A propósito do Dia Internacional da Mulher
Declaração de Fernanda Mateus, da Comissão Política do PCP
8 de Março de 2006

 

A Comissão Política do PCP, face ao agravamento do desemprego feminino, à degradação do estatuto profissional e salarial das mulheres, à desresponsabilização do Estado na protecção da função social da maternidade-paternidade e à manutenção do aborto clandestino - que exemplificam traços negativos da evolução da situação das mulheres -, considera indispensável o alargamento da sua luta organizada em defesa dos seus direitos.

Hoje, e nos próximos dias, decorre um vasto conjunto de iniciativas unitárias bem como do PCP, que valorizam as razões históricas do 8 de Março como Dia Internacional da Mulher e afirmam o papel das mulheres na luta pela sua justa aspiração à participação em igualdade. Porque os traços negativos na evolução da situação das mulheres em Portugal não são uma «fatalidade» histórica ou cultural a que as gerações presentes e futuras tenham que se resignar, ou esperar passivamente que os seus direitos venham a ser, algum dia, integralmente cumpridos.

Pelo contrário, o agravamento das discriminações e das desigualdades no trabalho, na família, na vida social e política, ilustram o insucesso das promessas dos sucessivos governos, incluindo o actual Governo do PS, de promoção dos direitos das mulheres e mostram como a natureza das suas políticas são contrárias ao sentido inovador presente nas leis que consagram o direito à igualdade em todas as esferas da vida.

É disso exemplo o desemprego feminino, um grave flagelo social que afecta mulheres de todas as idades e qualificações, representando uma grave violação do seu direito à autonomia económica. Só em quatro anos, o número de mulheres desempregadas passou de 122 mil para 238 mil, representando 53,3% do desemprego registado. A taxa de desemprego das mulheres atingiu 9,2% no 4º trimestre de 2005.

Também a precariedade está a atingir especialmente as mulheres. Entre 2001 e 2005 o número de mulheres com emprego precário aumentou de 388 mil para 717 mil (mais 84,8%).

A Comissão Política do PCP assinala, igualmente, que se impõe combater o agravamento das discriminações salariais, que constituem um importante instrumento de acentuação de uma injusta repartição do rendimento nacional em detrimento de quem trabalha e de perpetuação das desigualdades entre mulheres e homens. As mulheres têm um ganho médio mensal sistematicamente inferior ao dos homens. Pode dizer-se que hoje uma mulher, para trabalho igual ao homem, recebe em média uma remuneração inferior em ¼.


Estas discriminações repercutem-se, igualmente, nos mais baixos níveis de protecção social: na doença, no desemprego, na velhice. Em 2004, o subsídio médio de doença correspondia apenas a 60,1% do recebido pelos homens; o subsídio de desemprego médio das mulheres correspondia apenas a 73,5% do dos homens; a pensão média de invalidez correspondia a 75% da dos homens; enquanto a pensão média de velhice correspondia apenas a 60,9%. Esta desigualdade não se alterou em 2005 e 2006. Refere-se ainda que a pensão média de velhice recebida pelas mulheres, em 2006, deve rondar os 248 euros, um valor inferior ao limiar da pobreza.

O tratamento discriminatório está ainda bem patente no facto da percentagem de mulheres abrangidas pelo salário mínimo nacional continuar a ser superior à dos homens, conforme os dados relativos a 2005: 6,6% de mulheres para 3,5% de homens.

O boicote patronal à contratação colectiva, em resultado das normas gravosas do Código Laboral que o Governo do PS manteve, tem consequências profundas no aumento das desigualdades no trabalho entre mulheres e homens. A tentativa de destruição das relações laborais reguladas e regulamentadas por via da negociação (convenções colectivas), optando-se por relações individuais de trabalho (onde impera a vontade unilateral do patrão) agrava as desigualdades remuneratórias e dificulta a assunção dos direitos estabelecidos na lei e na contratação colectiva por parte das trabalhadoras.

A luta em defesa da contratação colectiva continua a estar na ordem do dia para que possa desempenhar um valoroso instrumento de defesa da igualdade de direitos das mulheres e uma garantia de que à sua crescente presença no mundo do trabalho corresponda uma efectiva garantia de igualdade de direitos.

A Comissão Política do PCP destaca ainda a sua preocupação pelo facto de se assistir a uma crescente desresponsabilização do Estado na garantia de cumprimento dos direitos inerentes à maternidade-paternidade.

Por um lado, registam-se os efeitos negativos da imposição de relações laborais marcadas pelo elevados níveis de exploração e de precariedade laboral que levam ao incumprimento dos direitos das(os) trabalhadoras(es) no que se refere à maternidade-paternidade. Alargam-se as situações em que as entidades patronais se demitem dos seus deveres para com os direitos dos trabalhadores relativos a esta importante função social. Por outro lado, verificam-se retrocessos nos direitos em resultado da manutenção das normas do Código de Trabalho, no que se refere à redução para 80% do subsídio de maternidade-paternidade quando o(a) trabalhador(a) opte por uma licença de maternidade de 150 dias.

Acresce a falta de uma adequada rede pública de creches e jardins de infância de qualidade e a preços acessíveis, num quadro de agravamento da situação face à perspectiva de encerramento de centenas de jardins de infância, a par da transferência dos poucos equipamentos existentes da rede pública para a gestão privada. Trata-se de novos passos na desresponsabilização do Estado nesta área, aniquilando a perspectiva de promoção de igualdade de acesso de todas as crianças a uma adequada rede pública de equipamentos sociais de qualidade e a preços acessíveis. Assiste-se, cada vez mais, ao pagamento de mensalidades que pesam no orçamento das famílias: alargam-se as situações de exclusão de acesso a estes equipamentos por parte das camadas trabalhadoras.

Face a tudo isso, a Comissão Política do o PCP reafirma a sua determinação e empenho na luta em defesa dos direitos das mulheres e por uma ruptura democrática e de esquerda que faça cumprir o direito à igualdade como parte indissociável do aprofundamento da democracia, nas suas vertentes económica, social, política e cultural.

A Comissão Política do PCP, no respeito pelos seus compromissos eleitorais, dará prioridade à apresentação na Assembleia da República, durante a tarde de hoje, de iniciativas que visam o reforço dos direitos de maternidade-paternidade, através da criação de um subsídio social a ser atribuído durante 120 dias, destinado a trabalhadoras(es) que não exercem uma actividade laboral e no valor da pensão social; e a criação de um novo regime de prestações familiares que consagre a universalidade do direito ao abono de família; a criação de um subsídio de nascimento; e o alargamento da idade do abono de família aos jovens até aos 18 anos.

Igualmente será entregue, hoje, na Assembleia da República, um Projecto de Resolução que visa o reforço da participação cívica e política das mulheres e no qual se recomenda ao Governo a adopção de um conjunto de medidas - no plano económico e social - de combate às atitudes e práticas discriminatórias, que permitam às mulheres portuguesas participar em igualdade no exercício do poder; a publicação regular de relatórios com informação sobre a evolução da participação das mulheres nos órgãos de poder e na Administração Pública, bem como a avaliação dos impactos das políticas económicas e sociais na evolução da situação das mulheres. Propõe-se, igualmente, o compromisso do Governo na publicitação, a meio do actual mandato autárquico, do levantamento e caracterização dos eleitos e eleitas nos diversos órgãos de poder local.

A Comissão Política do PCP mantém o seu empenho e determinação na luta pela despenalização do aborto sem recurso a referendo e exorta as mulheres, e todos os que no campo democrático exigem uma alteração desta realidade, para que animem um forte movimento de opinião que expresse este justo e necessário objectivo.