Intervenção do
deputado Bernardino Soares
Programa especial de acesso aos cuidados de saúde
21 de Janeiro de 1999
Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
A origem deste debate e da apresentação do Projecto de Lei do PCP é tão óbvia quanto dramática. Este debate e este projecto
existem porque milhares de portugueses continuam a ver negado o seu direito a receber os cuidados de saúde de que necessitam.
Continuam a esperar por uma intervenção cirúrgica ou por uma consulta externa bem mais do que seria clinicamente aceitável..
Calcula-se que mais de oitenta mil pessoas estejam em lista de espera para receber tratamento ou para ser consultado só nas
unidades hospitalares..
Será possível aceitar esta situação?.
Será possível ignorar que tudo isto acontece quando no próprio Serviço Nacional de Saúde há recursos e capacidades por
aproveitar?.
Não é possível!.
O PCP apresenta este projecto porque o Governo não quis atacar este problema e manteve ao longo destes anos esta inaceitável
situação. Porque ao contrário do que o PCP vem reivindicando o Governo não deu ao problema dos utentes em lista de espera a
resposta imediata que a gravidade do problema exigia..
Não basta agora vir dizer que havia uma herança do PSD, o que é verdade. Não basta agora vir dizer que afinal já há algumas
medidas previstas, aliás tímidas. O que era preciso era uma resposta imediata e direccionada exclusivamente para a questão das
listas de espera. E o Governo só agora no fim do mandato aparece com um assomo de preocupação sobre esta matéria..
Nem é aceitável que o Governo diga, como fez ainda hoje, que as listas de espera têm de existir sempre porque o que está em
causa é a demora clinicamente aceitável. Obviamente que o PCP se refere às situações em que esse tempo é ultrapassado pondo
em causa a recuperação dos doentes ou afectando a sua capacidade de trabalho e a sua qualidade de vida..
O Projecto de Lei do PCP é um projecto sério, equilibrado e eficaz. É um projecto que resolve o problema das listas de espera; mas
é também um projecto que garante a maior eficácia e o maior aproveitamento dos recursos do Serviço Nacional de Saúde sejam
eles recursos humanos, infra-estruturas ou equipamentos. E por isso é um projecto que defende o Serviço Nacional de Saúde..
O que propomos é a criação de condições para que todos os que aguardam cuidados de saúde não esperem mais do que o tempo
clinicamente aceitável para os obter. Utilizamos este critério na certeza de o que é correcto é definir o tempo de espera clinicamente
aceitável caso a caso e não estabelecer um limite taxativo, como faz o PSD ao adoptar um período único de 90 dias, que deixa de
fora situações que exigem intervenção mais célere, como acontece por exemplo com alguns tipos de cataratas ou com as hérnias
discais..
O projecto do PCP é um projecto de profunda racionalidade no aproveitamento dos meios existentes. Parte da avaliação da
capacidade instalada do SNS e promove a sua utilização na resolução dos estrangulamentos existentes..
Faze-mo-lo na convicção de que a falta de resposta do SNS a muitas situações não deriva do esgotamento da sua capacidade mas
sim do seu não aproveitamento. E é preciso pôr termo a esta situação..
Aliás, só pondo toda a capacidade do SNS ao serviço da população é possível garantir, que uma vez resolvida a situação actualmente
existente, é possível continuar a responder sem atrasos às necessidades dos utentes..
Por outro lado o nosso projecto pretende resolver as necessidades mais urgentes de cuidados de saúde, e é por isso que admite
recorrer a meios externos ao SNS quando este não possa responder às necessidades existentes. Mas essa utilização deve ser
subsidiária e não preferencial. Aliás uma das causas da existência de listas de espera, a par do subfinanciamento, foi sempre a
política de desarticulação do SNS, de baixa da sua produtividade, a par do aumento da prestação privada por via convencional..
E a verdade é que a promiscuidade entre público e privado nesta área é uma das principais razões para que o Serviço Nacional de
Saúde tenha hoje muitas potencialidades por aproveitar. De resto o Governo do PS nem sequer aplica as próprias regras que criou
para supostamente disciplinar esta área, mesmo sendo medidas bastante tímidas e de eficácia limitada..
Também por isso o projecto do PSD não é uma solução aceitável para este problema. A ânsia de oferecer ao sector privado mais
uma suculenta fatia do orçamento do SNS está mal disfarçada coma anunciada intenção de combate às listas de espera..
Aliás o PSD resolveu nesta reapresentação do seu projecto, alterar a ordem das alíneas a que se referem as entidades a quem pode
ser adjudicada a prestação de cuidados no âmbito deste programa. É que agora até aparecem em primeiro lugar as entidades
privadas ao contrário do que acontecia em Junho passado. É gato escondido com rabo de fora. Se dúvidas houvesse sobre as
intenções deste projecto terminariam aqui..
E hoje apresentamos aqui uma solução para um dos mais graves problemas dos nosso serviços de saúde na certeza de que para
defender o direito do povo português à saúde é preciso defender o Serviço Nacional de Saúde. É esse o propósito do PCP..
Disse.