Interpelação ao Governo do PCP, sobre orientações gerais e política global do Governo
Intervenção do deputado Octávio Teixeira
10 de Junho de 1997

 

Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhores Deputados

O debate de hoje, provocado pela interpelação do PCP, reconfirmou uma verdade indesmentível: o Governo do eng. Guterres e do PS preocupa-se mais com as cenas de dramatização artificial da vida política portuguesa do que com a resolução dos persistentes problemas da economia do País e das graves questões sociais dos portugueses.

Confirmou que quem hoje em Portugal prossegue uma delineada estratégia de instabilidade política são o PS e o Governo com a insistência nos ameaços de demissão do Executivo e de eleições antecipadas.

E deixou bem claro que o Governo e o PS têm hoje um grande objectivo e uma enorme ambição e elegeram o grande inimigo.

O grande objectivo é o do enfeudamento às políticas de Maastricht e à marcha forçada para a moeda única, indiferentes às profundas e negativas consequências económicas e sociais que daí decorrerão.

Esse objectivo, exclusivo no plano económico e social, substitui e procura encobrir a completa ausência de uma estratégia e de um projecto do PS e do Governo para enfrentarem os problemas reais com que o País se confronta.

As promessas eleitorais do PS e do eng. Guterres foram totalmente sacrificadas a esse objectivo sacralizado, a essa fixação doentia do Governo.

O Governo não tem políticas nem medidas concretas contra o desemprego, contra a injustiça fiscal, para a melhoria das degradadas pensões e reformas, para o emprego com direitos, para a melhoria dos rendimentos dos trabalhadores e uma mais justa repartição da riqueza criada.

O Governo não apresenta orientações de política que concretizem a proclamada "paixão" pela educação, o combate estrutural à toxicodependência ou condições de acesso mais fácil e rápido aos cuidados de saúde.

O Governo e o Primeiro-Ministro rasgaram os compromissos de finalmente dar cumprimento às disposições constitucionais para a criação das regiões administrativas e de realização das respectivas primeiras eleições no final de 1997, bem como o da duplicação dos recursos financeiros transferidos para os Municípios.

Para o Governo do PS só existe o desígnio da moeda única!

A grande ambição do Governo e do PS é o de conseguirem o poder absoluto.

A essa ambição sacrificam a responsabilidade política, a estabilidade institucional e o respeito por regras essenciais da democracia pluralista, da proporcionalidade eleitoral e da isenção do Estado nos processos eleitorais.

Dramatizam crises virtuais para testar o sentimento da opinião pública, para irem preparando o "ambiente" para momento que considerem mais propício.

É certo que a seguir às dramatizações do Primeiro-Ministro, do Ministro do Planeamento ou do Ministro da Justiça, lá vem o Ministro Adjunto Jorge Coelho, que melhor se poderia designar por administrador-delegado do PS no Governo, a declarar que o Governo e o PS não querem eleições antecipadas.

Mas haverá sinceridade nisso? Ou querem de facto? Mas só depois da aprovação do Orçamento para 1998, para não porem em causa o seu grande objectivo da moeda única? Mas só depois de impedirem a regionalização, para não terem que descentralizar o poder e partilhar os recursos orçamentais? Mas só depois da revisão constitucional e da aprovação de novas leis eleitorais, para poderem eleger mais deputados mesmo que com menos votos?

É ao serviço desta ambição que o Governo e o PS tudo fazem para tentarem incutir na opinião pública a falsa ideia de que "as oposições estão sempre de acordo contra tudo o que o Governo apresenta" e "para impedir que o País trilhe a senda do progresso".

Mas senhor Ministro Adjunto: com seriedade, pode V. Exa. acusar as oposições de impedirem o Governo de governar, quando em dois anos o Governo viu chumbadas apenas 4 propostas de lei e aprovadas muitas dezenas?

No seu íntimo, ou melhor, quando não fala em público, também V. Exa. tem clara consciência que o que impede o país de trilhar a senda do progresso não são as oposições mas sim o Governo, com o seu objectivo da moeda única que imola o desenvolvimento e a coesão económica do todo nacional, a justiça e o progresso sociais.

