A morte de Luís Sá
Intervenção de Carlos Carvalhas no funeral de Luís Sá
16 de Outubro de 1999

 

A despedida que aqui estamos a fazer do nosso camarada e do nosso amigo Luís Sá é marcada pelo choque profundo do seu súbito e inesperado desaparecimento do nosso convívio, que acentua terrivelmente o sentimento de perda que a todos nos atinge e que desde as primeiras horas se traduziu numa comovente e enorme corrente de testemunhos de pesar e de solidariedade.

O Luís deixa-nos na força da vida, na plena maturidade das suas capacidades, saberes e experiências, quando connosco acabava de, empenhada e entusiasmadamente, participar numa importante batalha cívica e política - as eleições - para cujo positivo resultado muito contribuiu. E quando, para enfrentar as tarefas e desafios do nosso país e do nosso tempo, muito havia a esperar da sua contribuição enquanto comunista e destacado dirigente do Partido, enquanto cidadão empenhado, enquanto intelectual prestigiado e respeitado.

Guardaremos sempre do Luís a memória e o exemplo de 25 anos de intensa, abnegada e dedicada militância comunista, sustentada numa grande exigência ética, na seriedade e rigor intelectuais, numa permanente abertura aos questionamentos da nossa época, numa sólida vinculação às grandes causas da dignidade humana, do progresso e transformação sociais, da democracia e do socialismo.

Guardaremos do Luís o património da sua inestimável contribuição de muitos anos de empenhado combate pela edificação do poder local democrático como componente indispensável da democracia avançada pela qual lutou e a que dedicou muito da sua vida e do melhor das suas capacidades.

Guardaremos do Luís a imagem de um destacado e exemplar representante eleito do povo que, no Parlamento Europeu como na Assembleia da República, soube dar testemunho de que a política pode ser uma das mais elevadas e nobres expressões da actividade humana, que pode ser exercida com convicções, com respeito pela pluralidade e diversidade de opiniões, com exemplar sentido de serviço público. e com um permanente enraizamento nas aspirações e interesses populares.

E, de forma especial, guardaremos do Luís a memória comovida de um ser humano sensível, inteligente, fraterno e solidário, marcando com uma profunda e generosa afectividade as suas relações de amizade, de trabalho e de convívio.

Não pretendemos comparar a nossa dor com a dor profunda - que não pode ser descrita por nenhumas palavras - da Ana Teresa, dos seus filhos, do seu pai, dos seus irmãos, dos seus familiares mais próximos, a quem endereçamos um sentido abraço de pesar e de solidariedade, seguramente em nome de todos os camaradas e amigos do Luís, de todos quantos puderam beneficiar do seu convívio.

Com a morte prematura de Luís Sá, o PCP perde um dos seus mais qualificados, promissores e destacados militantes e a democracia portuguesa perde um dos seus empenhados construtores.

Mas não é um lugar comum, nesta despedida física, afirmarmos que o Luís vai permanecer connosco, por via do seu testemunho, da sua obra e do seu exemplo, neste caminho áspero mas esperançoso que vamos continuar a percorrer, neste grande desafio colectivo de transformar a vida e o mundo e de construir um futuro melhor para o povo português e para a humanidade que ele muito amou.