Declaração Política sobre
a fiscalização da constitucionalidade das normas do Orçamento
do Estado para 2003, relativas aos trabalhadores da função pública,
e algumas das normas do Código do Trabalho
Intervenção da Deputada Odete Santos na
Assembleia da República
30 de Maio de 2003
Senhor Presidente
Senhores Deputados:
Tem o Governo pendentes no Tribunal Constitucional, a fiscalização da constitucionalidade das normas do Orçamento do Estado relativas aos trabalhadores da função pública, e algumas das normas do pacote laboral.
Nas normas orçamentais confronta-se o diploma com o facto de ter feito letra morta da lei que estabelece o direito à negociação colectiva por parte dos trabalhadores da função pública.
Relativamente ao Código do Trabalho, salienta-se a relevância das normas sob sindicância, nomeadamente as que dizem respeito aos direitos colectivos dos trabalhadores.
Quer num quer noutro caso, o PCP, invocou desde muito cedo, a inconstitucionalidade das soluções.
Relativamente aos trabalhadores da função pública a inconstitucionalidade é suscitada pelo PCP no Plenário da Assembleia durante o debate na especialidade do Orçamento do Estado. Em 13 de Novembro de 2002, segundo reza o Diário da Assembleia, os Deputados Lino de Carvalho e Jerónimo de Sousa, afirmaram que o artigo 8º da Proposta de lei era inconstitucional, por violar o direito à negociação e à participação por parte dos trabalhadores da Função pública, previsto, aliás na Lei 23/98.
Relativamente à proposta de lei do impropriamente chamado Código do Trabalho, O PCP denunciou desde o início as inconstitucionalidades do mesmo.
O Governo e a sua maioria, têm feito orelhas moucas à invocação de inconstitucionalidades.
No próprio dia em que o PCP aqui denunciava a inconstitucionalidade das alterações ao Estatuto da Aposentação, o PSD pela voz do Senhor Deputado Patinha Antão, classificava a intervenção do PCP de modismo de esquerda.
Será necessário recordar ao PSD que a Constituição não é uma moda que se use, na estação tal, e que se atire para o sótão quando já não convém.
A Constituição é o texto fundamental, com o qual todos os diplomas se têm de conformar. E se é verdade que ela já sofreu entorses vários, a verdade também é que no que respeita à legislação laboral ela conserva, no essencial, a matriz que nasceu de Abril.
Classificar de modismo a invocação da Constituição, é um acto falhado. Que indica a pouca relevância, que a maioria lhe confere. Como se fosse a Constituição a ter de curvar-se perante a entronização no poder de qualquer maioria.
E se se tratasse de um modismo, por que razão, quando a questão foi levantada na Comissão de Trabalho, ainda antes do debate no Plenário, se apressou então a maioria numa audição aos Sindicatos, que, na sua grande maioria, ou não compareceram, ou, quando o fizeram, afirmaram não reconhecer qualquer legitimidade à Assembleia para substituir o Governo no papel que só a este competia?
O PCP, por mais achincalhantes e afrontosos que sejam os termos utilizados por quem mostra a força bruta do poder, jamais renunciará a apontar vícios e embustes da governação, e o seu desajustamento e afrontamento à Constituição da República.
É preciso que isto seja dito aqui, e muito em especial ao CDS/PP, cujas declarações a propósito do envio do Código do Trabalho para o Tribunal Constitucional, foram um ultraje à Constituição e ao Estado de Direito Democrático que aquela proclama.
O CDS/PP não se coíbe de acusar a Constituição de bloquear, atrasar, impedir; de sequestrar o País, pois este é seu refém.
Afirmando, com despudor, que o Governo não tem de se conformar com a Constituição. Tem é que cumprir o Programa do Governo.
Estranho conceito este, de estado de direito democrático, que atira para o caixote do lixo o nosso texto fundamental, sempre que este não lhe serve.
Não é da Constituição que o País está refém. É desta maioria que o povo português ficou refém, como se vai tornando cada vez mis evidente.
Porque colocando-se o poder político claramente na dependência do poder económico, e subserviente a esse poder, vem amarrando os cidadãos a orientações políticas contrárias à realização de direitos humanos fundamentais como o são os direitos económicos e sociais dos trabalhadores.
Muitas vezes se tem ouvido a maioria gabar a modernidade da sua política:
Mas que modernidade é esta que gera o aumento do desemprego, de tal forma que Portugal é apontado na União Europeia como o País onde se registou maior aumento da respectiva taxa?
Que modernidade é esta que aposta em degradar os salários dos trabalhadores, que são os mais baixos da União Europeia?
Baba-se o governo de gozo, por ler nas estatísticas da União Europeia que 21% é a taxa de risco de pobreza, em Portugal, e que esta é a maior taxa da União Europeia? Querem-nos dizer que é moderno ter 21% dos Portugueses ameaçados de viver com um rendimento inferior a 60% do rendimento médio por adulto?
A pobreza, o desemprego, a baixa taxa de escolarização são receitas muito velhas. Mezinhas cozinhadas com esconjuros de bruxas em noites de lua cheia, no altar onde vão beber formas requintadas e requentadas da exploração assente em políticas monetaristas.
Todos os relatórios das Nações unidas, nomeadamente os últimos Relatórios sobre o Desenvolvimento Humano e sobre o Estado da População Mundial, acentuam a falência das políticas monetaristas, e denunciam o alastramento da pobreza que às mesmas se deve.
É para isto que o Governo quer mãos largas e se vem queixar do freio da Constituição.
A Constituição é culpada por consagrar como direitos fundamentais os direitos dos trabalhadores, nomeadamente os direitos Colectivos.
O Colectivo organizado funciona quase como um repelente relativamente aos grandes interesses económicos que se avizinham.
E porque são esses direitos que dão coesão à luta, não admira que tenham sido um alvo privilegiado no Código do Trabalho.
O Governo seguiu a Bíblia neoliberal, naquele dogma de que os trabalhadores e as suas organizações é que são os culpados. E, claro, a Constituição que os protege.
O Governo desincumbiu-se de um mandato conferido pelos grandes interesses económicos.
Estes ter-lhe-ão dito: por ora, melhor não é possível.
Mas os trabalhadores disseram e exuberantemente: Pior é impossível.
Disse