Quem acompanha mais de perto e com atenção a vida parlamentar e não se fica
apenas pelos aspectos mais teatrais e mediáticos sabe que o nosso grupo parlamentar
desenvolve, uma grande actividade legislativa e construtiva, a par de uma fiscalização
rigorosa e que com grande empenho procura dar voz aos problemas mais vivos e
sentidos pelos trabalhadores e pelas populações.
Somos pela orientação e pela prática, oposição de esquerda.
Isto significa na nossa intervenção que apoiemos sem qualquer dificuldade tudo
o que nos parece ser positivo para o povo e para o país e que combatemos e rejeitamos
firmemente a política de direita venha ela do PSD, do PP ou do PS.
Combatemos e rejeitamos a política de concentração da riqueza e da acentuação
das desigualdades, tenha ela o nome de ajuda à internacionalização dos grandes
empresários, de privatização ou de mero benefício fiscal.
Combatemos e rejeitamos as políticas de inspiração neo-liberal que têm vindo
a fragilizar o nosso aparelho produtivo cada vez mais dependente e subcontratado.
A propaganda não tapa a realidade de um défice comercial crescente e que ronda
já os 1,8 mil milhões de contos.
Combatemos e rejeitamos uma política que tem acentuado as desigualdades, os
vínculos laborais precários, a desregulamentação laboral e que continua a não
dar resposta aos mais de 500 000 desempregados.
Combatemos e rejeitamos uma política que declarou que iria fazer da droga o
inimigo número um, mas que continua a privilegiar o marketing político pese
embora tal ou tal medida pontual positiva e o trabalho aturado dos técnicos
desta área.
Combatemos e rejeitamos a política dos jobs for the boys quer ela tenha sido
praticada pelo PSD ou agora pelo PS agravada por toda a retórica moralista que
este partido desenvolveu na campanha eleitoral.
Combatemos e rejeitamos a política de favorecimento dos grupos económicos amigos
à custo do erário público, tenha sido ela praticada pelo PSD ou agora pelo PS.
E por isso mesmo o nosso grupo parlamentar deve nestas jornadas avaliar da
possibilidade de tomar por si, a iniciativa de promover um inquérito parlamentar
sobre todos os favorecimentos e decisões muito pouco claras tomadas quer pelo
governo do PS quer pelos governos de Cavaco.
O PS não pode fugir pela porta lateral dizendo que entregou o caso à Procuradoria
Geral da República, pois as questões não se prendem com a legalidade no sentido
restrito, mas sim com a equidade e a verdade dos actos administrativos na utilização
dos dinheiros públicos.
Por sua vez o PSD também não pode fazer de conta que o que passou já passou
e que agora só contam os casos presentes. Tem de ser coerente e não pode mostrar
que "assimilou e assume a ideia" que nos Governos de Cavaco o poder político
esteve subordinado ao poder económico, parafraseando uma sua deputada.
Uma outra questão que o nosso grupo devia avaliar era a da possibilidade de
intervenção no sentido de atenuar a injusta distribuição do Rendimento Nacional
e de combater as cada vez mais extensas bolsas de pobreza.
Não se pode aceitar que a distribuição do Rendimento Nacional continue a penalizar
os rendimentos de trabalho ainda por cima num clima de crescimento económico.
Não se pode aceitar que milhares e milhares de famílias e milhares e milhares
de trabalhadores e de reformados ficam à margem do crescimento económico.
E neste sentido pensamos que o grupo parlamentar devia avaliar a possibilidade
de com urgência avançar com uma iniciativa legislativa atribuindo aos reformados,
nomeadamente aos de mais baixas reformas, um aumento extraordinário de 3000$00.
Seria uma medida de efectiva justiça social e de combate à pobreza pois esta
tem também origem em reformas muito degradadas e seria também uma medida de
dinamização da actividade económica.
Após os festejos sobre o parto do Euro ouve-se agora com cada vez mais insistência
que para o êxito da decisão tomada são necessárias reformas.
É um novo eufemismo para dizer que o Governo, para continuar a cumprir os critérios
de Maastricht tem de se desresponsabilizar das suas funções sociais.
Fala-se na reforma da segurança social, da saúde, do ensino e com voz mais baixa
na reforma fiscal.
Mas em que sentido é que se querem essas reformas?
Na segurança social é cada vez mais claro que com pezinhos de lã, o que se pretende
é criar gradualmente, uma segurançazinha de baixo patamar para os pobrezinhos,
e deixar o lucrativo para as seguradoras privadas. No ensino e na saúde o que
se pretende é o mesmo. É no fim de contas levar à prática, com muito verbalismo
caritativo, em que é especialista este Governo, a máxima de que quem quer saúde
e ensino que o pague. Quanto à reforma fiscal, como há as propostas positivas
da Comissão Silva Lopes, o Governo entende que o melhor é esquecê-la.
