Balanço de Actividade do Grupo Parlamentar
Intervenção do deputado Carlos Carvalhas
6 de Julho de 1999

 

Caros amigos e camaradas:

Nesta prestação de contas, neste balanço de trabalho e também neste esforço de rasgar perspectivas para o futuro, creio que vale a pena recordar alguma coisa e sublinhar algumas verdades que poderão ajudar os cidadãos a julgarem com maior conhecimento de causa. A ligarem as suas opções à prática das várias forças políticas, às suas escolhas, à sua vida, às suas aspirações e anseios, ao que desejam para o país.

Como é sabido e como ainda há pouco aqui recordou Octávio Teixeira, logo no início da legislatura dissemos com clareza que na Assembleia da República seríamos oposição de esquerda e que não faltaríamos com os nossos votos a tudo o que viesse de positivo e progressista.

Nessa altura um dos principais economistas do PS afirmava "é difícil distinguir entre as políticas económicas do PS e do PSD".

E também nessa altura afirmámos "que ninguém podia imaginar que perdendo o respeito por nós próprios e pelo sentido da nossa luta, passássemos do combate à política de direita, executada pelo PSD para a complacência com a mesma política só porque esta seria agora proposta e defendida pelo PS".

E acrescentávamos ainda que "... nós que há anos combatemos esse crime cometido pelo governo do PSD contra o interesse nacional e contra o património público, que tem sido o processo de privatizações, temos não só o direito mas o dever de denunciar que a única queixa que o PS, nesta matéria, faz em relação ao PSD é que o PSD privatizou pouco e devagar...". E dizíamos mais "... não tardará o tempo em que empresas básicas e estratégicas e importantes alavancas da economia sejam dominadas pelo capital estrangeiro, pois o que conta para os grandes senhores do dinheiro não é o interesse nacional mas o máximo lucro, a máxima acumulação dos seus grupos económicos..."

O que se passou recentemente com Champalimaud e o que se está a passar com as Telecomunicações, com a GALP e outras empresas, aí está para o demonstrar.

E se o recordamos aqui hoje, não é naturalmente, por qualquer auto-satisfação, mas porque o que está em causa é a vida dos portugueses e das portuguesas, dos seus salários, dos seus direitos, das suas condições de vida e das suas aspirações e o futuro do nosso país.

Mas nesta prestação de contas importa sublinhar também algumas teses, algumas verdades que exemplificam o nosso comportamento e o que temos vindo a afirmar:

1º Quem acompanhou a vida parlamentar ou quem analisar com rigor e sem preconceitos os posicionamentos dos diversos partidos na Assembleia da República, terá de concluir que o que de mais positivo foi aprovado nesta legislatura tem a iniciativa ou apoio, ou a pressão, ou o empenho e os votos do PCP.

O PCP, com os seus votos permitiu a aprovação de várias propostas de lei e como há pouco exemplificou o Presidente do Grupo Parlamentar, propôs e fez aprovar nesta legislatura cerca de 50 projectos de lei e que hoje são leis da República, como o programa especial de acesso aos cuidados de saúde (listas de espera) ou a criação dos Conselhos Municipais de Segurança dos Cidadãos; ou a proibição da discriminação salarial dos jovens, ou a criação de uma rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção da toxicodependência, etc., etc.

2º Se o PCP tivesse tido uma maior representação parlamentar teria feito aprovar mais medidas positivas e progressistas.

Basta lembrar a questão das pausas em relação à semana de trabalho de 40 horas; a reposição da idade da reforma das mulheres para os 62 anos; a fiscalização do SIS; os aumentos das reformas e dos vencimentos da função pública; a redução significativa dos benefícios fiscais ao capital financeiro e especulativo; a proibição das taxas suplementares aplicadas às comunicações telefónicas...

Creio que ninguém duvida que este teria sido o nosso posicionamento e o nosso voto e que o povo, a democracia e o país só teriam a ganhar com estas e outras medidas.

3º Se o PS tivesse tido a maioria absoluta, o poder absoluto a legislatura teria sido muito mais negativa teria havido mais abuso do poder e muito mais medidas negativas e retrógradas teriam sido aprovadas.

Desde logo o PS teria aprovado os seus Orçamentos com alterações mínimas, o que significaria por exemplo, que milhares e milhares de famílias que este ano não pagarão IRS ou pagarão bastante menos, estando por isso a descontar desde já muito menos, não teriam este benefício; teria aprovado o processo das incineradoras de Souzelas e Maceira, não tendo em conta as reservas das populações e dos ecologistas; teria aprovado o Totonegócio, o pacote laboral, a privatização da Segurança Social, o Código Penal com a penalização de prisão para o corte de estradas; as leis eleitorais com os círculos uninominais e o "regabofe dos jobs for the boys" teria sido muito maior.

