Debate de urgência sobre a Política Comum de Pescas
Intervenção do Deputado Rodeia Machado
1 de Julho de 2003

 

Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Senhoras e Senhores Deputados,

Quando em Junho de 2002, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, trouxe a debate no Plenário da Assembleia da República, a questão da revisão da Política Comum de Pescas, tinha e tem razões para estar preocupado, com tal matéria em sede da União Europeia.

Com efeito, a revisão da Política Comum de Pescas aprovada pela União Europeia, para entrar em vigor em Janeiro de 2003 comportava já no seu seio uma tentativa de liberalização das águas nacionais, que na altura referimos, com, manifestos prejuízos para os pescadores e armadores que o mesmo é dizer, com manifestos prejuízos para os interesses nacionais.

Hoje, tal como há cerca de um ano atrás, estamos confrontados desta vez, com uma proposta de regulamento, por parte da Comissão, bastante mais gravosa e preocupante do que no início era previsível, que a ser aprovada abriria o nosso mar, das 12 às 200 milhas. E nada nos garante que, depois, se não possa abrir a própria zona das doze milhas.

Esta proposta é inaceitável, pelas consequências que daí adviriam para os interesses nacionais, ou seja, seria o desastre total para as pescas portuguesas, o abandono da nossa actividade piscatória, por escassez de recursos dentro de algum tempo, e pelo manifesto desequilíbrio entre a frota espanhola e a frota portuguesa..

Esta proposta da Comissão não é negociável mas apenas recusável, porque põe em causa o actual equilíbrio existente entre Portugal e Espanha.

É bem certo que parte da nossa pesca é exercida na zona das 12 milhas, por questões económica se de especificidade da nossa pesca costeira, mas não é menos verdade, que também é importante a pesca que exercemos fora da zona das 12 milhas, como é o caso dos crustáceos e da pescada, entre outros.

É também por aí que a distribuição dos recursos pesqueiros portugueses se expande e por isso mesmo liberalizar o acesso dessas águas significaria aniquilar, num futuro próximo, os recursos de que Portugal dispõe, seria hipotecar o futuro dos pescadores portugueses.

Aliás, esta proposta é de uma enorme incongruência jurídica e científica.

Argumenta a Comissão, com o fim do período transitório em 31 de Dezembro de 2002, quando na realidade houve dois períodos transitórios, um que vigorou até 31 de Dezembro de 95 e um segundo que vigorou dessa data até ao final do ano transacto.

O primeiro regulava o regime de acesso dos navios portugueses e espanhóis às respectivas águas e o segundo regulava o acesso desses navios às águas sob jurisdição dos dez Estados Membros.

É com base numa disposição transitória que não existe, que a Comissão encontra o segundo argumento, ou seja a necessidade de eliminar um regime discriminatório para Espanha.

Estas questões, como se demonstra, são demasiado frágeis em argumentação, mas demasiado perigosas quanto ás intenções.

Quem ficaria a ganhar perante tal liberalização? Manifestamente a poderosa frota espanhola, que rapidamente invadiria as nossas águas entre as 12 e as 200 milhas.

Isto porque a nossa frota pesqueira está hoje demasiado fragilizada decorrente da imposição pela União Europeia dos abates que ao longo dos anos foram impostos e de uma política nacional de abates que foi prosseguida pelo Governo Português.

Perdemos mais de 40% da nossa frota, e consequentemente perdemos mais de 15.000 postos de trabalho, que passaram de 40.000 para cerca de 25.000 e até esses ficariam em risco se esta proposta fosse aprovada.

Temos com a Espanha alguns pontos convergentes, mas não se pode escamotear que é aos espanhóis que mais interessa a abertura das nossas águas.

E para que serviriam então os acordos bilaterais entre Portugal e Espanha?

Por outro lado, a proposta da Comissão, não tem em conta o parecer aprovado no Parlamento Europeu, votado por larga maioria 334 votos a favor, e 108 contra, pela manutenção por mais 10 anos da actual regulamentação.

