Actualização extraordinária das pensões
de aposentados degradadas
Intervenção do deputado José Calçada
3 de Junho de 1998
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo:
É tradicional, é legítimo e é necessário que nesta fase do debate se faça um
balanço dos resultados atingidos com este agendamento potestativo do projecto
de lei do PCP com vista à actualização extraordinária das pensões de aposentação
degradadas dos funcionários públicos, e particularmente das dos professores.
É desde logo politicamente significativo o facto de que o PCP apenas pela utilização
da figura do agendamento potestativo tenha conseguido colocar o seu projecto
de lei hoje aqui em debate. E é politicamente significativo por duas ordens
de razões: a primeira, por demonstrar inequivocamente a importância que o PCP
atribui a esta matéria e o hábito que mantemos de assumirmos os nossos compromissos;
a segunda, em oposição, por demonstrar de modo igualmente claro a incomodidade
e a má-consciência que o tema provoca no Governo e na bancada do Partido Socialista,
a contradição incontornável entre as palavras e os actos e a real falta de vontade
política para darem o primeiro passo ou um primeiro sinal no caminho da superação
de tão trágicas situações sociais e humanas como são as dos servidores públicos
que detêm pensões de aposentação verdadeiramente de miséria. Aliás, esta posição
do Governo e do Partido Socialista surge literalmente ao arrepio de promessas
eleitorais, de compromissos assumidos em sede do programa do Governo e até de
posições tomadas por Deputados socialistas em colunas de opinião abundantemente
espalhadas pela imprensa escrita. Vou poupar-vos a todos, e à Assembleia, à
citação dos textos que facilmente fariam prova do que acabo de afirmar. Seria
uma redundância. Todos os Senhores Deputados, todos os Senhores membros do Governo
os conhecem. A sua facilidade em recordá-los só é ultrapassada pela sua vontade
de que nós aqui hoje os não lembrássemos. Mas a memória é o que é, e é sem dúvida
um dos mais importantes instrumentos para a construção de cada homem e da humanidade.
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo:
Mas será verdade que o Governo e o Partido Socialista não honram neste domínio,
todos os seus compromissos? De modo nenhum. Nada menos verdadeiro. Não somos
daqueles que dizem mal só por dizer mal - e nada nos agrada mais do que aplaudir
quando são correctas as medidas tomadas. O Governo e o Partido Socialista comprometeram-se,
por exemplo, a ultrapassar o problema das pensões degradadas e a colocar o nosso
País no caminho do euro. Neste momento, é possível dizer que o Governo cumpriu
quanto ao caminho para o euro e não cumpriu no que se refere às pensões degradadas.
O resultado desta decisão salomónica é que os aposentados da função pública
continuarão a receber pensões degradadas, mas em euros - o que é uma manifestação
clara da modernidade ou mesmo da pós-modernidade deste Governo e deste Partido
Socialista!
É verdade que o recurso ao agendamento potestativo, dados os antecedentes nesta
matéria, não era de bom augúrio para o nosso projecto de lei. Mas, mesmo assim,
cometemos, pelo que se vê, o erro de esperar que, perante o carácter responsável
e sério do conteúdo do nosso projecto de lei, outros - e nomeadamente o Partido
Socialista e o Governo - assumissem um comportamento político igualmente responsável
e sério, dando corpo aos milhares de palavras que continuamente debitam sobre
a importância da "prioridade às pessoas". Essas pessoas, Senhores Membros do
Governo e Senhores Deputados do Partido Socialista - essas pessoas estão fartas
e cansadas desses milhares de palavras. E, muitas delas, em idades já muitos
avançadas, a única certeza que dramaticamente vão sendo forçadas a adquirir
é a de que a Grande Ceifeira se encarregará, natural e inevitavelmente, de retirar
este problema da ordem-do-dia do Governo. Trágica constatação para quem, depois
de uma vida ao serviço da comunidade e do futuro que é o nosso hoje, se vê hoje
confrontado com a negação de um direito como se de um privilégio se tratasse.
A rejeição deste nosso projecto de lei não configura de modo algum uma derrota
do projecto, ou do meu Grupo Parlamentar, ou do PCP. Configura, sim, nesta fase,
a frustração de todos aqueles a quem justamente o nosso projecto se destinava,
uma frustração que - mesmo circunstancial - eles de todo não mereciam. E se
a questão se tiver de colocar em termos de derrota ou de vitória, então este
debate resultou numa vitória, na vitória da hipocrisia social e política de
um Governo e de uma bancada - os do Partido Socialista - que, sempre que têm
que optar, optam quase sempre do modo como hoje o fizeram!
Disse.