INTERVENÇÕES

Intervenção de Jerónimo Sousa no encerramentos dos trabalhos da
Conferência Nacional - O PCP e o Poder Local
11 de Maio de 2003

 

Camaradas,
Na gestão democrática das autarquias, o nosso Partido sempre considerou como questão indissociável e com valor intrínseco políticas que correspondam às condições de trabalho e procurem resolver os principais problemas dos trabalhadores da respectiva autarquia.

É certo que por vezes se verifica a contradição e até mesmo situações de conflitualidade que resultam do facto nem sempre assumido e esclarecido de serem os órgãos de soberania e em particular o Governo que determinam, decidem, legislam precisamente sobre questões tão importantes para a vida dos trabalhadores como o nível das suas remunerações, da evolução da sua carreira profissional da efectivação da negociação da contratação colectiva.

E isto é tanto mais relevante quanto neste tempo que vivemos o Governo de direita e a maioria parlamentar que o apoia desencadearam uma avassaladora ofensiva que atingindo a generalidade dos trabalhadores, tem como alvo preferencial os trabalhadores da Administração Central e Local, os seus salários, os seus direitos.

É um facto! Mas esta constatação não é impeditiva que a gestão dos eleitos comunistas marque a diferença sobre o papel e os direitos dos trabalhadores na vida da autarquia.

Em primeiro lugar porque no nosso projecto consideramos indissociável a democracia participativa da democracia representativa. Só aliamos a teoria à prática se reforçarmos a participação dos trabalhadores e das suas organizações na vida da autarquia, se o contacto regular com eles, mais do que uma operação de charme ou de conveniência, comporte o conhecimento dos problemas e a disponibilidade para acolher e integrar os seus saberes de experiência feita, já que muitas vezes são eles que mais de perto lidam com as populações, com as suas aspirações e críticas.

Em segundo lugar pela natureza do nosso Partido havemos de assumir o papel central do trabalho na transformação da realidade e de consciência social e consequentemente o acolhimento das ideias, opiniões e outros contributos dos trabalhadores sobre o objectivo do seu trabalho as formas e os meios para o executar.

Os condicionalismos impostos por outros centros de decisão à gestão da autarquia criam muitas vezes incompreenções aos trabalhadores mas pesando como pesam serão impeditivos ou podem levar ao abandono dos elementos que nos distinguem doutros?

Nós temos a ideia de que em relação às autarquias quando somos iguais aos outros perdemos mais do que os outros.

No documento que nos é proposto nesta Conferência a necessidade do respeito escrupuloso dos direitos dos trabalhadores e a sua compatibilidade com a exigência no cumprimento com os seus deveres, o combate ao secretismo e ao bloqueio do acesso à informação que contribua para o exercício consciente e responsável de funções e execução de tarefas. Quando se marginalizam os trabalhadores de questões e decisões que directa ou indirectamente, ou que mais cedo ou mais tarde acabam por entrar em colisão com o seu vínculo de emprego público, com os seus direitos dá-se o conflito, colocam-se trabalhadores contra a gestão com consequências sociais, políticas e eleitorais por vezes irreparáveis no futuro imediato.

É-nos proposto nesta Conferência uma necessária consideração duma política na área social e laboral.

Uma política de criação de estruturas de recursos humanos que envolva a existência de serviços de saúde ocupacional, serviços sociais de apoio aos trabalhadores de protecção na higiene e segurança, o desenvolvimento das componentes de medicina preventiva, de sensibilização para as questões de segurança e do estudo dos riscos profissionais de várias categorias, formas de acolher novos trabalhadores e bom tratamento na preparação dos casos de apresentação, a promoção e empenhamento na formação e valorização profissionais, onde a questão das carreiras operárias e operativas vão assumir cada vez mais importância para a boa prestação pública das autarquias, um esforço audacioso para contornar obstáculos e garantir a estabilidade do vínculo do emprego público ao arrepio da concepção dominante de aceitação passiva do alargamento de contratação precária para postos de trabalho permanente.

Camaradas,
Do que estamos aqui a tratar não é do falso dilema entre os interesses dos trabalhadores das autarquias e os interesses das populações que estão no seu universo. No nosso ponto de vista, no nosso projecto isso não é separável, antes convergente em cada orçamento, investimento, em cada medida ou cada obra ou programa. Porque também no estilo, exercício e efectivação do poder autárquico se pode alicerçar, pela demonstração concreta, uma concepção e uma prática de poder a exercer pelos comunistas noutros níveis incluindo no poder central em correspondência com o nosso programa duma democracia avançada no limiar do século XXI. Ou seja, ter os trabalhadores como protagonistas insubstituíveis no aprofundamento da democracia, no quadro de um processo de transformação social.

Por último uma referência indispensável ao papel que as células do Partido devem ocupar e exercer nas autarquias designadamente no conhecimento dos problemas dos trabalhadores e na defesa dos seus interesses.

Podemos cair na tentação das células do Partido afunilarem a sua análise e discussão para a gestão autárquica.

Entretanto se não devemos autarquizar o conteúdo das discussões e decisões das células também é verdade que não podemos nem devemos sindicalizar o seu conteúdo.

Haveríamos de, particularmente nas situações de maioria estimular a sua contribuição para a procura das soluções que no plano da resolução dos problemas das populações, sejam capazes de identificar os problemas, bloqueios, queixas e estrangulamentos que dificultam e adiam a prontidão e eficácia da intervenção autárquica, que junte os seus trabalhadores, os seus quadros, os seus eleitos com sentido de crítica e de proposta. Mas sempre tendo como referência um eixo central: a defesa dos interesses dos trabalhadores a elevação da sua consciência social e política e a sua integração na luta mais geral dos trabalhadores na acção e intervenção política do Partido. Considerar desnecessária a sua existência e o funcionamento das células do Partido, particularmente nas autarquias onde temos maioria ou onde temos fortes posições e não corresponder ao funcionamento, à organização e à natureza do Partido que temos e do Partido que somos. Reforçar as que existem e criar onde não existem é uma tarefa de grande importância correspondente às orientações que colectivamente assumimos no quadro do reforço geral da intervenção e organização do Partido junto dos trabalhadores.

Mesmo com o risco de estar tão só a actualizar orientações assumidas em resoluções de Conferências e de Congressos anteriores e valorizando muito este Projecto de Resolução que nos é proposto, o que vai determinar o futuro, o nosso grau de influência, o êxito do nosso projecto é concretizar o que está escrito e onde a prática se vai assumir como grande critério de verdade. E é importante que se diga, apesar da ofensiva contra o Poder Local democrático, e porque não confundimos a árvore com a floresta, continuamos a ter uma profunda confiança em milhares de comunistas a valorizar a contribuição ímpar de outros democratas e dos nossos amigos do Partido Ecologista “Os Verdes” homens e mulheres eleitos e que trabalham nas autarquias para enfrentar batalhas e desafios que se nos colocam, a defender também o poder local democrático como parte integrante do património das conquistas e realizações de Abril.

VIVA O PCP