Sobre como é que o Governo justifica e enquadra a medida que levará ao fim da comparticipação da pílula contraceptiva
Intervenção de Odete Santos (sessão de perguntas ao Governo)
23 de Setembro de 2005

 

 

 

Sr. Presidente,
Sr. Ministro da Saúde,

Devo dizer que fiquei um pouco estupefacta com a sua resposta à Sr.ª Deputada Helena Pinto, porque se envolveu em critérios economicis-tas e não levou em conta a saúde das mulheres.

Por outro lado, não basta dizer que o aborto é o último recurso.

Nós entendemos que é o último recurso, mas, para que não o seja, é necessário pôr à disposição das mulheres os contraceptivos, e não só, também as consultas de planeamento familiar para reduzir ao mínimo o recurso ao aborto.

V. Ex.ª falou ainda de uma coisa muito preocupante, da «pílula do dia seguinte», que não é pílula aborti-va (não é assim que ela é considerada pelos especialistas) mas, sim, uma pílula anticoncepcional, referindo que ela iria ser posta livremente à venda nos supermercados, etc.

Mas não deviam ser!

Uma coisa é não ser preciso consulta médica, outra é ter de ir à farmácia pedir ao farmacêutico, sem receita médica — e com isto, concordo —, que lhe venda a «pílula do dia seguinte».

É que o farmacêutico pode, com perguntas e o seu conselho, elucidar a pessoa que preten-de comprar esse medicamento.

Aliás, isto é feito com outros medicamentos — eu própria, já por duas vezes, em relação a medicamentos completamente inofensivos, tive de assinar dois papéis, dizendo que tinha sido elucidada pelo farmacêutico sobre como deveria tomar aqueles medicamentos.

Logo, considero que pôr à venda este tipo de medicamentos nos supermercados é uma medida completamente errada.

E, com isto, não estou a dizer que seja necessária receita médica — são coisas diferentes.

Por outro lado, gostava de saber se o Sr. Ministro poderá dar aqui a garantia insofismável de que os centros de saúde vão passar a funcionar bem, pelo menos na área do planeamento familiar, de que vão ter horários para que as mulheres trabalhadoras possam aceder às consultas de planeamento familiar e de que vão ter disponíveis contraceptivos em número suficiente para as mulheres que forem a essas consul-tas.

Devo dizer que já visitei centros de saúde em que me foi dito: «Bom… em relação a contraceptivos, damos aos mais necessitados e os outros que os comprem».

Por último — e esta questão vem já do tempo de um governo do Partido Socialista, que também nada fez —, pergunto: quando é que, por exemplo, se põe em vigor o que está previsto numa lei de 1997 (lei que teve por base um projecto de lei do PCP), segundo a qual, onde houver serviços internos médicos nas empresas deverá haver consultas de planeamento familiar?

A direita também aprovou esta norma.

Quando nós, PCP, quisemos estabelecer, através de um projecto de lei, uma coima para as empresas que não cumprissem esta obrigação legal, tivemos a oposição do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

O que é que V. Ex.ª vai fazer? Nesta matéria, vai ou não ter em consideração tudo o que, a nível inter-nacional, se diz sobre direitos sexuais e reprodutivos?