Caros amigos e camaradas:
Nesta prestação de contas, neste balanço de trabalho e também neste esforço
de rasgar perspectivas para o futuro, creio que vale a pena recordar alguma
coisa e sublinhar algumas verdades que poderão ajudar os cidadãos a julgarem
com maior conhecimento de causa. A ligarem as suas opções à prática das várias
forças políticas, às suas escolhas, à sua vida, às suas aspirações e anseios,
ao que desejam para o país.
Como é sabido e como ainda há pouco aqui recordou Octávio Teixeira, logo no
início da legislatura dissemos com clareza que na Assembleia da República seríamos
oposição de esquerda e que não faltaríamos com os nossos votos a tudo o que
viesse de positivo e progressista.
Nessa altura um dos principais economistas do PS afirmava "é difícil distinguir
entre as políticas económicas do PS e do PSD".
E também nessa altura afirmámos "que ninguém podia imaginar que perdendo o respeito
por nós próprios e pelo sentido da nossa luta, passássemos do combate à política
de direita, executada pelo PSD para a complacência com a mesma política só porque
esta seria agora proposta e defendida pelo PS".
E acrescentávamos ainda que "... nós que há anos combatemos esse crime cometido
pelo governo do PSD contra o interesse nacional e contra o património público,
que tem sido o processo de privatizações, temos não só o direito mas o dever
de denunciar que a única queixa que o PS, nesta matéria, faz em relação ao PSD
é que o PSD privatizou pouco e devagar...". E dizíamos mais "... não tardará
o tempo em que empresas básicas e estratégicas e importantes alavancas da economia
sejam dominadas pelo capital estrangeiro, pois o que conta para os grandes senhores
do dinheiro não é o interesse nacional mas o máximo lucro, a máxima acumulação
dos seus grupos económicos..."
O que se passou recentemente com Champalimaud e o que se está a passar com as
Telecomunicações, com a GALP e outras empresas, aí está para o demonstrar.
E se o recordamos aqui hoje, não é naturalmente, por qualquer auto-satisfação,
mas porque o que está em causa é a vida dos portugueses e das portuguesas, dos
seus salários, dos seus direitos, das suas condições de vida e das suas aspirações
e o futuro do nosso país.
Mas nesta prestação de contas importa sublinhar também algumas teses, algumas
verdades que exemplificam o nosso comportamento e o que temos vindo a afirmar:
1º Quem acompanhou a vida parlamentar ou quem analisar com rigor e sem preconceitos
os posicionamentos dos diversos partidos na Assembleia da República, terá de
concluir que o que de mais positivo foi aprovado nesta legislatura tem a iniciativa
ou apoio, ou a pressão, ou o empenho e os votos do PCP.
O PCP, com os seus votos permitiu a aprovação de várias propostas de lei e como
há pouco exemplificou o Presidente do Grupo Parlamentar, propôs e fez aprovar
nesta legislatura cerca de 50 projectos de lei e que hoje são leis da República,
como o programa especial de acesso aos cuidados de saúde (listas de espera)
ou a criação dos Conselhos Municipais de Segurança dos Cidadãos; ou a proibição
da discriminação salarial dos jovens, ou a criação de uma rede de serviços públicos
para o tratamento e a reinserção da toxicodependência, etc., etc.
2º Se o PCP tivesse tido uma maior representação parlamentar teria feito
aprovar mais medidas positivas e progressistas.
Basta lembrar a questão das pausas em relação à semana de trabalho de 40 horas;
a reposição da idade da reforma das mulheres para os 62 anos; a fiscalização
do SIS; os aumentos das reformas e dos vencimentos da função pública; a redução
significativa dos benefícios fiscais ao capital financeiro e especulativo; a
proibição das taxas suplementares aplicadas às comunicações telefónicas...
Creio que ninguém duvida que este teria sido o nosso posicionamento e o nosso
voto e que o povo, a democracia e o país só teriam a ganhar com estas e outras
medidas.
3º Se o PS tivesse tido a maioria absoluta, o poder absoluto a legislatura
teria sido muito mais negativa teria havido mais abuso do poder e muito mais
medidas negativas e retrógradas teriam sido aprovadas.
Desde logo o PS teria aprovado os seus Orçamentos com alterações mínimas, o
que significaria por exemplo, que milhares e milhares de famílias que este ano
não pagarão IRS ou pagarão bastante menos, estando por isso a descontar desde
já muito menos, não teriam este benefício; teria aprovado o processo das incineradoras
de Souzelas e Maceira, não tendo em conta as reservas das populações e dos ecologistas;
teria aprovado o Totonegócio, o pacote laboral, a privatização da Segurança
Social, o Código Penal com a penalização de prisão para o corte de estradas;
as leis eleitorais com os círculos uninominais e o "regabofe dos jobs for the
boys" teria sido muito maior.
