Interpelação ao Governo do PCP, sobre orientações gerais e
política global do Governo
Intervenção do deputado Carlos Carvalhas
10 de Junho de 1997
Senhor Presidente
Senhores Deputados
Decorridos perto de dois anos desde que o Governo tomou posse e quando se aproxima o meio da Legislatura, há duas conclusões inegáveis a tirar: primeira, o PS violou ou deixou sem cumprimento muitas das promessas eleitorais que fez há dois anos durante a campanha para as legislativas, incluindo promessas constantes dos Estados Gerais e do Programa Eleitoral; segundo, o Governo afastou-se decididamente de uma política de esquerda e realizou no essencial, no que é mais estruturante, uma política de continuidade das políticas de direita dos governos/PSD de Cavaco Silva. Bastariam estas duas graves constatações para que uma interpelação ao Governo como a que o PCP faz fosse absolutamente necessária e oportuna. Acresce entretanto um outro facto: por responsabilidade do PS e da sua fúria revisora, o Governo encontra-se "dispensado" da obrigação de prestar contas neste momento ao País sobre o Estado da Nação, no debate que, desde que foi criado no Regimento desta Assembleia, sempre se realizou neste mês de Julho. Por isso, esta interpelação é a oportunidade para o Governo ser confrontado com o Estado da Nação, e com as críticas e acusações que a sua política suscita. Esta não é uma interpelação sobre políticas sectoriais, não porque não haja graves responsabilidades do Governo no estado de muitas dessas políticas, mas porque a questão que hoje se coloca é da situação a que está a ser conduzido o País como resultado das opções fundamentais da política do Governo. Só o Senhor Primeiro Ministro e a sua equipa de propaganda é que podem não se ter dado conta do profundo desânimo e desencanto que grassa no País, nomeadamente em muitos milhares de cidadãos que votaram PS. Quanto mais o Ministro Jorge Coelho proclama êxitos do Governo como quem vende banha-da-cobra, mais os portugueses se interrogam por que razão não lhes cabe nem uma migalha de tais auto-proclamados êxitos e pelo contrário, o que sobra para o povo é uma pesada factura. Só o Senhor Primeiro Ministro é que pode fazer de conta que ignora que nas questões essenciais o País enfraquece e desvitaliza o seu aparelho produtivo e está sem solução para os graves problemas que enfrenta. Não há propaganda que consiga disfarçar as dificuldades sociais de milhares de famílias, a crise que afecta importantes empresas e sectores produtivos e a debilidade em geral da economia portuguesa. Por alguma razão os Ministros que averbam os fracassos governativos mais espectaculares são precisamente os Ministros ligados à actividade produtiva, os Ministros da Economia e da Agricultura, e a Ministra do Emprego. Ao longo destes quase dois anos de Governo do PS, acentuou-se o processo de desindustrialização, e notícias recentes, como as que ainda esta semana surgiram sobre o sector metalomecânico mostram que esse processo tende a agravar-se mais ainda; quanto à agricultura e às pescas, prosseguiu o irresponsável processo do seu desmantelamento, deixando o País cada vez mais à mercê das importações alimentares; o comércio, ao mesmo tempo que é cada vez mais dominado pelas cadeias internacionais e pelas grandes superfícies, sofre duramente a falta de dinâmica do consumo privado, como resultado do escasso poder de compra e da falta de confiança dos consumidores no futuro; quanto ao desemprego, não só se consolida como um elemento estrutural da sociedade continuando sem qualquer perspectiva de solução, como se agrava o desemprego de longa duração, conduzindo milhares de cidadãos em idade activa ao drama da exclusão e da pobreza; quanto à qualidade do emprego, continua o processo da sua degradação, em tais termos que hoje nenhum jovem espera ter emprego estável, condenado como está ao recibo verde, ao contrato meio clandestino ou ao biscate de ocasião.
Dir-se-à que este é um resultado inevitável de um Governo PS que abandonou voluntariamente todas as referências de esquerda e socialistas e que não se quis mais do que um "gestor do capitalismo". Só que, pior do que um "gestor do capitalismo", o Governo assumiu-se como um servidor cego e obediente das orientações neo-liberais e monetaristas impostas pelo mais alto poder político, económico e financeiro europeu e mundial. Mais do que "gestor do capitalismo" o Governo PS adoptou como políticas alguns dos aspectos mais injustos e desumanos do capitalismo selvagem. E é desta orientação fundamental que resultam alguns dos traços mais significativos das políticas governamentais, que aqui registamos em sete notas acusatórias.
