Dia Internacional da Erradicação da Pobreza
Nota da Comissão do PCP para as questões da Segurança Social
17 de Outubro de 2003

Assinalando-se, hoje, o Dia Internacional da Erradicação da Pobreza, o Partido Comunista Português realizou encontros com diversas organizações para troca de opiniões sobre a problemática das desigualdades sociais, pobreza e exclusão social e sobre as suas experiências concretas neste domínio. Assim, ontem e hoje, tiveram lugar encontros com a Comunidade Vida e Paz e a Associação Cais, entidades que intervêm junto dos cidadãos sem abrigo; com o Grupo Comunitário da Paróquia de Rio de Mouro, com intervenção de apoio na área da infância e dos idosos carenciados; com “Os Príncipes do Nada”, projecto de intervenção relativo à comunidade cigana do Vale do Forno/Carnide e com o MURPI (Movimento Unitário de Reformados, Pensionistas e Idosos).

Sobem os indicadores de pobreza em Portugal

Os contactos realizados e os dados disponíveis dizem-nos que 23% da população não consegue rendimentos superiores a 60% do rendimento médio nacional. Trata-se de cerca de dois milhões e trezentas mil pessoas que vivem na pobreza. É uma realidade concreta e brutal que coloca Portugal na mais elevada taxa de pobreza da União Europeia e com o maior fosso entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres.

Este fenómeno social, embora com raízes históricas, é essencialmente o resultado de anos de políticas de direita, da aplicação de um modelo económico assente numa injusta repartição do rendimento nacional,numa permanente desvalorização do valor do trabalho (moderação salarial, salários baixos, exploração da mão-de-obra), acompanhado de um modelo social de orientação estratégica de acentuada diminuição das funções sociais do Estado, restringindo as suas capacidades de resposta, como é o caso do Serviço Nacional de Saúde, do Sistema Público de Segurança Social e a Escola Pública.

De facto, o prosseguimento das políticas de direita, traduzidas num aumento do desemprego, na continuação de uma política de baixos salários e reformas, em brutais aumentos dos preços de bens e serviços essenciais, têm expressão, de forma implacável, em novas formas de pobreza e de exclusão social que se alargam a importantes e novos segmentos da população activa e idosa.

Novos segmentos da população são afectados

Os fenómenos sociais de isolamento e solidão dos mais idosos (associados a baixas pensões e reformas e a insuficientes respostas sociais), a consecutiva marginalização das minorias étnicas, a desertificação do interior, as várias assimetrias regionais e a exploração desenfreada da mão-de-obra imigrante, são exemplos concretos da expansão das desigualdades, da pobreza e da exclusão social no nosso País.
As famílias portuguesas, sobretudo as camadas sociais mais vulneráveis, são profundamente atingidas por esta dura realidade social. Elas têm que fazer face, por si, a todos os problemas sem poderem contar com o contributo do Estado em áreas sociais fundamentais ao bem-estar de cada membro do agregado familiar. O Código Laboral, aprovado pelo PSD/CDS-PP vai, sem qualquer dúvida, agravar ainda mais toda esta situação. Recordamos que esta lei permite designadamente: o alargamento da jornada de trabalho de pais e mães com crianças pequenas, aumenta a precariedade laboral, interfere com o direito a férias, impõe a mobilidade geográfica do(a) trabalhador(a), não consagra períodos de amamentação e aleitação, não garante o pagamento das faltas por assistência a filhos com deficiência profunda, reduz a protecção no despedimento de grávidas e lactantes.

Entretanto, outros flagelos sociais associadas à pobreza e à exclusão social ganham novas dimensões: a toxicodependência; os cidadãos sem abrigo, as crianças e jovens em risco; a seropositividade; o alcoolismo; a prostituição; o abandono e insucesso escolar.
Estas são situações que se repercutirão fortemente nas gerações futuras.

As políticas e medidas de combate à pobreza e de inclusão social, pomposamente divulgadas, têm constituído “meros paliativos”, e não têm tido significado relevante na alteração dos principais indicadores de pobreza em Portugal.

A intervenção de diversas organizações não governamentais com apoios da Administração Central é visível em diferentes domínios sociais (infância, idosos, deficientes, cidadãos sem abrigo, etc..), constituindo cada vez mais as únicas respostas sociais, num quadro em que persistem baixas taxas de cobertura e em que aumenta a desresponsabilização do Estado.

