Comício do 84º aniversário do PCP
Intervenção de Jerónimo de Sousa,
Secretário-geral do PCP
Porto, 12 de Março de 2005
(Extractos)
Celebramos hoje, aqui no Porto, 84 anos de vida do nosso Partido – o Partido Comunista Português.
Comemoramos os seus 84 anos de vida e de luta num renovado ambiente de confiança no futuro do seu projecto e com a convicção do seu ímpar e insubstituível papel na defesa dos trabalhadores, do povo e do país.
Celebramos, hoje, os 84 anos de vida do nosso Partido com acrescido ânimo, vitalidade e alegria, que são o resultado também do importante êxito eleitoral obtido pelo PCP e pela CDU nas recentes eleições para a Assembleia da República.
Êxito eleitoral que vem no seguimento do assinalável sucesso que também foi o nosso XVII Congresso que, reafirmando os valores, causas e projecto do PCP no respeito pela identidade comunista, mobilizou e lançou todo o partido para a batalha eleitoral que acabamos de travar com o resultado positivo que acabamos de obter.
Um congresso que cimentou a nossa unidade, fortaleceu a nossa coesão e combatividade, deu um novo alento à nossa luta e intervenção e que nos afirmou e projectou como um Partido vivo e combativo, capaz de resistir e superar as mais duras e difíceis condições de intervenção.
Comemoramos hoje 84 anos de vida de um Partido que nunca virou a cara à luta no combate à política da direita e ao governo da direita e foi decisivo, como recentemente mais uma vez a vida o demonstrou, na dinamização da luta que criou as condições que levaram ao isolamento social e eleitoral da direita e do seu governo e à sua derrota definitiva.
Comemoramos, por isso, os 84 anos de vida do PCP com a grande satisfação de termos concretizado os dois grandes objectivos que tínhamos definido para a batalha eleitoral de 20 de Fevereiro:
- a derrota da direita, do PSD e do CDS e do seu governo com a sua mais baixa votação de sempre;
- o reforço eleitoral da CDU com mais votos e mais deputados.
Um sucesso eleitoral muito importante e para o qual o Porto e o seu distrito muito contribuíram com a eleição de mais um deputado do PCP/CDU e que se traduzirá, estamos certos, num substancial reforço da nossa intervenção na defesa do povo e do país e das populações do distrito do Porto.
Um inquestionável êxito que se reforça com a passagem da CDU a terceira força eleitoral nacional com mais 54 000 votos e que nem o facto, menos positivo, que foi a obtenção pelo PS de uma maioria absoluta pode pôr em causa.
(…)
Nestes últimos dias o país tomou conhecimento da composição do novo governo do PS que hoje mesmo toma posse.
Temos resistido a fazer juízos antecipados e definitivos acerca do novo governo, tanto mais que aguardamos pela apresentação do seu programa. Mas não podemos deixar de expressar um sinal de inquietação e preocupação perante as escolhas dos responsáveis para os lugares-chave do novo governo.
Trata-se ao contrário das expectativas criadas de um executivo que pela sua composição não dá antecipadas garantias de uma efectiva mudança nas políticas que vêm sendo concretizadas nos últimos anos e que o povo português claramente derrotou nas eleições de 20 de Fevereiro.
Se há indicação mais evidente que se possa retirar do resultado das últimas eleições, ela é a aspiração à mudança, à ruptura com as soluções do passado, mas não parece ser esse o resultado das opções na formação do novo governo.
A presença em lugares nucleares da governação de conhecidas figuras comprometidas com políticas e soluções económicas neoliberais que fazem das privatizações dos serviços públicos e das funções sociais do Estado a linha mestra das suas opções é, num quadro de maioria absoluta do PS, um traço inquietante da nova situação saída das eleições de 20 de Fevereiro.
Não deixa de ser significativo que as primeiras palavras conhecidas do novo Ministro das Finanças, após o seu anúncio, sejam para justificar e fazer coro com as opiniões dos representantes dos grandes interesses económicos e financeiros que ora exigem ora recomendam medidas de austeridade, não para conter a sua própria avidez de fabulosos lucros, mas para impor à generalidade dos portugueses e particularmente aos trabalhadores ainda mais sacrifícios.
Sob a falsa capa da neutralidade técnica e do rigor da ciência económica aí estão novamente a esgrimir até à exaustão a necessidade da redução do défice público à custa da saúde, da educação e das outras funções sociais do Estado, ou a defender, como o faz agora o novo Ministro das Finanças, a quase certa inevitabilidade do aumento dos impostos. Não na justa perspectiva de finalmente se fazer justiça fiscal em Portugal, obrigando o capital financeiro e imobiliário a pagar o justo imposto de acordo com os seus reais lucros, mas para duplamente penalizar o mundo do trabalho que para além de ter que suportar os cortes nas funções sociais do Estado, teriam que ver diminuídos os seus rendimentos pelo aumento dos impostos sobre o consumo.
