Política Comum de Pescas e liberalização da nossa ZEE
Intervenção de Rodeia Machado
25 de Setembro de 2003

 

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados

É já na próxima segunda-feira, dia 29, que se reúne o Conselho Europeu das Pescas, e aí se joga o futuro das pescas portuguesas e consequentemente o futuro dos pescadores e armadores portugueses.

São os interesses de Portugal e deste importante segmento da economia portuguesa que ali vão ser decididos, sem que o Governo dê conta à Assembleia da República e aos Deputados do andamento das negociações que estão a ser feitas, em sede de Comissão Europeia, ou ao nível dos acordos bilaterais com a nossa vizinha Espanha, país a quem interessa, em primeira linha a abertura das nossas águas das 12 às 200 milhas.

Em recentes declarações prestadas pelo Secretário de Estado das Pescas, em Vila do Conde perante as associações do sector, os argumentos utilizados foram no sentido de uma certa reserva nos conteúdos para não prejudicar as negociações, mas o mesmo não se aplica à Assembleia da República, que deve acompanhar e discutir estas questões enquadradas na fiscalização da actividade do Governo, conforme dispõe a Lei.

Não se compreende, nem se aceita que o Ministro da Agricultura não tenha vindo dar explicações aos Deputados, na Comissão de Agricultura Desenvolvimento Rural e das Pescas.

O argumento utilizado da falta de agenda, não colhe, porque num assunto desta importância, quando estão em causa, princípios da defesa deste sector, pondo em risco as pescas nacionais e o futuro de milhares de postos de trabalho, o comportamento do Ministro deveria ser outro.

É certo que o Governo já tinha aqui estado a informar sobre estas matérias aquando do debate de urgência requerido pelo Grupo Parlamentar do P.C.P., mas não é menos verdade que o Ministério da Agricultura aqui se comprometeu, e nesse mesmo debate, a informar a Assembleia da República do andamento das negociações.

Até hoje nenhuma informação foi prestada sobre esta matéria, sabe-se que houve conversações em sede de Conselho e em negociações bilaterais com a Espanha, sem que conheçamos os seus resultados práticos.

Acresce, que a Assembleia da República aprovou, por unanimidade, recomendações ao Governo sobre esta matéria no sentido de dar mais força às negociações, e não aceitamos que o Governo não informe os deputados do andamento das negociações.

Desconhece-se se o Governo está a conduzir as negociações de forma mais acertada e, por isso, é legítimo perguntar ao Governo como foram defendidos os nossos os nossos direitos legítimos sobre a ZEE, assegurados nos tratados e regulamentos ou como foi utilizado, junto da Comissão e nos Conselhos Europeus das Pescas, o forte argumento da aprovação pelo Parlamento Europeu de uma Resolução sobre a revisão do regulamento 2847/93 que mantém por mais 10 anos o actual regulamento.

A adopção pelo Conselho, de uma proposta diferente dessa Resolução, obrigará a que a nova proposta tenha que ser posta à apreciação do Parlamento Europeu, segundo os Tratados. É sabido que as Resoluções do Parlamento Europeu no capítulo das pescas, são por via de rega, mais favoráveis a Portugal que as propostas da Comissão, por isso entendemos que o Governo deveria insistir nessa questão.

A soberania sobre os Mares Territoriais, já foi aceite pelo Conselho, como uma derrogação até 2013. Não se compreende que o mesmo critério não seja adoptado, para a zona entre as 12 e as 200 milhas.

O princípio de estabilidade relativa, não permitindo o acesso livre de outros estados membros às águas de algumas Z.E.E. dos países do Norte da Europa, justifica a aplicação de tratamento semelhante a nos Z.E.E.

As preferências de Haia, é igualmente outro dispositivo que pode e deve ser evocado. A União Europeia aceitou particularidades do Mar Territorial de Espanha, no Mediterrâneo e aceitou ainda especificidades dos recursos, para justificar um regime especial para a sua gestão. Situação idêntica ocorreu com as pescarias do Mar Báltico.

Todas essas medidas excepcionais beneficiaram vários países, pelo que não se aceita esta legislação quanto a Portugal, tanto mais que os recursos pesqueiros da nossa ZEE se encontram actualmente em estado de sobre exploração.

A situação nalgumas espécies é grave, como o são os casos das duas espécies de tamboril e de pescada, bem como do lagostim.

Mesmo o manancial de sardinha, que neste momento está em situação grave, é contudo considerado, pelos cientistas, em estado de precaução, devido às grandes flutuações dos recrutamentos anuais

Em todo o caso conhece-se o interesse da Espanha na revisão dos acordos bilaterais que lhe permitem pescar sardinha dentro da Zona das 12 milhas. O Governo deve, se necessário, utilizar este instrumento como pressão sobre a Espanha para poder chegar a um acordo que sirva os nossos interesses na Zona Económica Exclusiva.

Os recursos pesqueiros na ZEE, são fundamentais para o País quer do ponto de vista alimentar, social e económico.

É a sobrevivência do sector das pescas que está em causa, são milhares de postos de trabalho que estão em risco.

Não se pode aceitar o acesso livre de outros Estados Membros, especialmente quando não há excedentes de recursos pesqueiros, e por isso mesmo, não aceitamos os argumentos utilizados pelos Senhor Secretário de Estado em Vila do Conde.

Em nosso entender, o Governo partiu derrotado para estas negociações e , em vez de procurar o apoio dos deputados, dos pescadores e dos armadores, envolvendo todos na defesa dos interesses nacionais, preferiu o secretismo das conversações.

O Ministro da Agricultura, e todo o Governo têm que assumir as responsabilidades desta grave situação.