Destas três realidades creio que resulta com muita nitidez aquilo que temos afirmado, isto é, que o país necessita de uma política mais humana, justa e fraterna. Necessita de uma viragem à esquerda o que exige uma alteração da correlação de forças entre o PS e a CDU.

Está nas mãos do povo português a concretização dessa viragem.

Na próxima legislatura trabalharemos para que se concretizem as grandes reformas que o país necessita, no sentido do progresso e da justiça social a começar pela reforma fiscal.

Tomamos o compromisso de, por exemplo, reduzir em largas dezenas de milhões de contos os benefícios fiscais nomeadamente, os que hoje são dirigidos aos capital financeiro e especulativo, desagravando ao mesmo tempo a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho.

No campo da saúde empenhar-nos-emos para que seja acelerado o nosso programa aprovado na Assembleia da República, para que se eliminem as "filas de espera" até ao fim de 2001, para que se generalize os genéricos e para que nas farmácias hospitalares e centros de saúde sejam distribuídos gratuitamente os medicamentos que ficam mais caros se comparticipados.

No campo do ensino, apresentaremos uma lei de financiamento do ensino superior e acabaremos com os numerus clausus dando prioridade à medicina.

As saídas profissionais, o trabalho com direitos e o combate aos vínculos precários serão grandes prioridades para o PCP.

Portugal é hoje na União Europeia o campeão das desigualdades.

Por isso, o PCP quer ao nível do Orçamento de Estado, quer através de iniciativas específicas empenhar-se-à em melhorar a distribuição do Rendimento Nacional, inflectindo a política que foi seguida pelo governo PS.

O aumento com realismo e justiça dos vencimentos dos trabalhadores da Função Pública, do salário mínimo e das reformas estará no centro das atenções do PCP.

Reapresentaremos também o nosso projecto sobre a interrupção voluntária da gravidez a par de medidas de reforço de defesa da maternidade e do planeamento familiar.

Em relação à legislação laboral, enterraremos de vez a legislação sobre a redução das férias e sobre a alteração de conceito de retribuição e tomaremos medidas para que os vínculos precários sejam uma excepção e não a regra.

Apresentaremos um projecto para a redução para as 35 horas do horário normal de trabalho, sem redução do salário acompanhando de forma faseada o movimento que na União Europeia avança neste sentido. E manteremos o nosso empenhamento na criação de uma taxa (Tobin) sobre os movimentos de capitais, como o fizémos ainda agora nos últimos dias dos trabalhos parlamentares (1 de Julho) propondo a inclusão dessa taxa no âmbito do imposto de selo e que foi significativamente rejeitada pelo PS, PSD e CDS-PP.

O combate à morosidade da justiça, à transparência dos actos administrativos e aos fenómenos de corrupção estarão também nas nossas prioridades.

A nossa preocupação com a defesa e valorização da produção nacional e a integração de importantes e estratégicas alavancas económicas e financeiras nas linhas de desenvolvimento do país levar-nos-ão a apresentar várias medidas em vários domínios e em relação às empresas públicas, à consolidação do grupo Caixa Geral de Depósitos, ao fim das privatizações e à detenção por parte do Estado de pelo menos um capital mínimo (golden shares) em empresas básicas e estratégicas, para evitar o que sucedeu com o processo Champalimaud-Santander.

Em resumo, a grande preocupação do PCP na próxima legislatura será o crescimento económico do país com uma grande dimensão social e ambiental e o aprofundamento da democracia e a participação democrática dos cidadãos.

Camaradas,

O trabalho realizado pelo Grupo Parlamentar e tendo em conta a sua dimensão é reconhecido mesmo pelos nossos adversários. Trabalho em quantidade e em qualidade, que creio prestigia o Grupo Parlamentar, todo o Partido, a CDU e também a Assembleia da República.

Na campanha eleitoral que vamos ter pela frente é nosso dever avivar a memória e interpelar a consciência de tantos e tantos cidadãos que em tantas circunstâncias, em tantos momentos e a propósito de tantas questões aqui nos trouxeram as suas queixas e fortes protestos contra a política do governo do PS.

Perguntar-lhes se entendem que tudo deve ficar na mesma, se entendem que devem dar apoio a quem não os ouviu e antes mutila e espezinha os seus direitos e interesses ou se não devem dar mais força a quem precisou e precisa de mais força para precisamente os defender.

Continuaremos a tudo fazer para servir o povo e o país, continuaremos a lutar pela transformação social e pelo aprofundamento da democracia, continuaremos a lutar por um Portugal de progresso e justiça numa Europa de paz e cooperação.