Debate do Programa do XVII Governo Constitucional
Intervenção de Luísa Mesquita
21 de Março de 2005

 


Sr. Presidente,
Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior,

Ggostaria de começar por reconhecer que se apresenta aqui como responsável único de todos os níveis do sistema educativo, do pré-escolar ao ensino superior e, também, à ciência e à investigação. Por isso, naturalmente, será apenas o Sr. Ministro a usar da palavra e não a Sr.ª Ministra da Educação!

Entendemos o recado e, sendo essa a sua postura, é importante que o Sr. Ministro não fique só pela ciência mas dê-nos algumas outras explicações cruciais.

Gostaria de dizer que, num plano tecnológico tão irrealista, diria mesmo pictoricamente irrealista, como o apresentado quer no Programa do Governo quer, antes, no programa eleitoral, seria pelo menos desejável, Sr. Ministro — e estou convicta que o Sr. Ministro é atento a estas matérias, como investigador, como professor—, ao menos uma palavra sobre os recursos humanos na área da ciência e tecnologia. Mas não. O Sr. Ministro apresentou um total silêncio sobre essa matéria.

Então, não lhe causa incómodo que os recursos humanos na área da ciência e da tecnologia estejam depauperados como estão? Não lhe causa incómodo que 8000 bolseiros, vivendo miseravelmente à custa de uma bolsa que o governo do PSD/CDS-PP pagava quando lhe apetecia, não mereçam da sua parte uma palavra, na sua qualidade de investigador, professor e, hoje, Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior? Então, o que vai acontecer aos 8000 bolseiros? O Sr. Ministro fala em 1000 novos postos de trabalho na Administração Pública, pelo que os restantes 7000 deverão ficar à espera de melhores dias…

Sr. Ministro, a questão dos recursos humanos é crucial. Não se pode vir com ideias tão vagas, tão cheias de belas intenções, retirando o que é fundamental. A ciência não vive sem recursos humanos.

Então, e as instalações depauperadas, para não dizer degradadas, de todos os laboratórios do Estado?

Como é possível? O Sr. Ministro sabe o que se passa nos laboratórios do Estado, sabe o que se passa nos institutos, depois daquela célebre decisão do governo PSD/CDS-PP de retirar-lhes autonomia administrativa e financeira. Sabe em que condições trabalham. Sabe que, muitas vezes, não há notícias meteorológicas porque não há dinheiro. O Sr. Ministro sabe que os técnicos não saem do gabinete porque não há dinheiro para trabalharem.

Sobre isto, Sr. Ministro, sobre as pouco dignas condições de trabalho dos investigadores e dos técnicos da área de ciência e tecnologia nos laboratórios do Estado e nos laboratórios associados, silêncio! Nem uma palavra!

E relativamente ao ensino superior, Sr. Ministro? Então, o Sr. Ministro — vem no Programa do Governo — não nos diz, por exemplo, por que «carga de água» três anos mais não sei quantos?! Então, o Sr. Ministro não vem aqui confirmar que o Programa do Governo diz com toda a clareza que o Processo de Bolonha não é por si só, mas é também, uma diminuição da qualificação, uma diminuição do financiamento do ensino superior?!

O Sr. Ministro deveria explicar isto. Está lá escrita, no texto do Programa do Governo, a expressão «por si só», o que significa que o Processo de Bolonha é uma aposta na desqualificação dos portugueses. Então, como é que se pode apostar na qualificação e, simultaneamente, na desqualificação do ensino superior?

Por exemplo, como é que é compatível a ausência de medidas de combate ao insucesso e ao abandono escolares, também no ensino superior, com o aumento das propinas, com o silêncio total sobre a acção social escolar? Isto, quando o Sr. Ministro sabe tão bem quanto nós que o problema do País não é de diplomação a mais, é de diplomação a menos, em todos os níveis e também na área da ciência e da tecnologia.

Sr. Ministro, agora que tem hipótese de responder, comunicando-nos um conjunto de medidas concretas, naturalmente em articulação com a Sr.ª Ministra do outro sector, diga-nos alguma coisa de concreto que possa ranquilizar os portugueses quanto ao que é a qualificação e o desenvolvimento do País.