Primeiro: acusamos o Governo de ter abandonado uma séria perspectiva social da política em benefício do poder das forças do mercado. É o que resulta, por exemplo, das ameaças lançadas sobre o sistema de Segurança Social. É o que resulta do sistemático desarmamento do Estado para o exercício das suas funções sociais, como se o Estado fosse alheio aos valores da justiça, solidariedade e segurança que são património da sociedade e conquistas alcançadas ao longo de anos e anos de lutas sociais que marcaram profundamente o pensamento da esquerda. Não se trata de atender às situações-limite de pobreza e exclusão, trata-se da protecção e garantia dos direitos sociais fundamentais a toda a população, incluindo, entre outros, os direitos à educação, saúde, segurança social e habitação. Trata-se da situação dos trabalhadores, das profundas carências dos idosos e reformados, dos direitos da juventude, das mulheres, dos deficientes. Uma real perspectiva social põe estes princípios e os direitos destas camadas acima das exigências neo-liberais e monetaristas. É isso que também distingue a esquerda.
Em segundo lugar, e em consequência, acusamos o Governo de ter posto à frente dos interesses das pessoas, as pressões dos lobbyes dos grupos económicos e as exigências cegas dos mercados financeiros. Não há matéria em que o Governo tenha falhado tão rotundamente como na promessa de que iria governar para as pessoas. O alto desígnio, hoje mais que uma vez confessado pelo Governo, não são as pessoas, são os critérios de Maastricht. Em vez de pessoas, o Governo fala de competitividade, eufemismo para o lucro dos grandes, a que o Governo quer sacrificar tudo, incluindo as pessoas, o seu emprego, a sua subsistência e a das famílias.
Em terceiro lugar, acusamos o Governo de sacrificar os interesses nacionais, em benefício da construção de uma Europa federal e para ganho de grandes empresas estrangeiras que cada vez mais dominam a economia portuguesa. Muito para além das consequências objectivas do processo de internacionalização, o Governo capitula perante todas as exigências dos países mais poderosos, permitindo que sectores fundamentais da nossa economia, incluindo os têxteis, metalomecânica pesada, conservas, agroalimentar, pescas, agricultura, construção naval, etc., sejam desmantelados ou levados a situações de concorrência desleal que os condena à falência e, a prazo, ao desaparecimento.
Em quarto lugar, acusamos o Governo de deixar os problemas fundamentais sem solução, governando mais para a auto-propaganda do que para o País. Políticas como da Educação, da droga, da saúde, etc., são bem demonstrativas.
Na educação o Governo elege as propinas como paixão e prefere mercantilizar o sistema educativo, ignorar os numerus clausus e as exigências e as necessidades do desenvolvimento nacional.
Quanto à toxicodependência passado o "Dia D" verifica-se que as filas de espera nos Centros de Atendimento (CAT's) para consulta chegam aos 6 meses, continuando o Governo a não apostar numa rede pública de "comunidades terapêuticas". E a reinserção socio-laboral é pouco mais que inexistente.
Também nestes domínios a esquerda se afirma pelo combate ao elitismo, ao negocismo e por assumir as funções sociais do Estado dando a máxima eficácia aos dinheiros públicos.
Em quinto lugar, acusamos o Governo de desbaratar o património público, num autêntico regabofe de privatizações e concessões de serviços públicos que torna o País num despudorado casino onde só ganham os grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros. Com a desculpa implícita de Maastricht e com a desculpa da necessidade de diminuir o peso da dívida e o défice público, foram postas à venda empresas estratégicas, que constituem um alto valor patrimonial construído ao longo de gerações. Para forças de esquerda que tenham o sentido da importância de um sector público estratégico e que saibam representar os sacrifícios de gerações que permitiram a sua constituição, o que o Governo tem feito constitui um crime contra a colectividade, só com semelhança na despudorada venda de bens nacionais feita no século passado e que esteve na origem das grandes fortunas fundiárias da nova burguesia. Vender como o Governo tem feito, empresas como a EDP, a Telecom, a Tabaqueira... é ter perdido o sentido do interesse nacional. Mas a sanha privatizadora do Governo não tem limites. Quer privatizar tudo: estradas, aeroportos, água e lixos, indústria militar, vai tudo raso! Como comentava um ilustre autarca socialista (Mário de Almeida, "Semanário", de 21.06.97) «o Governo não pode ter uma lógica social na Europa e ultraliberal aqui...».
