Debate sobre "O Estado da Nação" (pergunta
ao Primeiro-Ministro)
Intervenção de Carlos Carvalhas na Assembleia
da República
9 de Julho de 2002
Tema relacionado:
Intervenção
de Carlos Carvalhas no debate sobre o" Estado da Nação"
Senhor Primeiro-Ministro:
No debate do Programa do Governo, no Orçamento rectificativo, nos debates mensais, dissemos-lhe que a sua política ia levar à estagnação da economia.
O prosseguimento da política de submissão ao pacto de Estabilidade, de responsabilidade do PSD e do PS, as declarações catastrofistas acerca da situação das finanças e da economia - o país está de tanga segundo o Primeiro-ministro - com vista a criar a psicologia de crise e aplainar o caminho para o aperto do cinto, aos mesmos de sempre, criaram um clima de maior pessimismo e desconfiança que hoje é espelhado nos diversos inquéritos, a consumidores, empresários e cidadãos em geral.
É uma evidência que o país não inverteu antes acentuou todas as tendências negativas que se vinham a manifestar na economia e que está hoje pior que há três meses atrás.
O País terá este ano, segundo o Banco de Portugal, uma evolução do Produto próximo do zero, em estagnação e está mesmo no horizonte a ameaça de uma recessão.
Portugal afasta-se assim da média da União Europeia.
A quebra no crescimento vai reflectir-se também, na quebra de receitas no Orçamento e a política orçamental contraccionista cega e abrupta vai criar acrescidas dificuldades a muitas famílias, empresas e sectores económicos, com o consequente aumento do desemprego e a diminuição do nível de vida dos trabalhadores.
A política orçamental e fiscal que está a ser seguida não vai estabilizar, vai sim intensificar todas as tendências recessivas e com o grave endividamento externo colocar em risco importantes activos e empresas que de um dia para o outro podem ficar nas mãos do estrangeiro, como tem vindo a acontecer com a irresponsável e anti-nacional política de privatizações.
A pressa do Governo não foi no sentido de se preocupar como aparelho produtivo, com a dinamização do investimento, com a deslocalização e encerramento de empresas com as dificuldades de milhares de reformados e de trabalhadores a perderem dia a dia o seu magro poder de compra, com a subida dos preços.
A pressa do Governo querendo beneficiar do período de férias para evitar o debate público, foi sem qualquer consulta, a mata cavalos, utilizando o poder absoluto da maioria, dar satisfação aos grandes interesses: aos banqueiros e especuladores através da contra reforma fiscal; às seguradoras através da contra reforma da segurança social; aos que lucram, fazem e querem fazer negócio com a saúde dos portugueses através das medidas sobre o Serviço Nacional de Saúde.
Também a desvalorização da escola pública, a desresponsabilização do Estado nas funções sociais do Estado, serviços públicos, o fim dos juros bonificados à compra de casa própria e o apertar do cinto aos habituais é uma política iníqua e inaceitável.
Inaceitável é também a entrega dos milhões da Segurança Social à roleta bolsista.
Os escândalos de grandes empresas, ENRON, World.Com Vivendi, a desconfiança e a instabilidade bolsista, o afundamento da bolsa portuguesa são um dedo acusador aos que querem especular com os milhões da Segurança Social.
Sabendo que têm um governo ao seu serviço e sempre aberto a ceder e ir ao encontro das suas reivindicações, os grandes interesses dobram a parada e exigem mais, mais benefícios fiscais, mais desregulamentação nas leis laborais e os representantes das multinacionais alemãs até encontram clima para uma inaceitável e intolerável chantagem pública.
Em resposta, o ministro da propaganda, também conhecido pelo Ministro da Segurança Social, veio dizer que quem manda em Portugal são os portugueses. Melhor dito, melhor feito.
Neste fim de semana lá veio a resposta do Conselho de Ministros, a promessa de uma revisão célere das leis laborais não deixando pedra sobre pedra, e mais umas promessas de investimentos para em termos de marketing, equilibrar as malfeitorias.
Senhor Primeiro-ministro, olhe para os exemplos da OGMA, da Petrogal, da Vestus, da ex-Quimigal, da industria vidreira, do vestuário e da cerâmica, exemplos expressos em muitos requerimentos feitos ao Governo pelo nosso Grupo Parlamentar e até hoje sem resposta.
O Governo diz-se muito satisfeito, auto elogia-se, mas são os reformados, as jovens gerações de trabalhadores, os profissionais da RTP, os trabalhadores da Função Pública, e de tantas e tantas empresas os que pagam as favas da sua política.
Dirão alguns que três meses são pouco na vida de um governo e ainda menos na vida de um país.
Mas os golpes já dados em três meses, pela política do Governo nos interesses de tantos portugueses e as ameaças que desenvolve para o futuro, são suficientes para colocar na ordem do dia a necessidade de uma ampla e decidida resistência contra uma política de injustiça e retrocesso social.