Sobre «Os direitos das mulheres e a chamada
constituição europeia»
Declaração de Ilda Figueiredo,
Deputada no Parlamento Europeu
Lisboa, 06 de Maio de 2005
Nos encontros hoje realizados com organizações de mulheres e instituições (CIDM, CITE e Comissão de Mulheres da CGTP-IN) houve troca de opiniões sobre o trabalho no Parlamento Europeu, designadamente como membro da Comissão dos Direitos das Mulheres, e recolha de opiniões e sugestões para trabalho futuro, preocupações com a evolução dos direitos das mulheres, tendo por base as propostas de directiva sobre organização do tempo de trabalho e criação do mercado interno de serviços (Directiva Bolkenstein), culminando com o texto da dita constituição europeia, que, por exemplo, desvaloriza e empobrece direitos reconhecidos na Constituição da República Portuguesa.
Das informações dadas, destacamos:
1º - A aprovação de dois pareceres de Ilda Figueiredo na
Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros, sobre:
. “Os desafios políticos e os recursos orçamentais da União
Alargada 2007/2013”, onde se recorda que a igualdade entre mulheres e
homens deve ser transversal a todas as políticas comunitárias
e se chama especial atenção para as principais áreas de
despesa, como os fundos estruturais, além de se insistir na necessidade
de um financiamento novo para o futuro Instituto Europeu do Género, deplorando
o facto de não haver qualquer aumento real, no denominado Pacote Prodi,
para as questões sociais, a igualdade e o emprego, apesar de haver 20
milhões de desempregados e quase 70 milhões de pessoas em situação
de pobreza, na sua maioria mulheres.
. “O Programa Comunitário para o Emprego e a Solidariedade Social
- PROGRESS 2007-2013”, incluído nas próximas perspectivas
financeiras.
Este programa PROGRESS inclui, entre outros, o programa sobre a igualdade entre
homens e mulheres e a luta contra a discriminação e exclusão
social. Das propostas aprovadas neste parecer, destacam-se:
- Aumento do co-financiamento comunitário para uma base de 90%, tendo
em conta as dificuldades das ONG e outras organizações sociais
que trabalham nestas áreas, e não 80% como propõe a Comissão
Europeia;
- Aumento do enquadramento financeiro de 628,8 milhões de euros para
943,2 milhões de euros;
- Alteração da repartição financeira entre as diferentes
vertentes, devendo caber à vertente da igualdade entre homens e mulheres
12% e não os 8% originalmente propostos pela Comissão executiva.
No entanto, queremos destacar que se mantêm perigos de, a partir de 2007,
se reduzirem os instrumentos e programas relacionados com a igualdade. De acordo
com o PROGRESS terminarão, nessa data, os programas específicos
e respectivos financiamentos na área da igualdade de oportunidades, passando
esta matéria a constituir uma das cinco vertentes do referido programa
PROGRESS.
Entretanto, no que se refere ao Instituto Europeu da Igualdade entre Mulheres
e Homens, cuja criação defendemos, assume, neste contexto, um
âmbito muito restrito, centrado nos estudos e na investigação,
sem ligação a um programa de acção, com meios financeiros
adequados, como ainda existe actualmente.
2º - Preocupações com a evolução dos direitos
das mulheres. O exemplo da dita constituição europeia
Pode-se dizer que as mulheres são também esquecidas neste projecto
de tratado constitucional europeu. Não só não há
direitos novos, como a maior parte dos direitos reconhecidos às mulheres,
em muitos países da União Europeia, não estão neste
projecto da dita constituição europeia. Quando comparamos com
a Constituição da República Portuguesa esta questão
é, ainda, mais gritante.
Por exemplo, numa área tão importante para as mulheres como é
o direito ao trabalho (artigo 58º da Constituição da RP),
na dita constituição europeia apenas se reconhece o direito a
trabalhar (art.II- 75-1). Também não há qualquer referência
a um rendimento mínimo, a pensões de reforma ou a subsídio
de desemprego.
Igualmente, enquanto a CRP garante o direito ao divórcio, na dita constituição
europeia apenas se fala do direito a casar e fundar uma família (art.
II-69). Não há também qualquer referência às
directivas em vigor na área da igualdade entre homens e mulheres.
O que a dita constituição europeia consagra é a competência
exclusiva para o estabelecimento das regras de concorrência necessárias
ao funcionamento do mercado interno, sem sequer garantir o acesso de todos a
serviços públicos de qualidade, questão essencial para
a inclusão social e o combate à pobreza, que atinge maioritariamente
as mulheres. Ou seja, o que é essencial para o projecto da constituição
europeia é a consagração do neoliberalismo, não
a igualdade de direitos e oportunidades das mulheres.
3º - Nos encontros que mantivemos registou-se um largo consenso na necessidade
de intervir contra esta tentativa de desvalorização das várias
vertentes da igualdade. Pela nossa parte, continuaremos a intervir na defesa
da concretização efectiva da igualdade de direitos e oportunidades,
devendo o governo português manter uma posição firme nas
negociações na União Europeia.