Em sexto lugar, acusamos o Governo de defraudar os interesses e direitos dos trabalhadores, como designadamente fez com a promessa não cumprida das 40 horas, com a aprovação da lei da flexibilidade e polivalência, com a rejeição da reposição da idade da reforma das mulheres aos 62 anos ou com as ameaças do aumento da idade da reforma. E para que ninguém fique com dúvidas acerca do significado desta acusação, aqui reafirmamos que não há política de esquerda que não tenha a defesa do mundo do trabalho como critério e objectivo essencial. Uma política de esquerda tem os interesses e direitos dos trabalhadores no lugar de honra, e não os critérios de Maastricht como faz o Governo.
Em sétimo lugar, acusamos o Governo de ter ocupado sistematicamente o aparelho de Estado com"tachos para a rapaziada", os famosos boys que o senhor Primeiro Ministro esconjurou mas a quem depois abriu a porta complemente. Aliás, quanto à proclamada tese de que, o que distingue os governos do Partido Socialista Europeu, incluindo o PS, dos Governos do Partido Popular Europeu, incluindo o PSD, é a "forma de governar", é o "estilo"(!), pelos vistos a diferença não é assim tão grande. Quem fala da arrogância dos Governos PSD pode encontrá-la no comportamento por exemplo do Ministro Sousa Franco, que vai ficar conhecido pelo ministro dos avales e Pilatos como o foi com o IVA em relação ao seu Secretário de Estado ou com o Ministro da Economia em relação aos negócios do Autódromo e da Torralta. Está a passar a fronteira do autismo. Quem fala das tiradas demagógicas género "deixem-nos trabalhar", pode encontrá-la na crise ficção das finanças locais e na pífia ida à televisão do Primeiro Ministro. Quem fala do "Estado laranja" e dos tachos do PSD, encontra os jobs do PS e a vergonhosa utilização do aparelho de Estado para interesses partidários e eleitoralistas. Quem fala de privilegiar o betão, há-de achar que o Ministro Cravinho e as suas privadazinhas não desmerecem. Falará o Primeiro Ministro nas gravuras de Foz-Coa e das pegadas da Pedreira de Rio Maior. Conceda-se: em matéria de paleolítico e de dinossauros este Governo tem um estilo diferente do anterior. Só é pena não ser possível dizer o mesmo em matéria de pessoas!
Senhores Deputados
Fazemos estas sete acusações com a exacta consciência do que é que elas significam. Desde que o Governo se formou e apresentou o seu programa e as linhas fundamentais das suas orientações políticas, que afirmámos que o PCP era oposição e oposição de esquerda. Denunciámos o facto de o Governo com o seu Programa estar a defraudar a vontade de mudança que o eleitorado português tinha manifestado no dia das eleições, 1 de Outubro de 95.
Decorridos estes quase dois anos, as sete acusações que formulamos são a prova de que a prática política do Governo traiu os portugueses e a sua vontade de mudança.
A lista das promessas não cumpridas é enorme : Onde está a luta contra a injustiça social? Lembram-se quando o Eng. Guterres dizia que Portugal não se podia desenvolver à custa dos baixos salários?
Onde está a maior e melhor segurança dos cidadãos e o reforço e plena concretização dos direitos dos agentes das forças policiais?
Onde está a prometida política integrada de juventude? Onde está a política progressista em relação à mulher (idade da reforma, Interrupção Voluntária da Gravidez, Uniões de facto, "quotas"...)
Que é feito do reforço estrutural da economia portuguesa, onde param as políticas económicas orientadas para um desenvolvimento sustentável, regionalmente equilibrado, socialmente justo e criador de emprego?
Mas a principal e fundamental promessa incumprida, foi a de abandonar a política da direita. Pelo contrário: o Governo PS optou decididamente pelas políticas de direita, de continuidade das políticas dos Governos do PSD, e ao longo deste tempo, sempre procurou para as questões essenciais o apoio da direita. Foi assim com a política económica e financeira, com os Orçamentos do Estado, com as leis laborais, com a política europeia, com a revisão constitucional, e mesmo na regionalização, no que toca a calendários e métodos, é a direita que o PS procura ficando inclusivamente nas suas mãos.
Ora com o PSD e PP, ora com o PSD, ora com o PP quando o PSD por manobra se entende distanciar, o Governo PS fez da direita o seu rumo, a sua muleta e o seu cúmplice. Por isso não espanta que Ferraz da Costa afirme mesmo que o Eng. Guterres é mais liberal do que Cavaco Silva!
Aliás, esta interpelação ocorre precisamente quando o entendimento essencial com o PSD é mais vasto e mais profundo. PS e PSD estiveram há dias juntos no apoio às decisões do Conselho Europeu de Amsterdão, incluindo a decisão de deixar intocado o objectivo da moeda única e todo o capítulo da UEM no Tratado de Maastricht, bem como de não mexer no Pacto de Estabilidade, com a sua imposição para o futuro, para além da moeda única, dos critérios monetaristas e neo-liberais de Maastricht.