Por tudo isto, o nosso País apresenta uma forte persistência nos indicadores de pobreza comparativamente com os restantes países da União Europeia.

A actual maioria PSD/CDS-PP trata os direitos sociais dos cidadãos como uma “praga”

A acção política e legislativa da actual maioria PSD/CDS-PP, designadamente nas áreas do trabalho, da segurança social e da saúde, dão novos passos no agravamento da injusta repartição do rendimento nacional em favor do capital e da maximização do lucro, à custa de uma maior exploração de quem trabalha e do aumento das desigualdades sociais. Trata-se da privatização das funções sociais do Estado promovendo, em alternativa, a caridade e o assistencialismo.

E tudo isto envolvido numa ofensiva ideológica sem precedentes após o 25 de Abril, que procura esconder o seu único objectivo: privilegiar os interesses do grande capital financeiro e do grande patronato à custa da destruição de importantes direitos políticos, económicos, sociais e de cidadania dos(as) portugueses(as).

Esta ofensiva ideológica, sem escrúpulos em recorrer ao fomento do preconceito e à estigmatização social dos que vivem do seu trabalho e dos que ficam, em algum momento da sua vida, desprovidos de meios de subsístência, é desenvolvida a pretexto do combate à fraude e à subsidio-dependência, como sucedeu aquando do anúncio de alterações aos subsídios de doença e de desemprego.
O que na realidade o Governo tenta esconder é a ausência de medidas de combate à evasão e fuga fiscal por parte dos contribuintes mais poderosos e a sua aposta em isentar o patronato das suas obrigações sociais e, em simultâneo, criar condições para a transferência dos importantes recursos financeiros da segurança social pública para o capital financeiro.

As alterações a estes importantes subsídios escondem qual o seu verdadeiro objectivo: “secar” a segurança social reduzindo-lhe as receitas, e em consequência, diminuir o valor dos subsídios e o universo dos seus beneficiários e, assim, transformar o Sistema Público de Segurança Social num esquema residual e assistencialista, em vez de constituir uma componente eficaz de redistribuição da riqueza, minorando o risco da pobreza.

Com base no mesmo preconceito foram fundamentoadas as propostas do Governo para alteração do Rendimento Mínimo Garantido, um direito social novo, criado em 1997, negando, pura e simplesmente, que ele constituía um importante direito de cidadania e um factor de atenuação da pobreza.

As razões apresentadas para proceder às alterações ao abono de família/subsídio familiar – justificadas em favor dos que mais precisam – mais não é do que a tentativa de, progressivamente, destruir a universalidade deste direito.

Estamos perante uma maioria PSD/CDS-PP, que na Assembleia da República e no Governo, trata os direitos sociais como uma “praga” e tudo faz com vista à sua destruição.

É urgente e necessário:
Combater a política de direita
Apostar no aprofundamento dos direitos sociais e de cidadania

O desenvolvimento da sociedade portuguesa não pode ser baseado no modelo capitalista neoliberal de dois pólos opostos: os poucos e muito ricos e os muitos e cada vez mais pobres – aos quais é cada vez mais limitado o acesso às necessidades fundamentais.

O Partido Comunista Português reafirma a sua clara oposição a este modelo, onde a prioridade é o lucro a qualquer preço e o desprezo pelos direitos fundamentais dos trabalhadores e das pessoas é a regra.

O combate às desigualdades sociais, à pobreza e exclusão social passa pela adopção de políticas de mais justa repartição do rendimento nacional, de salvaguarda do direito ao trabalho com direitos, de revalorização dos salários e das pensões e por uma efectiva justiça fiscal.

O combate às desigualdades sociais, à pobreza e à exclusão social passa também pela não abdicação do Estado das suas funções sociais nas áreas da Saúde, do Sistema Público de Segurança Social e de uma Escola Pública, gratuita e de qualidade.

O Partido Comunista Português reafirma o prosseguimento da sua luta e intervenção contra a política da actual maioria PSD/CDS-PP e apela à participação e iniciativa dos(as) trabalhadores, das organizações sociais no combate necessário a travar com vista a obstaculizar o prosseguimento das políticas de direita, abrindo caminhos para soluções políticas assentes no respeito pelas conquistas e direitos civilizacionais emanados de Abril, abrindo novos horizontes para um Portugal democrático, mais justo e solidário.