Intervenção do Deputado
João Amaral

Recuperação das pensões dos antigos combatentes

26 de Abril de 2000



Sr. Presidente,
Srs. Deputados

Quis a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares que discutíssemos em conjunto três questões diferentes: a das antiguidades e promoções dos oficiais milicianos que ingressaram no quadro permanente antes de 25 de Abril de 1974, após a frequência da Academia Militar; a da contagem do tempo de serviço militar obrigatório para efeitos de reforma ou aposentação; a da concessão de uma bonificação para cálculo das pensões dos militares do serviço militar obrigatório que prestaram serviço em condições ou em zonas de risco. Trata-se de três questões diferentes, embora se possa dizer que alguma coisa as une: talvez a ideia que a Assembleia assumiu de que estas questões têm de ser tratadas hoje com serenidade, sem complexos de culpa mas também sem tiques corporativos. Estas questões têm de ser tratadas pelo seu valor próprio e para que sobre elas, serenamente, se faça a justiça possível, porque a justiça, para estas questões, é e terá de ser sempre a justiça possível. Mas essa justiça terá de se fazer com urgência! A lei aqui aprovada sobre os prisioneiros de guerra, a lei aqui aprovada sobre o stress de guerra e a Lei n.º 43/99 aqui aprovada sobre os militares afectados na sua carreira após os acontecimentos do 25 de Abril, pela sua participação na construção da democracia, são três exemplos que mostram que não basta que a Assembleia faça a justiça possível, é preciso que, depois, o Governo e a Administração executem essas leis, transformando em prática e intenções concretas aquilo que foi prometido.

Quanto à questão dos oficiais milicianos que ingressaram na Academia Militar e, por essa via, no quadro permanente, é uma questão velha, de muitos anos. É uma questão que inicialmente, quando foi colocada, como já foi aqui sublinhado, ocasionou uma reacção por parte dos oficiais do quadro permanente que teve alguma coisa a ver com a componente corporativa do 25 de Abril. Sucede que estes anos todos decorridos, o tal tempo de serviço que foi prestado na qualidade de milicianos nunca foi contado como deveria ter sido. Trata-se agora, tão-só, de contar esse tempo em condições que constituam hoje um mínimo de reparação e de justiça em relação aos militares que estão já na reserva e na reforma. Eles estão aqui a assistir a este debate, eles participaram no 25 de Abril! Como assinalou o Sr. Deputado António Reis, se eles foram objecto de um abaixo-assinado contra eles, eles não o tomaram como uma forma de se separarem do 25 de Abril. Eles participaram activamente no 25 de Abril, eles esperavam e esperam que, do 25 de Abril, seja, finalmente, feita justiça. Eles lutaram e nós estamos em condições de fazer essa justiça, aliás, já a podíamos ter feito na legislatura passada. Não vou dizer quem é que impediu que esta matéria fosse agendada e votada, porque não vale a pena estragar aquilo que parece que agora vai ser uma festa, que é fazermos a tal lei que é necessária para reparar a situação destes militares.
Pela nossa parte, subscrevemos o projecto na legislatura anterior e votamos com convicção. Estamos dispostos a considerar alterações na especialidade mas sem gastar tempo excessivo, fazendo isso rapidamente, para que estes militares não fiquem, daqui a pouco, numa situação em que já tenham de vir de bengala, outra vez, à Assembleia, pedir-lhe justiça.
Relativamente à questão da contagem do tempo de serviço militar obrigatório, ela está colocada nos projectos, mesmo que os Srs. Deputados, nomeadamente os subscritores, não reparem nisso. Aliás, pelas intervenções que ouvi, por vezes, até me pareceu que não o perceberam bem. E, não valendo a pena falar das variáveis desta questão, ela está proposta, no essencial, nos seguintes termos: o tempo de serviço militar obrigatório deve ser contado para efeitos de reforma ou aposentação, para a Caixa Geral de Aposentações ou para a Caixa Nacional de Pensões, sem desconto de quotas. Isto é o que está proposto nos dois projectos!
Ora, isto tem uma base e merece uma reflexão: se lermos a Lei do Serviço Militar, tal como a redigimos em 1987, aqui, na Assembleia da República, vemos que, nessa Lei, se estabelecia que o tempo de serviço militar devia contar para efeitos de reforma. E isto estava estabelecido sem qualquer ressalva! Todo o tempo de serviço militar efectivo nas Forças Armadas era contado para efeitos de aposentação ou reforma. Portanto, deve ser contado! Nós repetimos isso agora para os militares do serviço militar obrigatório, porque a nova Lei do Serviço Militar fala de contratados e de voluntários mas prevê a existência de serviço militar obrigatório! No artigo 46.º, n.º 2, desta nova Lei, voltamos, novamente, a estabelecer que todo o tempo de serviço militar efectivo nas Forças Armadas, prestado ao abrigo das situações previstas no artigo 34.º, isto é, dos militares convocados, é contado para efeitos de aposentação ou reforma.