V. Exa. e o PS sabem que o impedimento ao progresso resulta de o Governo impor cada vez mais ultraliberalismo, mais austeridade nos gastos públicos com as funções sociais, mais desigualdades sociais, mais precaridade no emprego e novas formas de exploração dos trabalhadores.

Que o impedimento maior é precisamente o Governo estar devotadamente a realizar uma política e uma prática em tudo idênticas, e em alguns casos piores porque mais obtusas, às que praticava o PSD quando Governo.

Vem agora o Ministro Jorge Coelho falar nas "caldeiradas entre os partidos das oposições ". Mas os senhores Primeiro-Ministro e Ministro Adjunto conhecem, melhor que ninguém, as "peixeiradas" dentro do PS e do Governo.

Nós só conhecemos as que vêm a público... e já nos bastam.

Por exemplo, as frequentes ausências do Ministro das Finanças aos Conselhos de Ministros. As que ocorreram em torno do totonegócio entre o Ministro Adjunto e o Ministro das Finanças. Ou aquelas outras entre o Ministro do Planeamento ou da Agricultura e o Ministro das Finanças. Ou ainda os já corriqueiros desentendimentos entre o Ministro da Economia e ... o Ministro das Finanças.

E isto, senhores membros do Governo, para já não falarmos das permanentes provas de "solidariedade" política entre os membros do Governo, como aquela a que todos nós pudemos assistir ontem, neste Plenário, quando um deputado do PP pediu a demissão do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e, usando da palavra imediatamente a seguir, o Ministro das Finanças não teve uma única palavra de solidariedade para com o membro da sua equipa ministerial.

Enfim, o senhor Ministro Adjunto desabafa publicamente que "o PS precisa de mais deputados". Pois é, senhor Ministro, senhores membros do Governo e senhores deputados do PS: o Povo não lhes deu mais ... porque não lhos quis dar!

Tenham paciência democrática e não queiram fazer batota nas leis eleitorais para distorcerem e defraudarem a vontade dos eleitores.

O Governo, finalmente, elegeu o grande e principal inimigo: o PCP!

Já não temos memória de um discurso tão anticomunista, tão anti-PCP, como o que nos últimos dias temos ouvido do lado do PS e do Governo.

Mas porquê, senhores?

Por causa da proposta de lei das finanças locais não é certamente. Esse é apenas o pretexto, enrolado numa catadupa de falsidades proferidas por membros do Governo e pelo Presidente do Grupo Parlamentar do PS.

As razões são outras, bem mais verdadeiras e sérias.

O discurso anticomunista do PS sobe de tom porque o PCP vai mostrando publicamente que, como afirmou um deputado socialista, cada vez mais o PS e o Governo substituem os princípios e valores por interesses.

Porque nós mostramos e provamos, dia a dia, que não é o PCP que impede o PS de realizar o seu programa eleitoral. É o Governo do PS com a sua política!

Porque nós mostramos que as "caldeiradas" não são entre o PCP e o PSD e PP, mas permanente e profusamente entre o Governo e PS e o PSD e PP. Aí estão, por exemplo, os Orçamentos de Estado, as leis da flexibilidade e polivalência, do aborto, das uniões de facto, o impedimento da regionalização, a revisão constitucional, a corrida para o EURO e tantas outras dezenas de exemplos possíveis.

O Governo e o PS não suportam a oposição do PCP, fundamentalmente porque isso mostra em permanência aos portugueses que há uma política e um projecto de esquerda em Portugal. E isso torna mais evidente que, em tudo o que é essencial, a política e o projecto que o PS e o Governo prosseguem nada têm de esquerda.

Mas o Governo e o PS vão ter que se conformar com a nossa oposição responsável ao prosseguimento de uma política contrária aos interesses de Portugal e dos portugueses.

E o Governo tem de se resolver definitivamente: ou quer provocar a instabilidade política e eleições antecipadas, e então assuma-o responsável e claramente sem encenar e ficcionar pretextos; ou não o quer e acaba de uma vez com as dramatizações de crises virtuais.

Pela parte do PCP podem estar certos que em qualquer das circunstâncias continuaremos a pugnar por uma política de esquerda e por um Portugal de progresso económico e social.

Disse