PS e PSD estiveram e estão juntos mais uma vez no adiamento do processo de Regionalização, no incumprimento da data de 15 de Julho como data limite para aprovação no grupo de trabalho do mapa das regiões e no adiamento para depois da revisão ou talvez para todo o sempre.
PS e PSD estão juntos neste momento no objectivo de concretizar o seu vergonhoso acordo de revisão constitucional a mata-cavalos, antes de férias para que passe o mais despercebido possível.
Como dizia uma deputada socialista «esta revisão constitucional não é decisiva para o País nem dá de comer a ninguém». E acrescentava: «nas questões de fundo é um Tratado de Tordesilhas feito entre o PS e o PSD para repartirem entre si o território eleitoral...».
De facto o que no essencial se pretende com a revisão é através da redução do número de deputados combinado com os círculos eleitorais a obtenção de maiorias com menos votos. Maiorias de secretaria...
Mas como pode um cidadão de esquerda estar de acordo com estas engenharias eleitorais, ou com a decisão de se consagrar a existência apenas facultativa de um sector público, ou com a retirada de marcas do 25 de Abril ou com a inviabilização de referendo sobre a moeda única, ou com o voto sem equidade nem possibilidade de controlo dos emigrantes para a Presidência da República, ou também com a constitucionalização de limitações à lei da greve, ou ainda com o aprisionamento da Regionalização à vontade do PSD.
Um cidadão de esquerda não pode aceitar que o PS tenha acordado com o PSD uma revisão satisfazendo todas as velhas exigências da direita que vem do tempo de Soares Carneiro. Um acordo que PSD e PP consideram uma vitória. Um acordo que levou à demissão do Presidente do Prupo Parlamentar do PS e do Presidente da CERC e que tem o repúdio da opinião democrática. Mas este é o acordo que o Primeiro-Ministro quer, contra tudo e contra todos, se traduza na Revisão até 31 de Julho.
Do mesmo Primeiro-Ministro que também com as suas declarações derrotou na prática o projecto assinado por 50 deputados socialistas sobre o IVG e que se opôs a que o PS apresentasse qualquer projecto sobre "Uniões de facto"...
Do mesmo Primeiro-Ministro que ainda há dois meses declarava que o PS e o Governo "só têm feito asneiras". Do mesmo Primeiro-Ministro que já se mostrou publicamente arrependido do Totonegócio, mas que mantém um pudico e prudente silêncio sobre os avales do ministro das Finanças, que nada diz, por exemplo, quando um deputado socialista acusa o seu Ministro da Agricultura de "defender interesses" e de ter uma política agrícola de "continuidade" da política do PSD, ou quando este por sua vez ofende os agricultores portugueses dizendo-lhes que não sabem produzir fruta. De um Primeiro-Ministro que devendo exigir solidariedade entre os seus ministros deixa por exemplo, que o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares comente o fracasso do Plano Mateus nos seguintes termos (JN de 18.06.97): «Houve um excesso de ingenuidade na apresentação do Plano...», «O Plano não produziu os resultados esperados...»! Coitado do ingénuo Ministro Mateus...
Senhor Presidente
Senhores Deputados
O PS começa a sentir o terreno que pisa inseguro e movediço.
Mas em vez de mudar de rumo tenta as «chantagens» e usa e abusa do aparelho de Estado para fins partidários e eleitoralistas. Ele são os boys nomeados logo após serem apresentados como candidatos, eles são os governadores civis na distribuição de cheques algumas vezes com os candidatos às Câmaras pela mão, ele é a apresentação de candidatos com o anúncio de ministros, ele é o atrasar e adiantar obras em socorro dos autarcas na "corda bamba", ele são as inspecções às Câmaras e a divulgação à imprensa de conclusões no preciso momento do anúncio das candidaturas, ele são as visitas de ministros e mais ministros, como em Coimbra que só nos últimos dois meses recebeu 10 Secretários de Estado e 11 ministros, com realce para a Ministra do Emprego por coincidência Deputada pelo respectivo círculo! Um fartote!
Simultaneamente retoma a velha tese das "forças de bloqueio" com aquilo a que chama "coligações negativas" e, de dois em dois meses, diz que se vai demitir, no estilo do valentão que grita "agarrem-me... senão eu bato-lhe!". Aliás o PS nem tem muito que se queixar pois até agora só teve quatro propostas rejeitadas. A do totonegócio, a do código penal com os cortes de estrada, a dos estrangeiros na televisão, e agora a das Finanças Locais.
