das Finanças Locais e constituir uma receita líquida dos municípios a acrescer às que a lei prevê.

A justeza do aumento das receitas municipais tem necessariamente de assentar em critérios objectivos de distribuição das receitas do Estado por forma a garantir uma real autonomia financeira das autarquias. A verdade é que a redução das verbas distribuídas vem-se agravando progressivamente, sem que as sucessivas alterações introduzidas na lei tenham conseguido que o Estado compensasse as autarquias quer pelas verbas indevidamente retidas quer pelas isenções de impostos locais da sua responsabilidade.

Ficará, ainda, por discutir, é certo, uma eventual alteração à forma de cálculo do valor da taxa que, em nosso entender, deve permitir o estabelecimento de uma relação mais directa entre a prestação tributária e a contraprestação de utilização do domínio público.

Essa discussão, no entanto, por exigir maior ponderação não se coaduna com a urgência da resposta que ora propomos.

 

(…)

 

Sr. Presidente,
Sr. as e Srs. Deputados:

No final deste debate, é de realçar a importância da matéria que o PCP trouxe hoje a este Plenário, sobretudo porque se trata de uma questão de reposição de justiça numa relação tributária que, à partida, foi mal delineada.

Tal como referi na minha primeira intervenção, este é um dos vários problemas que nos suscita a redacção da actual lei; por isso, como é óbvio, manifestamos disponibilidade para discutir não só este como os demais problemas que já identificámos. Resta-me, assim, dizer que estamos disponíveis para aceitar a proposta feita pelo PS no sentido de o projecto de lei baixar à comissão competente, sem votação.