Declaração Política no início do ano
parlamentar
Intervenção do deputado Octávio Teixeira
16 de Setembro de 1998
Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhores Deputados
Iniciamos hoje a última sessão legislativa da presente legislatura. Significa isto que entrámos na rampa final do Governo constituído pelo Partido Socialista com base nos resultados eleitorais de 1995, e que não mais o Governo pode iludir os portugueses com o adiamento reiterado do cumprimento de muitas promessas eleitorais.
Neste ano parlamentar o Governo deixa de poder dizer que honrará as promessas eleitorais de 95 ... mas só no próximo ano.
Para este Governo não há próximo ano. É o último. Tenha ele a duração de doze, nove ou apenas seis meses...
Nesta recta final, o PCP, diversamente do que parece ser já visível noutros partidos da oposição, não entrará pela via da oposição pela oposição, do radicalismo verbal, da dramatização meramente virtual ou das propostas com objectivos marcadamente eleitoralistas.
Diferentemente de outros que se poem agora em bicos de pés, o PCP se apresentou, foi e é um convicto e coerente defensor da melhoria das condições de vida dos portugueses e da justiça fiscal e social.
Assumir-nos-emos claramente, como o temos feito, como a oposição de esquerda, responsável e não conformista, ao Governo do PS e à sua política neoliberal.
Como sucedeu ao longo de toda a legislatura, apoiaremos tudo o que for positivo para o País e os portugueses, ao mesmo tempo que criticaremos e combateremos, com a persistência e a dureza necessárias, as políticas e acções do Governo lesivas dos direitos e interesses dos trabalhadores, dos reformados ou dos jovens.
E continuaremos a apresentar iniciativas legislativas e a batermo-nos no OE pela justiça social e pelos direitos essenciais das camadas laboriosas e mais desfavorecidas.
E igualmente podem o Governo e o PS ter a certeza de que, também nesta ultima etapa da legislatura, não lhes daremos tréguas quanto ao balanço das promessas eleitorais não cumpridas.
E desde já queremos deixar muito claro que se esta sessão legislativa for marcada por um ascenso da luta popular e social, a responsabilidade será exclusivamente do Governo.
Pela parte do PCP, e sem qualquer receio das suas hipotéticas incidências na estabilidade politico-governativa, estaremos inequivocamente ao lado dos trabalhadores portugueses para recusar que, no âmbito dos direitos laborais e pela mão do PS, Portugal se aproxime dos países do terceiro mundo.
Se na prática diária de muitas empresas se assiste, com a conivência objectiva do Governo e da Inspecção de Trabalho, a uma crescente desregulamentação e precarização dos direitos do trabalho, o que se impõe é pôr cobro à impunidade dessas práticas ilegais e não alterar a legislação para lhes dar cobertura legal e degradar os direitos dos trabalhadores duramente conquistados no passado. O Governo ainda está tempo de arrepiar caminho nestes seus propósitos.
Do mesmo modo que se os agricultores são pesadamente afectados pelo mau ano climatérico para muitas culturas e produções, o que se exige do Governo é o assumir de medidas e acções que visem ajudar os agricultores a suportarem o decréscimo de rendimentos, como o PCP propôs na Resolução aqui aprovada na passada semana. Não a demonstração de um desproporcionado aparato de forças de segurança visando atemorizar e calar protestos com a violência chocante de cargas policiais. A autoridade democrática tem necessariamente de assentar no diálogo, na justiça e na razão. Não na repressão.
Aguardamos, por isso, que rapidamente o Governo dê sequência à vontade política manifestada pelo Parlamento com a aprovação do Projecto de Resolução do PCP.
Prosseguiremos, com determinação redobrada e com a seriedade das nossas propostas, o combate político para que se concretize a tão proclamada quanto inexistente reforma do sistema fiscal. Visando o alargamento da base tributária, o fim dos privilégios à mesa do Orçamento e a redução da pesada carga fiscal que sacrifica os rendimentos do trabalho.
Não nos conformamos com a mais confrangedora ausência de medidas do Governo nesta matéria. Bem pode o Governo procurar iludir a realidade com a criação de 15 grupos de trabalho e comissões, alguns deles em clara sobreposição, para estudar, estudar e continuarem a estudar.
A verdade é que no final deste seu mandato governativo, o Governo do PS continua a não ter vontade política de reformular o IRS tornando-o mais justo, de promover a reforma da tributação da riqueza e do património, de proceder a um substancial desbaste nos benefícios fiscais e de combater eficazmente a fraude e evasão fiscais.
Não é verdade, inversamente ao que ontem terá afirmado o Primeiro-Ministro aos deputados socialistas, que para realizar a reforma fiscal necessária seja indispensável uma maioria absoluta. É, isso sim, suficiente que haja vontade política e capacidade de diálogo por parte do Governo e do Grupo Parlamentar do PS.
