Actualização extraordinária das pensões de aposentados degradadas
Intervenção da deputada Luísa Mesquita
3 de Junho de 1998

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhoras Deputadas:

Utilizando o direito de agendamento potestativo, o Partido Comunista Português vem propor hoje, ao Plenário da Assembleia da República, a apreciação e votação do seu Projecto de Lei nº 300/VII, apresentado em Abril de 1997 e cujo agendamento diversas vezes proposto, diversas vezes foi recusado.

O Partido Comunista Português assume assim, não só os seus compromissos, mas responde também às centenas de cartas, aos apelos de muitos portugueses e de muitas portuguesas que de Norte a Sul do País, nestes últimos meses, têm, persistentemente, solicitado ao todos os Grupos Parlamentares a assumpção das suas responsabilidades na resolução da injustiça e da indignidade a que têm sido sujeitos, ao longo dos anos, por sucessivos e diferentes governos.

Em Janeiro de 1997, as galerias da Assembleia da República, repletas, encheram-se de esperança, aquando da apreciação do texto da petição nº 300/VI da iniciativa da Federação Nacional dos Professores. Era um texto subscrito por milhares e milhares de cidadãos que solicitavam a intervenção da Assembleia da República, no sentido de pôr à agudização crescente de desigualdade entre profissionais que, apesar de terem desempenhado idênticas funções, sobreviviam e sobrevivem com pensões de aposentação gravosamente diferenciadas.

Eram homens e mulheres que depois de toda uma vida entregue à educação e formação de gerações e gerações, vinham lembrar aos Senhores Deputados e às Senhoras Deputadas que a justiça, a dignidade e a solidariedade só existem quando as exercemos e quando do seu exercício resulta o bem estar social dos destinadores e dos destinatários.

Partiram, afirmavam muitos, de mãos vazias, mas com confiança.

Dizia-me uma professora de 83 anos - temos que acreditar nos nossos representantes, nos nossos antigos alunos. De todas as bancadas ouvimos o reconhecimento da injustiça e a promessa de empenhamento e resolução.

E, de facto, para o PS a situação era "injusta", "insustentável" e afirmava - "o PS que sempre se interessou por este problema, acompanhará a evolução da situação junto do Governo, libertando os professores aposentados dos sentimentos de inconformismo e revolta sentidos ao longo das últimas Legislaturas".

Para o PSD era um acto de contrição, reconhecia-se e assumia-se a injustiça criada. E declaravam que "um tipo de indexação das pensões aos vencimentos dos docentes no activo possa ser forma de corrigir o diferencial existente. Estamos, assim, disponíveis para discutir e apoiar a solução que o Governo venha a encontrar para a injustiça existente, desde que gere equilíbrio e equidade em toda a Administração Pública".

O CDS-PP propunha que o Governo "acertasse com a Caixa Geral de Aposentações o referencial para a actualização das pensões" e acrescentava que se a injustiça "permanecesse, obviamente que, por via legislativa, teria de criar-se alguma solução que dê resposta a este problema, não esquecendo (...) que a lei é extensiva a muitas outras categorias da Função Pública".

O PEV afirmava que daria "o seu veemente apoio a todas as iniciativas que vierem a reparar esta grave injustiça".

Por tudo isto, Senhor Presidente, Senhores Deputados e Senhoras Deputadas, estamos, nós, também confiantes, na vossa apreciação e votação, tal como, há mais de um ano, o estavam todos os que atenta e esperançadamente nos ouviram.

O Projecto de Lei que pretendemos, mereça de V. Exas. a melhor atenção, responde exactamente às preocupações e às sugestões que vieram de todas as bancadas.

Como o afirmámos em Janeiro de 1997 e reafirmamos no preâmbulo da nossa iniciativa legislativa, há que tomar medidas urgentes que ponham fim quer à disparidade, quer à progressiva degradação das aposentações; e a este objectivo, responde, de forma realista e inovadora, o texto hoje em discussão.

Simultaneamente inovadora e realista porque não pretende de forma casuística resolver situações, mas propõe-se clarificar, em definitivo, a efectivação de um princípio que abranja todos os trabalhadores sem afloramentos discriminatórios e arbitrários.

Inovadora e realista porque propõe um faseamento temporal, facilitador da correcção extraordinária, impeditivo que a leitura simplista e leviana de alguns, vislumbre, tão só, no início e no terminus de um orçamento, um baile de números e esqueça os outros, os magros e angustiados números dos orçamentos mensais dos aposentados.