Destas três realidades creio que resulta com muita nitidez aquilo que temos
afirmado, isto é, que o país necessita de uma política mais humana, justa e
fraterna. Necessita de uma viragem à esquerda o que exige uma alteração da correlação
de forças entre o PS e a CDU.
Está nas mãos do povo português a concretização dessa viragem.
Na próxima legislatura trabalharemos para que se concretizem as grandes reformas
que o país necessita, no sentido do progresso e da justiça social a começar
pela reforma fiscal.
Tomamos o compromisso de, por exemplo, reduzir em largas dezenas de milhões
de contos os benefícios fiscais nomeadamente, os que hoje são dirigidos aos
capital financeiro e especulativo, desagravando ao mesmo tempo a carga fiscal
sobre os rendimentos do trabalho.
No campo da saúde empenhar-nos-emos para que seja acelerado o nosso programa
aprovado na Assembleia da República, para que se eliminem as "filas de espera"
até ao fim de 2001, para que se generalize os genéricos e para que nas farmácias
hospitalares e centros de saúde sejam distribuídos gratuitamente os medicamentos
que ficam mais caros se comparticipados.
No campo do ensino, apresentaremos uma lei de financiamento do ensino superior
e acabaremos com os numerus clausus dando prioridade à medicina.
As saídas profissionais, o trabalho com direitos e o combate aos vínculos precários
serão grandes prioridades para o PCP.
Portugal é hoje na União Europeia o campeão das desigualdades.
Por isso, o PCP quer ao nível do Orçamento de Estado, quer através de iniciativas
específicas empenhar-se-à em melhorar a distribuição do Rendimento Nacional,
inflectindo a política que foi seguida pelo governo PS.
O aumento com realismo e justiça dos vencimentos dos trabalhadores da Função
Pública, do salário mínimo e das reformas estará no centro das atenções do PCP.
Reapresentaremos também o nosso projecto sobre a interrupção voluntária da gravidez
a par de medidas de reforço de defesa da maternidade e do planeamento familiar.
Em relação à legislação laboral, enterraremos de vez a legislação sobre a redução
das férias e sobre a alteração de conceito de retribuição e tomaremos medidas
para que os vínculos precários sejam uma excepção e não a regra.
Apresentaremos um projecto para a redução para as 35 horas do horário normal
de trabalho, sem redução do salário acompanhando de forma faseada o movimento
que na União Europeia avança neste sentido. E manteremos o nosso empenhamento
na criação de uma taxa (Tobin) sobre os movimentos de capitais, como o fizémos
ainda agora nos últimos dias dos trabalhos parlamentares (1 de Julho) propondo
a inclusão dessa taxa no âmbito do imposto de selo e que foi significativamente
rejeitada pelo PS, PSD e CDS-PP.
O combate à morosidade da justiça, à transparência dos actos administrativos
e aos fenómenos de corrupção estarão também nas nossas prioridades.
A nossa preocupação com a defesa e valorização da produção nacional e a integração
de importantes e estratégicas alavancas económicas e financeiras nas linhas
de desenvolvimento do país levar-nos-ão a apresentar várias medidas em vários
domínios e em relação às empresas públicas, à consolidação do grupo Caixa Geral
de Depósitos, ao fim das privatizações e à detenção por parte do Estado de pelo
menos um capital mínimo (golden shares) em empresas básicas e estratégicas,
para evitar o que sucedeu com o processo Champalimaud-Santander.
Em resumo, a grande preocupação do PCP na próxima legislatura será o crescimento
económico do país com uma grande dimensão social e ambiental e o aprofundamento
da democracia e a participação democrática dos cidadãos.
Camaradas,
O trabalho realizado pelo Grupo Parlamentar e tendo em conta a sua dimensão
é reconhecido mesmo pelos nossos adversários. Trabalho em quantidade e em qualidade,
que creio prestigia o Grupo Parlamentar, todo o Partido, a CDU e também a Assembleia
da República.
Na campanha eleitoral que vamos ter pela frente é nosso dever avivar a memória
e interpelar a consciência de tantos e tantos cidadãos que em tantas circunstâncias,
em tantos momentos e a propósito de tantas questões aqui nos trouxeram as suas
queixas e fortes protestos contra a política do governo do PS.
Perguntar-lhes se entendem que tudo deve ficar na mesma, se entendem que devem
dar apoio a quem não os ouviu e antes mutila e espezinha os seus direitos e
interesses ou se não devem dar mais força a quem precisou e precisa de mais
força para precisamente os defender.
Continuaremos a tudo fazer para servir o povo e o país, continuaremos a lutar
pela transformação social e pelo aprofundamento da democracia, continuaremos
a lutar por um Portugal de progresso e justiça numa Europa de paz e cooperação.