Debate Mensal com o Primeiro-Ministro
Pergunta de Carlos Carvalhas
na Assembleia da República
27.2.2003
Senhor Primeiro-Ministro
O tema de justiça será retomado noutra intervenção pelo meu Grupo Parlamentar.
Por isso, não lhe vou recordar os insuspeitos qualificativos negativos de vários operadores de justiça sobre o desempenho do seu Governo nesta área, nem o que o Bastonário da Ordem dos Advogados ainda há dias afirmou sobre o Orçamento para a Justiça.
Também não lhe vou recordar o processo das nomeações e substituições de dois Directores Nacionais Adjuntos da Polícia Judiciária e os indícios de governamentalização e apetência de controlo na investigação criminal aos crimes de colarinho branco.
Nem lhe vou lembrar a desprestigiante dissolução pela maioria da Comissão de Inquérito Parlamentar a quem competia apenas a verdade das relações entre o Governo e a polícia.
Só quero questionar as razões porque os Julgados de Paz propostos pelo PCP e aprovados e aplaudidos por todos os quadrantes continuam a ser implementados a conta gotas, quando são uma importante contribuição para tornar a justiça mais rápida e mais próxima dos cidadãos.
Senhor Primeiro-Ministro:
Num encontro entre o Sr. Primeiro-Ministro e vários empresários sobre as relações económicas com a Espanha, o Dr. Durão Barroso terá dito – até agora não desmentido – que não está nada preocupado com a compra de empresas e bancos nacionais por parte de investidores espanhóis.
Ficámos a saber que, para o Primeiro-Ministro o facto de empresas básicas e estratégicas passarem para as mãos de espanhóis tem pouca importância.
Para o Governo do PSD/PP, o facto dos centros de decisão sobre importantes empresas ficarem nas mãos do estrangeiro não tem consequências em relação ao desenvolvimento, ao investimento, ao emprego, à soberania?
E certamente por isso, o Governo convidou para essa reunião, como orador o presidente do grupo Totta, que é controlado pelo Santander, isto é, convidaram “a raposa para o galinheiro”, como já foi afirmado. Fantástico!
Não considera o Sr. Primeiro-Ministro, que seria útil para o Governo dar atenção às preocupações, independentemente das soluções do Sr. Presidente da República, sobre a questão dos centros de decisão nacionais?
Ou o facto de nos transformarmos numa economia cada vez mais subcontratada, dependente, comandada por centros de decisão externos não tem importância nenhuma.
Senhor Primeiro-Ministro
No debate sobre a apresentação do Programa do Governo dissemos-lhe que se fosse para a frente com a política apresentada Portugal entraria em recessão, com o seu cortejo de desempregados. Os últimos dados do INE, do banco de Portugal, da Eurostat aí estão.
O investimento sofreu um novo recuo no final de 2002, tendência que se agravou em Janeiro de 2003.
A quebra de produção é uma evidência. Afastamo-nos da média europeia e até somos ultrapassados pela Grécia.
Desculpa-se o Governo com a crise internacional. Mas a crise internacional não afecta também os outros países?
A obsessão do défice, a política de concentração de riqueza, a política neoliberal e monetária do Governo são as principais responsáveis +pelo agravamento da crise económica e social, com trágicas consequências no futuro.
Em síntese, para o Governo, a compra de empresas estratégicas pelo estrangeiro não tem importância; as sucessivas deslocalizações de empresas não tem importância; o enfraquecimento do aparelho produtivo nacional não tem importância e o alarmante aumento dos desempregados é apenas uma cifra que se trata com analgésicos.
Sr. Primeiro-Ministro, quero recordar-lhe que não há justiça sem paz, nem paz sem justiça, nem justiça nos Tribunais sem justiça nas fábricas, nos escritórios e nos campos; nem justiça com guerras preventivas como a que Bush quer com o bombardeamento do já flagelado povo iraquiano, com mais sofrimentos do povo palestiniano e com a acentuação da crise económica internacional. Os seus apologistas e seguidores poderão vir a ter um barril de petróleo mas serão responsáveis por esta tragédia e condenados pelos povos e pela história.