Entretanto, verificamos um profundo silêncio dos novos responsáveis sobre a marcha das negociações em curso sobre a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento a aprovar ainda este mês e sobre a necessidade assegurar uma nova solução que permita o crescimento económico e a concretização efectiva do princípio da “coesão económica e social” e o aumento do emprego. Novas soluções que recentrem as políticas macro-económicas no desenvolvimento dos sectores produtivos e na dinamização do desenvolvimento económico e não façam do défice do Orçamento do Estado a questão central e decisiva a que tudo se sacrifica.
Que credibilidade pode ter o discurso dos sacrifícios para todos, vindo donde vem, quando mesmo em anunciado tempo de crise, vemos o capital financeiro e as grandes empresas cotadas na bolsa (no PSI20) com lucros escandalosos, enquanto o poder de compra dos trabalhadores quase estagnou. Só os cinco maiores bancos, atingiram em 2004 um lucro de 1,7 mil milhões euros, como noticiou recentemente o DN, com os lucros da banca privada a aumentarem 16,5%. Não há banco privado que não tenha aumentado os seus lucros na casa dos dois dígitos, como é o caso do Santander Totta com um lucro em 2004 de 19,8%. Só o Millennium BCP teve um lucro, em tempo de crise, de 513 milhões de euros. Mas os miríficos lucros não são apenas característica do sector bancário, as grandes empresas averbam como a GALP ou a PT, apesar da tão propalada crise, lucros respectivamente de 333 milhões de euros e de 500 milhões euros que se traduzem em aumentos substanciais de remunerações para os seus administradores e de valorização desmesurada dos lucros dos seus accionistas.
O que ninguém consegue explicar ou não querem, nem os assíduos comentadores da nossa praça na TV ou nos denominados “jornais de referência”, muitos dos quais administradores ou representantes dos grandes accionistas dos grandes grupos económicos e financeiros, é porque apesar de tão amplas margem de lucro, de tão positivo crescimento das grandes sociedades o crescimento económico do país continua fraquíssimo e o desemprego continua a aumentar.
Mas não tardaremos a ouvi-los dizer, com a candura e o ar sofrido do costume, que “temos que ter paciência, pois não é possível distribuir o que não há”
Não nos iludamos, a crise não é para todos e o que objectivamente pode estar em marcha e daqui alertamos os portugueses é a encenação de uma nova versão do discurso da tanga, mas agora sem tanga, mais “soft” na aparência, mas com o mesmo objectivo: – forçar a aceitação passiva e inevitável das mesmas políticas e das mesmas receitas aplicadas por Durão e por Santana.
O que objectivamente poderemos ter pela frente não é um governo com uma decidida vontade política de encetar um novo rumo para país, mas uma bem orquestrada campanha que ampliando e empolando a crise leve à aceitação resignada dos sacrifícios em nome de uma crise que já vimos que não é para todos.
Da nossa parte vamos continuar a aguardar pelo programa do novo governo mas, desde já, reafirmamos o que na campanha eleitoral sempre dissemos: podem contar com o voto do PCP para aprovar medidas justas que vão ao encontro dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país, mas devem contar com a nossa firma oposição e combate às políticas que sirvam apenas os interesses dos senhores do dinheiro e dos grandes grupos económicos e financeiros.
Também esta semana tomou posse a nova Assembleia da República saída das eleições de 20 de Fevereiro.
Tal como o havíamos anunciado e honrando os compromissos assumidos perante o país e os trabalhadores, vamos apresentar no imediato um conjunto de iniciativas legislativas, à cabeça das quais estará uma destinada à revogação do Código do Trabalho, de forma a pôr fim à proibição do direito à livre organização e contratação colectiva e reponha o irrenunciável direito de fazer greve, o direito à estabilidade e à segurança no emprego, a horários de trabalho dignificados e a uma retribuição justa pelo trabalho realizado.
Uma particular atenção e solução imediata em matéria de Código do Trabalho deve merecer a necessidade rectificação das malfeitorias já sentidas no direito constitucional à negociação e contratação colectiva e contra qualquer manobra dilatória venha de onde vierem que impeça a sua urgente revogação.
Estaremos atentos e combateremos qualquer condescendência do novo governo e da nova maioria com as pretensões dos mentores do Código e alguns patrões dos patrões jogam no arrastamento da negociação da contratação colectiva com vistas à caducidade dos contratos, prejudicando dezenas de milhar de trabalhadores nos seus salários e direitos.
Daremos por isso a imediata e urgente prioridade a esta matéria.
Apresentaremos imediatamente um projecto de Lei dando prioridade à salvaguarda e validade dos contratos colectivos e dos direitos que eles comportam. E estamos certos que os trabalhadores e as suas organizações não ficarão à espera de boas intenções, que não ficarão parados à espera da bondade do legislador assumindo na sua acção e na sua luta a defesa dos seus direitos, do direito ao seu contrato colectivo! Tal direito nunca foi dado mais sim conquistado e assegurado pela acção e pela luta dos trabalhadores.
