Intervenção da Deputada
Natália Filipe

Decreto-Lei nº 99/2001, de 28 Março,
que coloca as escolas superiores
de enfermagem e de tecnologia da saúde públicas
sob tutela exclusiva do Ministério da Educação
e procede à reorganização da sua rede,
bem como cria os Institutos Politécnicos
da Saúde de Coimbra, de Lisboa e do Porto

1 de Junho de 2001

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo,

O Decreto-Lei nº 99/2001 que hoje apreciamos é uma demonstração inequívoca da razão do PCP ao criticar e votar contra a Lei da Organização e Ordenamento do Ensino Superior.

Afinal, o que o Governo e o Partido Socialista aqui aprovaram com o apoio do Bloco de Esquerda foi a lei da desorganização do ensino superior.

Se para o Governo o objectivo essencial era a organização do Ensino Superior hoje, e a pretexto da reorganização da rede de Escolas de Enfermagem e de Tecnologias da Saúde, para o PCP é claro que o objectivo é a desorganização.

O Decreto-lei que estamos a discutir é só por si esclarecedor do que afirmamos.

Antes, no quadro de toda a indefinição que existia quanto ao futuro das Escolas Superiores de Enfermagem e das Tecnologias da Saúde, todas as Escolas sabiam que tinham um Estatuto de não integradas.

E agora? Em nome da organização da rede de Escolas tudo é possível:

· A criação de politécnicos da saúde;
· Escolas integradas em politécnicos;
· Uma Escola integrada numa Universidade;
· Outras não integradas;
· E por fim, ao abrigo do artigo 8º, algumas Escolas poderão estar não se sabe muito bem como!

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Afinal, o que pretende o Governo com este tipo de organização da formação na saúde?

Para o PCP a solução encontrada merece a nossa contestação.

O PCP não quer deixar de referir que a solução encontrada poderá não ser a mais ajustada à potenciação das necessidades estratégicas de formação de profissionais que o país necessita, nomeadamente enfermeiros e técnicos de diagnóstico e terapêutica.

Conhecendo as dinâmicas de discussão e de consenso que a Enfermagem é capaz de gerar tenho toda a legitimidade para acusar o Governo de desrespeito pela profissão e pelos Enfermeiros.

À boa maneira do tão apregoado diálogo do Governo do Partido Socialista, não foram ouvidas as organizações e os profissionais que sempre têm demonstrado serem capazes de encontrar as melhores soluções para a profissão, para a saúde e para os cidadãos.

O Governo não soube ou não quis reconhecer o exercício do direito das organizações de dar parecer sobre esta matéria.

Tanto quanto nos é dado a conhecer quer a Ordem dos enfermeiros quer outras associações profissionais de enfermagem e de tecnologias da saúde não foram ouvidas. Assim como as Associações de Estudantes, Associações de Docentes de Enfermagem e Sindicatos de Professores.

E todas elas reagiram e contestaram, atempadamente, a metodologia do Governo e a forma como o processo estava a ser desenvolvido.

A publicação da Resolução do Conselho de Ministros nº 140/98, de 4 de Dezembro desencadeou um processo único de discussão entre os docentes e com os responsáveis dos politécnicos e das universidades.

O esforço realizado no sentido de encontrar as formas mais adequadas de integração nos estabelecimentos de ensino superior, adaptadas às realidades e vivências locais, não merecia a pressa com que o Governo tratou esta matéria.

A questão da transição do ensino para a tutela única do Ministério da educação, só por si, não justifica esta atitude do Governo (à boa maneira cavaquista), ao arrepio de tudo o que estava feito e em desenvolvimento.

O diploma que agora discutimos reafirma a visão elitista do sistema de ensino superior em Portugal. Reafirma o papel do ensino superior politécnico como um ensino superior de segunda escolha e coloca a formação da enfermagem e das tecnologias da saúde num plano secundário.

É previsível o acentuar das desigualdades no financiamento das Escolas.

Estamos convictos que persistirá a discriminação entre os alunos do ensino universitário e os do politécnico, e de entre estes e os alunos de enfermagem e de tecnologias da saúde, nomeadamente em relação à Acção Social Escolar.

Temos grande apreensão quanto à diversificação do tipo de Escolas e às consequências na qualidade de ensino que é reconhecida internacionalmente.
Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

A formação da SAÚDE não é uma bandeira só de alguns.

É DA RESPONSABILIDADE DE TODOS.

Num quadro de exigência imediata do aumento do número de alunos e de regularização dos graus académicos dos profissionais em exercício é insensato manter um quadro de instabilidade que em nada beneficia a formação na saúde.

Disse.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado António Braga,

Agradeço a questão que me colocou, mas relembro que quem mantém o sistema binário ao nível do ensino superior é o PS!


Quem cria escolas no politécnico consideradas como escolas de 2.ª escolha é o Governo do Partido Socialista!

Para o PCP, há uma coisa que é clara: o sistema universitário deve ser único e estar em pé de igualdade e, portanto, quer do ponto de vista da formação, quer do ponto de vista de quem frequenta essa formação, devem existir as mesmas regalias, Sr. Deputado.

O que acontece hoje no terreno, falando, por exemplo, com alunos de enfermagem, é que há discriminações objectivas no que se refere à acção social escolar, quer entre ensino universitário e politécnico e, inclusive, entre estes e as escolas de enfermagem.

É verdade sim, Sr. Deputado.

Mais: o Sr. Deputado falou na ordenação da enfermagem e de tecnologia da saúde para o futuro. Olhe, Sr. Deputado, tenho muita dificuldade em ver que futuro é que vai haver num quadro em que, à partida, há quatro tipos de formação e de organização de escolas, e, inclusive, ainda pode haver um quinto, não se sabe muito bem em que moldes, que está consubstanciado no artigo 8.º deste diploma.

Mais: condenamos o método antidemocrático de discussão desta matéria por parte do Governo, porque atempadamente, em Novembro, as organizações manifestaram a sua oposição à forma como este processo estava a ser discutido. Se o processo tivesse sido conduzido como deve ser do ponto de vista democrático, possivelmente, hoje, até teríamos chegado à conclusão de que esta era a melhor solução. Só que não houve, efectivamente, um envolvimento dos agentes que são responsáveis por discutir esta matéria.

Por outro lado, o próprio Governo - e é esta a contradição, Sr. Deputado -, em 1998, criou expectativas às escolas de enfermagem e de tecnologia da saúde para, no terreno, encontrarem parcerias e formas de articulação e de rentabilização dos recursos que detinham, no sentido de melhor formar os enfermeiros e, inclusive, de aumentarem o seu número no País, coisa que o Governo vai fazendo devagarinho, e, em 2006, haverá 13 000 enfermeiros. Só que as contas não estão feitas devidamente, porque nestes 13 000 se estão a incluir aqueles que hoje já estão a exercer.

Portanto, em nosso entender, todas as expectativas e todo o trabalho que estava a ser feito no terreno entre escolas, politécnicos e universidades caiu por terra e o sentimento que existe, neste momento, é o de que, afinal, andaram a trabalhar e o Governo decidiu sozinho. Ou seja, o Governo, nesta matéria, anteriormente, pedia os pareceres e decidia sem eles, mas, agora, nem tão-pouco pediu os pareceres às organizações que o próprio Estado reconheceu terem legitimidade para dar pareceres sobre a matéria da formação e da política de formação.
Portanto, Sr. Deputado, temos toda a razão naquilo que afirmamos.