E se o senhor Primeiro-Ministro quer preservar "em boa situação a carteira das famílias" damos-lhe a solução sem esperar quaisquer contrapartidas: inverta as políticas do seu Governo que têm promovido o agravamento da distribuição do Rendimento Nacional em prejuízo dos rendimentos do trabalho. Combata o trabalho precário e de sobreexploração. Promova o aumento efectivo e real dos rendimentos salariais. Desagrave o IRS. Concretize a proposta do PCP da baixa nominal das tarifas da electricidade e reduza o preço das comunicações telefónicas. Realize reformas no SNS para que os cidadãos paguem menos pelos medicamentos e o Estado poupe milhões de contos anualmente. E tenha em atenção os rendimentos, inconciliáveis com um nível de vida minimamente digno, dos cerca de 1 milhão e 400 mil reformados que não foram abrangidos pelos aumentos das pensões anunciados pelo Governo.
Porque se é certo que os aumentos de pensões foram uma medida do Governo que não temos qualquer dúvida em reconhecer como muito positiva, não é menos certo que é de toda a justiça promover igualmente um aumento extraordinário para os que dela ficaram arredados.
O PCP continuará a pugnar por esse aumento, e nesse sentido apresentará novas propostas. E se foi necessário esperar que a Segurança Social acumulasse, em 1996 e 1997, cerca de 270 milhões de contos de superavit, para agora distribuir 10% desse montante no ano de eleições de 1999, queremos crer que a nossa insistência no aumento extraordinário das pensões para os restantes reformados terá desta vez uma mais rápida resposta positiva por parte do Governo.
Porque o que está em causa, ao contrário do que afirmou o Primeiro-Ministro aos deputados socialistas, não é a necessidade de "relançar o discurso social" com o objectivo de "conservar o eleitorado". O que está em causa, o que é sério e se exige, são acções concretas para prosseguir maior justiça social e mais solidariedade com os mais carenciados.
Senhores Deputados Socialistas
O PCP não pretende que o PS nos trate "com cuidado". O que nós queremos é que o Governo trate com cuidado e com justiça os portugueses.
Estou certo que V. Exas., e citando o Secretário-Geral do meu partido, "não se deixarão iludir nem tirar conclusões erradas pelo facto de, na campanha para o referendo da Regionalização, o PCP e o PS coincidirem na defesa do SIM. A verdade é que essa circunstância é um brevíssimo parêntesis de 12 dias, em três anos" que o PS já leva de governação.
O PCP está e estará empenhado neste combate pela regionalização. Pela concretização das regiões administrativas, não pela companhia fortuita e pontual.
A talhe de foice, esperamos que o GP do PS não repita agora erros que cometeu no referendo sobre a IVG. Designadamente, desafiamos desde já o GP socialista a juntar os seus aos nossos votos para que, durante o período da campanha oficial do referendo e nos termos regimentais, os trabalhos do Plenário da Assembleia da República sejam suspensos.
Porque a abstenção no referendo só serve interesses dos defensores do NÃO, percebe-se a atitude obstrucionista do PSD.
Mas seria absolutamente inconcebível que, também aqui, o PS navegasse nas mesmas águas.
Senhor Presidente
Senhores Deputados
A entrada no último ano da legislatura teve para já o condão de pôr o Primeiro-Ministro a falar aos portugueses. Ou melhor, a falar em Portugal, porque os temas escolhidos são fundamentalmente de âmbito internacional. (O que, aliás, não deixa de ser curioso e talvez merecedor de atenção quanto ao seu futuro político... )
Por um lado, parece ter começado a descobrir agora os malefícios do neoliberalismo e querer chamar à pedra os governantes dos países mais ricos. Porque não baixam as taxas de juro, face à ameaça da crise financeira se transformar em económica e alastrar à Europa.
Mas o Primeiro-Ministro omite que a sua própria política interna é neoliberal, e que foi ele que, com a adesão à moeda única e com a assinatura do Pacto de Estabilidade, impôs a Portugal a dependência das decisões dos governantes dos países mais ricos sobre a política monetária. E é bom que o Primeiro-Ministro não esqueça que é ele o primeiro responsável por eventuais consequências nefastas da crise em Portugal. Não os seus amigos Clinton ou Kholl.
Por outro lado, e numa postura no mínimo não usual, critica publicamente a falta de liderança, de iniciativa e de capacidade de inovação da União Europeia.
Seria, porém, conveniente que o senhor Primeiro-Ministro não se deixasse embalar pelo discurso fácil e, modestamente, mostrasse alguma prudência. Principalmente porque nesse âmbito tem muitos telhados de vidro.
Ou não reparou ele que essas acusações (justas) à Comissão Europeia, se encaixam como uma luva ao Governo e ao Primeiro-Ministro de Portugal?
Se ainda não reparou, talvez seja altura de o fazer...
Disse.