Dando cumprimento aos nossos compromissos estamos a trabalhar também na apresentação de novos projectos de lei visando garantir um aumento intercalar das reformas e do salário mínimo nacional e a despenalização do aborto.
Fiéis à preocupação central de garantir uma política que promova o crescimento, o emprego e a defesa dos sectores produtivos nacionais apresentaremos também no imediato dois projectos de resolução na Assembleia da República dando resposta à grave situação que se vive no sector têxtil e do vestuário e à defesa duma política macro-económica que permita, com a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o desenvolvimento económico e social do país e a convergência real com a União Europeia.
(…)
A par desta decisiva batalha da organização uma outra importante se avizinha – as eleições para as autarquias locais.
Uma batalha que os resultados recentes das eleições legislativas permitem encarar com confiança, numa perspectiva de avançar e crescer, confirmando a CDU como uma grande força autárquica nacional.
Uma batalha, não negamos, exigente e no desenvolvimento da qual é preciso dar agora passos mais firmes e decisivos.
Uma batalha que exige indispensável envolvimento e mobilização do conjunto dos militantes e organizações, que reclama pela vasta tarefa de constituição de centenas de candidaturas em todo o país.
Vamos para estas eleições afirmando a CDU como um amplo espaço de participação e de envolvimento unitário, no qual convergem cooperam e participam milhares de homens e mulheres independentes unidos num projecto distintivo, com obra realizada, provas dadas e com futuro.
Um projecto sem pretensões nem concepções de hegemonia, com uma visão unitária e democrática na gestão das autarquias, de inteira disponibilidade para a resolução dos problemas locais, o bem-estar das populações e o progresso local e regional. Um projecto que não vê nas autarquias um espaço para exercício de poderes absolutos mas sim de pluralidade e de intervenção democrática.
Uma força que promete e cumpre, que presta contas, reconhecida pelo seu trabalho e honestidade, que faz da participação popular e da proximidade às populações o eixo fundamental do seu estilo de exercício de poder. Uma força que testou na experiência da vida o facto de ter de integrar a defesa dos interesses e direitos dos trabalhadores das autarquias como elemento incontornável da sua prática autárquica.
Vamos para estas eleições com a confiança de quem provou ser capaz de se assumir quando em minoria, como aqui nos municípios do distrito do Porto, numa voz indispensável na defesa dos interesses das populações, que deu corpo a causas e aspirações locais e assegurou uma presença exigente e construtiva para garantir uma gestão transparente e eficaz.
Para os que aí agitam falsa e hipocritamente a acusação de que o PCP estaria favorecendo a direita pelo simples facto de hoje, como sempre, estarmos disponíveis a assumir responsabilidades com inteira independência em autarquias de minoria é preciso dizer-lhes com toda a clareza:não foi o PCP que em momento algum estabeleceu acordos eleitorais com o PSD para retirar Câmaras á CDU como fez o PS em 40 municípios do país em 1985; não foi o PCP mas sim o PS que patrocinou com o CDS em 2001 uma candidatura de “Cidadãos Eleitores” para tentar retirar a maioria à CDU no concelho de Montemor; não foi o PCP, mas sim o PS que formalizou em 8 concelhos da Madeira coligações com o CDS nas últimas autárquicas.
E, para alguns outros, agora chegados á vida autárquica e que com o PS fazem coro, bastará lembrar-lhes que foram eles (refiro-me a BE) que abriram caminho à vitória de Santana Lopes e do PSD em Lisboa ao afastarem-se da Coligação “Mais Lisboa” e ao fazerem dela o seu adversário principal.
Tal como no passado também no presente são claros os propósitos enunciados pelo PS de visar reduzir a influência do PCP e da CDU nas autarquias. E, também, tal como no passado, fazerem-no embrulhado em cativantes apelos a possíveis acordos como PCP sem qualquer intenção séria, destinados a gerar expectativas ou a formular pretensões de ambição hegemónica no quadro das quais aos outros estaria destinado o papel de suporte e apoio à sua concretização.
Em matéria desta responsabilidade é preciso falar claro. Soluções sérias em matéria de acordos ou convergências entre forças políticas exigem não apenas e desde logo a clarificação dos conteúdos programáticos mas a sua indispensável assunção por parte das direcções nacionais (como se sabe sem o acordo das quais não há viabilização possível das mesmas). Tudo o resto são atitudes, independentemente da respeitável sinceridade de quem localmente as assume, destinadas a empatar e a iludir.
Bem esclarecedor seria ver quebrado o silêncio por parte da direcção do PS sobre esta matéria.
Pelo que ali como em todo o país a tarefa mais importante e decisiva é a de afirmar a CDU como força alternativa e de projecto de futuro capaz de responder aos novos problemas e encontrar novas soluções na resolução dos problemas das populações.
Temos um passado e presente no poder local que não deixa dúvidas quanto á prioridade que damos às pessoas, á resolução dos seus problemas ao desenvolvimento local.
Temos um passado e presente que não deixa dúvidas quanto ao rumo das políticas locais, á defesa do interesse público, ás opções de esquerda na gestão das autarquias.
(…)