Portanto, Srs. Deputados, o princípio está instituído! O princípio é aquele mas os princípios custam dinheiro! Portanto, o que temos de ver é qual a situação actual e como é que ela deve ser resolvida para o futuro. E não creio que a resposta a um problema destes, se a vontade política da Assembleia é a de que o tempo conte, se possa fazer em termos de dizer «não!». Não é possível uma resposta que se limite a um «não!»! Aliás, tenho a dizer ao Sr. Deputado Gonçalo Velho que o Sr. Provedor de Justiça dirigiu esta mesma recomendação à Assembleia da República para nós a ponderarmos. E dirigiu-a à Assembleia, contra-argumentando relativamente a um despacho do Sr. Ministro Sousa Franco, que tem um certo parti pris contra as Forças Armadas e contra o serviço militar, como tem contra muitas outras coisas, o que não é uma novidade.

Portanto, não me parece que essa seja propriamente uma argumentação que se deva ter no quadro de uma discussão como esta. Agora, do que não temos dúvidas é de que isto custa dinheiro demais quando aplicado ao passado. Podemos encarar isto para o futuro com alguma tranquilidade mas, se pensarmos no passado, sabendo que as gerações entre 1961 e 1974 fizeram, ano a ano, três a quatro anos de serviço militar quando não mais, vemos que é muito dinheiro que está em causa. De qualquer forma, Srs. Deputados do Partido Socialista, parece-me que merece a pena ponderar, em sede de comissão, se encontramos uma solução justa e adequada para este problema, que seja financeiramente aceitável do ponto de vista das instituições que vão ter de pagar mas que seja também aceitável por aqueles que tiveram de fazer a guerra e que não a queriam fazer, ou ainda que a quisessem, porque o certo é que tiveram de a fazer, a menos que alguém diga que podiam ter desertado para o estrangeiro, e creio que ninguém vai aqui dizer isso. Então, se fizeram a guerra, se a fizeram em condições de serviço militar obrigatório, temos de ver como resolver este problema. E entendo que vale a pena pensar como é que ele deve ser resolvido, porque a situação actual é, de facto, gravosa. E é particularmente gravosa, quando comparada com outras situações que ocorreram entretanto, isto é, quem requereu a contagem de tempo em 1975 ou em 1976 fê-lo com toda a tranquilidade e pagando um tostão, sublinho, um tostão, quem o fizer agora, se for, por exemplo, um técnico superior de 1.ª classe, que ganha, por hipótese, 350 000$, terá de multiplicar 10% disso, ou seja, 35 000$, por 60 meses de serviço e pagar tudo ao Estado. Esta é uma situação razoável? Não se poderá encontrar uma situação intermédia, de equilíbrio, que pondere, com justiça, esta solução? É um apelo que aqui deixo para que a questão seja estudada.
O terceiro problema que se coloca é o da bonificação para os que estiveram em zona de risco. Essa bonificação existia na Caixa Geral de Aposentações, existia para aqueles que descontavam para a Caixa Geral de Aposentações, pagando 10% - o Sr. Provedor de Justiça o diz -, mas não existia para os que descontavam para a Caixa Nacional de Pensões. Através do Decreto-Lei n.º 311/97, isso foi resolvido, isto é, os que descontavam para a Caixa Nacional de Pensões puderam também aceder à bonificação, só que acederam à bonificação pagando um preço pesado. De facto, conforme perguntei, há pouco, ao Sr. Deputado Paulo Portas, enquanto os que estiveram na Caixa Geral de Aposentações puderam descontar os tais 10%, no ano passado, há 10 anos, há 20 anos, e, como tal, em valores muitos baixos, estes, agora, são obrigados a descontar 18% aos valores do vencimento actual. Isso cria, de facto, uma situação de disparidade e também deve ser considerado.
Portanto, creio que o espírito com que deveríamos estar aqui era o de analisar estas questões, porque não são inventadas e dizem respeito a uma geração que tem hoje entre os cinquenta e tal e os sessenta e tal anos. É uma geração que está hoje a olhar para a Assembleia e a perguntar: «Vocês são capazes de encontrar uma solução aceitável?». Não pedem o mundo! Nem nós podemos dar o mundo mas temos de encontrar uma solução aceitável!
A minha última reflexão sobre esta questão é a seguinte: já disse, várias vezes, no decurso da minha intervenção, que uma resposta para este tipo de problemas não pode ser meramente economicista mas também não pode ser uma resposta que ponha em risco o sistema de segurança social quer da Caixa Geral de Aposentações quer da Caixa Nacional de Pensões. Isto é, temos de ser, simultaneamente, suficientemente emotivos para responder a este apelo, que é um apelo de gerações, e frios e realistas para não comprometer o nosso futuro e o futuro de todos aqueles que contribuem para a segurança social. É neste quadro que faço o apelo para que estes projectos relativos à Caixa Geral de Aposentações sejam discutidos na especialidade, em comissão.
Quanto ao projecto dos oficiais milicianos, apelo a que seja aprovado de imediato e que suba aqui brevemente para votação final global.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Paulo Portas

O regime que defendeu para os beneficiários do sistema de segurança social está consagrado no Decreto-Lei n.º 311/97, de 13 de Novembro, pelo que o projecto de lei do CDS-PP é uma alteração a esse regime por forma a «igualizá-lo», a aproximá-lo do regime dos beneficiários da Caixa Geral de Aposentações.
Ora, no regime da Caixa Geral de Aposentações, o recurso a esta bonificação também parece implicar o pagamento de uma quota de 10%. Pergunto: o que o CDS-PP pretende é que a quota passe a ser de 10% em vez de 18%, como consta do referido decreto-lei? É esta a «igualização» pedida?