Inovadora e realista porque a opção pela abrangência não inviabiliza, antes pelo contrário, o entendimento da necessidade de um regime especial para a carreira docente que, no universo dos trabalhadores da administração pública, assume particular gravidade.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhoras Deputadas:

Como é do conhecimento público, a entrada em vigor do novo sistema retributivo da função pública, em Outubro de 1989, sem que paralelamente fossem tomadas medidas verdadeiramente correctoras de actualização das pensões já existentes, constituiu o início de um progressivo processo de degradação que, hoje, atinge foros de escândalo. Simultaneamente, o facto de a actualização das pensões de aposentação não se ter processado de forma indexada à actualização dos vencimentos do activo (apesar de prevista no artigo 59º do DL 191-A/79), e por isso não ter sido objecto de um acréscimo similar, ou ainda o facto de não terem sido consideradas medidas de equiparação, em função de novas estruturas de carreiras têm vindo também, cumulativamente e progressivamente, a criar cada vez mais acentuadas injustiças relativas.

Sendo estes factores comuns a todos os trabalhadores da Administração Pública, com excepção de algumas carreiras profissionais, assumem, no entanto, uma particular gravidade na carreira docente como já o dissemos anteriormente.

As remunerações dos professores têm sido, e muito justamente, objecto de vários reajustamentos de letra (nomeadamente em 1975, em 1979 e em 1986) e também de vários reajustamentos dos índices por que vencem os diferentes escalões. A ausência de aplicação de necessárias medidas correctivas às pensões entretanto calculadas, agudizaram e agudizam a distância entre o docente aposentado e o docente no activo.

Há hoje professores aposentados no topo das suas carreiras, com mais de 40 anos de serviço, que recebem tanto como um professor no início da sua carreira.

Há hoje professores aposentados antes de 1989 que recebem um terço dos professores aposentados em 1995. Há professores aposentados entre 1989 e 1991 que, apesar de abrangidos pelo novo sistema retributivo da função pública, foram impedidos de atingir o topo da carreira, ficando numa situação equivalente a outro professor com 17 anos de serviço, apesar de muitos terem 40 e mais anos de carreira. Nunca é demais lembrar. É de referir a existência de diversos pareceres do Senhor Provedor de Justiça sobre esta matéria, nos quais se reafirma, sempre, a razão dos professores aposentados.

Há professores aposentados em 1996 que se viram impedidos de aceder aos novos índices criados nos 2 últimos escalões da carreira docente.

Se compararmos, hoje, por exemplo, as pensões de aposentação recebidas por 3 professores com o mesmo tempo de serviço e a mesma qualificação, respectivamente em 1994, em 1996 e em 1997, verificaremos que a primeira já atingiu uma degradação de 23% relativamente à última e a Segunda, já chegou aos 12%, em relação também à de 1997. Estamos, como é evidente, perante condicionalismos também de âmbito estrutural e por isso consideramos que só o direito à indexação das pensões de reforma aos vencimentos do activo, pode repor a justiça e a conformidade com os instrumentos legais em vigor.

Reportamo-nos, concretamente, ao artigo 59º do Estatuto da Aposentação que determina a actualização das pensões do funcionalismo sempre que ocorra uma elevação geral dos vencimentos, ou os mesmos sejam alterados, em consequência de suplemento ou subsídio geral.

Explicita ainda o citado artigo que este acto de actualização se processa "mediante diploma do Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro das Finanças e do membro do Governo que tiver a seu cargo a função pública."

Senhor Presidente,
Senhoras Deputadas,
Senhores Deputados:

Estamos convictos de que urge alterar a prática dos diferentes governos que, nesta matéria, têm tido atitudes idênticas.

Perante a flagrante injustiça de que são alvo tantos e tantos portugueses e portuguesas, o que se pede hoje, a cada um dos eleitos aqui presentes, representantes legítimos de todos aqueles que nos escutam, é que tenhamos não só vontade política para ouvir mas sobretudo vontade política para agir.

São já insuficientes as palavras. E o tempo é cada vez mais, também ele, insuficiente para responder a todos aqueles que foram ficando pelo caminho da vida.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhoras Deputadas:

Permiti-me que vos leia um extracto de uma carta de uma professora dirigida aos Deputados e às Deputadas desta República. "Não vão "estragar" o orçamento nacional (...) Nem esse pequeno "peso" vai durar décadas, pois muito pouca gente nasce com genes de longevidade ultracentenária".

Reconheçamos, pela aprovação do Projecto de Lei em debate, a justeza destas palavras. Disse.