Admitimos que a ideia da demissão já tenha passado pela cabeça dos dirigentes do PS. O desejo de poder absoluto é claro! Ensaiaram dramatizações mas o que aconteceu ao Sr. Juppé esfriou-lhes os ânimos ... para já. A dramatização acerca da sua má proposta de lei das Finanças Locais para não ter uma derrota política foi uma encenação falhada. Uma encenação falhada porque:
1º o PS e todos os partidos sabiam que não havia vazio legal;
2º que há três projectos aprovados em Comissão para a elaboração de uma nova lei;
3º que a nova lei nunca será aprovada a tempo de ter implicações no próximo Orçamento;
4º que os "custos" da nova lei nunca porá em causa o Euro pois este tanto é desígnio do PS como do PSD...
Para quê então aquela farsa? Para preparar um pretexto futuro? Para tentar condicionar outras votações?
O País o que precisa é de resposta aos problemas e não de encenações e de dramatizações para efeitos mediáticos. De uma política que dê prioridade às actividades produtivas e não às actividades especulativas e parasitárias, que melhore a repartição do rendimento Nacional e não a concentração da riqueza, que aumente o poder de compra e alargue o mercado interno e não o seu estreitamento, que promova o emprego com direitos e não os vínculos precários, os biscates e o trabalho clandestino.
De uma política que na União Europeia se bata pela concretização do princípio da "coesão económica e social" e de medidas de combate ao desemprego e não de uma política de obediência servil e cega à marcha acelerada e forçada para a Moeda Única.
É inaceitável que o País chegue a 31 de Maio com uma taxa de execução de 15% do II Quadro Comunitário de Apoio numa clara incapacidade de gerir com eficácia os meios financeiros disponíveis... (economia virtual) E não é a economia virtual que disfarça o mal estar...
O mal estar sentido ou difuso, a insegurança quanto ao posto de trabalho futuro, a indignação face às injustiças, o protesto e a luta das mais diversas camadas sociais - classe operária, trabalhadores da Administração e da Função Pública, professores e alunos, armadores, agentes funerários, guardas florestais, mineiros, polícias, têm também reflexos e expressão mesmo dentro do PS. Por isso não é de estranhar que um dirigente socialista tenha afirmado que o "Governo precisa de vitaminas", que outro socialista diga à laia de desculpabilização que "se criaram expectativas irrealistas durante os "Estados Gerias", que outro no Porto, proteste contra a taxa de desemprego no distrito e que outro ainda afirme que "o PS navega à vista, para não dizer à deriva"...
Mas esta expressão de descontentamento tem também o seu jogo de sombras quando se pretende mostrar que há dois "PS"; o PS/Governo e o PS/JS; o PS governo e o PS oposição. O PS situação e o PS alternativa a si próprio.
Mas não é o jogo de sombras, nem a multiplicação das doses de propaganda, nem a divulgação de sucedâneos da tese do "Oásis", nem as estatísticas criativas que alteram a realidade.
E a realidade o que nos mostra é que há muitas famílias a viverem mal, muitas que não terão férias ou que não sairão de casa este verão.
A realidade é a que nos coloca no "pelotão da frente" em relação às taxas de pobreza, às desigualdades, às taxas de analfabetismo, aos baixos salários e baixas reformas. Ninguém pode ficar indiferente em relação a este quadro, nem quando vê empresas e sectores produtivos a serem liquidados, ou quando toma conhecimento que cerca de 50% da população activa tem vínculos precários...
O rendimento Mínimo foi uma medida positiva e ficamos satisfeitos por termos sido os primeiros a apresentar tal medida na Assembleia da República. Mas creio que nos deve fazer pensar a todos porque razão é que havendo um significativo desenvolvimento das forças produtivas, se têm de multiplicar as sopas dos pobres, os bancos a favor da pobreza e medidas como o Rendimento Mínimo!
Isto não é a consequência da política de casino, da política de concentração de riqueza, da política neo-liberal e da marcha forçada para a moeda única, da política ditada não pelas pessoas e a favor das pessoas, mas pelos mercados financeiros?
Haverá muita gente no PS que pensa que sim, que não aceita os dogmas do neoliberalismo e do «pensamento único».
Senhores Membros do Governo
Senhor Primeiro Ministro
O País precisa de uma política de esquerda e não da continuação nas questões essenciais da política de direita.
O País precisa de uma política que defenda e valorize a produção nacional e não de uma política que abra as portas à sua destruição.
O País precisa que se dignifique quem trabalha e não de uma política ao serviço dos grandes senhores do dinheiro, que lança no desemprego ou empurra para a emigração a sua força de trabalho.
Continuaremos, por isso a nossa luta por um novo rumo para Portugal.
Disse