Esta é uma questão central a que a Comissão tem que dar resposta, e que o Governo Português deve pressionar. Acresce ainda, que esta proposta é contrária ao que está consagrado na recém aprovada Política Comum de Pescas no que à questão correcta dos recursos em águas nacionais diz respeito

Com efeito, como seria a gestão dos recursos, quem fiscalizaria as licenças e artes de pesca, numa extensão de mar destas dimensões?

Se na zona das 12 milhas, a fiscalização é já de si, extremamente deficitária, quem garantiria essa fiscalização atempadamente?

Pode a Comissão até argumentar que está em debate neste momento uma comunicação sua ao Parlamento Europeu, sobre a fiscalização, mas o que é certo é que a mesma se denomina “Para uma aplicação uniforme e eficaz da política comum de pesca”, o que no caso vertente, nem se sabe como poderia ser aplicada.

Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Senhoras e Senhores Deputados,

Face a estas questões, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, propôs este debate de urgência, para ouvir os responsáveis do Governo Português sobre esta área em concreto, e saber o que está a ser feito para ultrapassar as dificuldades com que nos debatemos no seio da Comissão.

Sabe-se que esta proposta que esteve para ser debatida em meados do mês passado, transitou para próxima reunião, neste mês, e o adiamento não significa que ela terminou, mas antes que a mesma será debatida num curto espaço de tempo. Neste contexto, questiono o Senhor Ministro da Agricultura sobre o que está a ser feito pelo Governo Português, junto dos países membros para que se possa inverter esta situação.

Quais são os nossos aliados para criar as condições necessárias ao impedimento de tal aprovação?

Pensa ou não o Governo Português utilizar os acordos bilaterais Portugal / Espanha, para eventualmente pressionar a Comissão e Espanha, no sentido de que esta recue face às suas intenções?

Que meios de fiscalização existem para defesa da nossa costa e dos nossos recursos?

Senhor Presidente,
Senhores Membros do Governo,
Senhoras e Senhores Deputados,

O que nos interessa fundamentalmente é que sejam defendidos os interesses dos pescadores e dos armadores, e é naturalmente no diálogo com todos os profissionais da pesca que tem que ser encontrada a solução.

É visando a defesa dos interesses nacionais, que ao longo dos anos, o Partido Comunista Português, vem apresentando propostas concretas quer para a revisão da Política Comum de Pescas, em sede da Assembleia da República, como é o caso do debate aqui efectuado em Junho de 2002, onde apresentámos um projecto que deu lugar à aprovação, por unanimidade de uma Resolução da Assembleia, quer no Parlamento Europeu, ou ainda no contributo que foi dado para o Livro Verde.

Mas as pescas nacionais têm ainda outros problemas a que urge dar resposta imediata. São os problemas da 1ª venda em lota, que como se sabe prejudica enormemente os pescadores portugueses, pelo baixo valor que é pago pelo pescado, o que consequentemente lesa o Estado quanto aos impostos, favorece os intermediários e prejudica os consumidores pelos preços exorbitantes em que o pescado é vendido.

Há que encontrar rapidamente uma solução, e desde já, o Partido Comunista Português afirma que está a preparar um projecto de lei no sentido de dar conteúdo a esta questão.

Senhor Ministro da Agricultura, sabemos que o Governo já aferiu o grau de perigosidade da proposta da Comissão, e o que esta representa para as pescas nacionais. O que não sabemos é qual a estratégia do Governo Português para ultrapassar esta questão. Mas de uma coisa estamos certos: o Governo não tem sabido mobilizar o País, os pescadores e os armadores para com eles intervir e pressionar a Comissão Europeia.

O Governo nada diz sobre as negociações que encetou ou não com o Governo do seu amigo Aznar, e é também por aí que passa a resolução desta questão.

O que não queremos, e que sinceramente não desejamos, é que se argumente com o grau de dificuldade em sede de União Europeia, e que mais tarde se venha dizer que se votou contra porque não havia outro caminho - como foi o caso da reforma da Política Agrícola Comum - porque se tal acontecer é ao Governo do PSD e do PP que cabe a grave responsabilidade pela perda deste importante sector de actividade em Portugal.