Ao mesmo tempo têm em sede de Concertação Social propostas que tirando o embrulho
retórico o que pretendem é precarizar ainda mais os vínculos laborais, restringir
o conceito de retribuição e das férias fazendo depender estas da assiduidade!
Um fartote! E tudo isto com a assinatura de um Governo socialista! É por isso
que o PSD tem cada vez mais dificuldade em se apresentar como alternativa e
só lhe resta o acessório e a gritaria oposicionista para disfarçar a sua concordância
com o essencial.
Cabe também ao nosso grupo parlamentar na esfera da Assembleia da República,
com seriedade mas também com firmeza não deixar que a mentira passe por verdade,
isto é, que o grande oposicionismo verbal do PSD não esconda a convergência
no essencial com a política do Governo. De agora em diante é isso que vamos
ter. O PS é o responsável pelas sucessivas cedências e acordos que fez com o
PSD da trapalhada e da desconfiança com que muitos vêem hoje essa importante
reforma que é a Regionalização, assim como são os responsáveis pela vergonha
e pelo descrédito que é para a Assembleia da República, depois de ter aprovado
a lei sobre a despenalização do aborto, ter agora de esperar pelo resultado
do referendo.
É conhecida a nossa posição sobre esta questão e a nossa coerência política.
Por isso o nosso Partido vai defender abertamente o "Sim", não se escondendo
atrás de movimentos de cidadãos que também apoiamos, nem vai ficar numa posição
de um "nim " à Pilatos, que é cada vez mais uma especialidade do Governo PS.
No nosso partido também não há dirigentes que há oito anos aprovaram a lei sobre
a despenalização sobre o aborto e que agora afirmam publicamente estarem com
o "Não", nem há elementos da juventude que abraçam os seus pares em pose para
a imagem quando a lei foi aprovada para agora darem o seu acordo a que o seu
partido fique sem posição oficial no referendo!... A coerência pode ter custos,
mas por isso mesmo é a coerência.
A nossa postura será assim a de defender o conteúdo da lei aprovada na Assembleia
da República, lutando para que o "Sim" saia vitorioso.
A nossa posição testemunha também nesta matéria uma clara sensibilidade e atenção
aos agudos problemas da nossa sociedade.
A alternativa que vamos enfrentar não é entre o "ser pelo aborto" ou "ser contra
o aborto".
Nas condições actuais, a alternativa é entre o aborto clandestino e o aborto
legal com segurança, informação e prevenção. A nossa posição não visa promover
o aborto, mas sim promover esse indiscutível progresso que será o de transferir
o recurso ao aborto da esfera clandestina para a esfera da defesa da legalidade
e da segurança médica. E como é evidente a legalização proposta não cria nenhuma
obrigação aos que não pretendem usufruir dessa possibilidade legal. Cada um
pode decidir de acordo com a sua consciência e vontade. A legislação em vigor
por ser fortemente restritiva cria coacção e clandestinidade. É por isso que
nos batemos por legislação que valoriza a liberdade, a dignidade e a responsabilidade.
É conhecida a nossa crítica fundada sobre as voltas e as reviravoltas do PS
em relação aos processos e aos acordos de bastidores com o PSD no sentido dos
referendos sobre a regionalização e sobre a interrupção voluntária da gravidez.
O PCP declina qualquer responsabilidade nestes caminhos e nas eventuais fracturas
que estes venham a produzir na sociedade, ou nas dificuldades que eles venham
a introduzir à concretização de importantes reformas para o país. Mas declaramos
que nestas batalhas, o PCP não terá um papel passivo, que lutará com empenho
pelo seu êxito, serenamente, mas com decisão e determinação.
Teremos uma postura ofensiva e mobilizaremos as nossas forças, sem hesitação
e com uma só cara.
É com a seriedade, o rigor, o trabalho e o estudo dos problemas que pautamos
a nossa intervenção. A nossa intervenção política é reconhecida positivamente
por muitos cidadãos sem partido e nomeadamente nas camadas mais jovens.
O reforço da nossa intervenção e o reforço da influência do nosso Partido em
todas as frentes é fundamentalmente para uma mudança de rumo na política nacional.
Portugal e os portugueses não estão condenados a uma política de inspiração
neo-liberal ao serviço dos grandes interesses e dos grandes senhores do dinheiro,
disfarçada aqui e ali pela retórica social.
É com este entendimento que continuamos a nossa intervenção e a nossa luta.
Desejo-vos pois umas boas jornadas, um bom debate, um bom trabalho.