Altera o Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de Dezembro de 1961, designadamente procedendo à introdução da regra de competência territorial do tribunal da comarca do réu para as acções relativas ao cumprimento de obrigações e à modificação da competência territorial dos solicitadores de execução no âmbito do processo executivo, bem como o Estatuto da Câmara dos Solicitadores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 88/2003, de 10 de Setembro, o regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, e o Decreto-Lei n.º 202/2003, de 10 de Setembro.
Intervenção de João Oliveira
2 de Fevereiro de 2006
Senhor Presidente,
Senhor Ministro,
Senhores Deputados
A Proposta de Lei que hoje discutimos assenta na "constatação de que grande parte da litigância cível se concentra nos principais centros urbanos de Lisboa e do Porto" e que tem a sua origem no "recurso aos tribunais de forma massiva" por empresas que pretendem recuperar os "seus créditos provenientes de situações de incumprimento contratual".
A perspectiva que o Governo adopta é por isso a da reacção à situação de congestionamento dos tribunais e não a da sua prevenção. Enquanto os portugueses se virem confrontados com a precariedade dos vínculos laborais e o desemprego, com a perda do poder de compra e a crise económica, as situações de incumprimento contratual continuarão a aumentar e com elas aumentará também o recurso aos tribunais.
Entendemos, portanto, que a discussão de medidas que contribuam para a diminuição do recurso aos tribunais deveria ser uma discussão prévia à da adopção de medidas para o seu descongestionamento.
Não é esse o entendimento do Governo e por isso discutimos hoje esta Proposta de Lei que prevê a adopção de medidas de descongestionamento dos tribunais e de desbloqueamento da Reforma da Acção Executiva.
Quanto à primeira questão, propõe o Governo a introdução da regra da competência territorial do tribunal da comarca do demandado, quer para as acções declarativas, quer para as acções executivas. Entende o Governo que esta opção permite "um maior equilíbrio da distribuição territorial da litigância cível".
Tal medida traduz-se na dispersão das acções que agora se concentram em Lisboa e no Porto pelos tribunais do resto do País, o que por si só não é certamente sinónimo de maior eficácia do sistema judicial.
Com efeito, é praticamente unânime entre os operadores judiciários a necessidade de resposta à insuficiência das infra-estruturas, dos meios técnicos e dos recursos humanos afectos ao sistema judicial. Se não for acompanhada desta resposta, a diminuição do volume de processos nos tribunais de Lisboa e do Porto traduzir-se-á no aumento da pendência nos tribunais do resto do País.
Entende ainda o Governo que esta medida significa o reforço do "valor constitucional da defesa do consumidor - porquanto se aproxima a justiça do cidadão". Tal aproximação deve-se ao facto de a acção correr termos no tribunal do domicílio do demandado, sempre que este seja pessoa singular, e com isso se reduzir a onerosidade da sua intervenção no processo.
Registamos este argumento, realçando a necessidade de eliminação global dos obstáculos de ordem económica que hoje dificultam o acesso dos cidadãos à justiça, sobretudo por parte dos mais carenciados. Pensamos que é fundamental a adopção de medidas globais que garantam o acesso ao direito e aos tribunais pelos cidadãos, independentemente da sua condição económica, incluindo a revisão do regime do apoio judiciário.
No que respeita à situação da Acção Executiva, a realidade é a da existência de uma Reforma que, apesar de decorridos pouco mais de dois anos da sua implementação, parece condenada ao fracasso e à ineficiência. A inexistência de uma verdadeira rede de juízos de execução no território nacional, a carência de solicitadores de execução e a falta de meios ao seu dispor ou a insuficiência das infraestruturas dos tribunais face às suas necessidades são apenas alguns aspectos que demonstram a falta dos pressupostas materiais em que a Reforma assentava e que estão na origem do bloqueio em que esta se encontra.
Entre outras medidas, a Proposta de Lei em discussão prevê a possibilidade de o exequente designar um solicitador de execução inscrito em qualquer comarca do País, procurando responder à carência de solicitadores de execução verificada em algumas comarcas e à sua sobrecarga noutras.
Em nosso entender, é hoje manifestamente óbvio que a solução que garantia a resposta adequada ao bom funcionamento do sistema teria sido o recrutamento de agentes de execução, a integrar nos quadros dos tribunais de acordo com as necessidades concretamente identificadas. Aliás, a necessidade de encontrar mecanismos de compensação da livre opção por esta actividade profissional acaba por ser reconhecida pelo Gabinete de Política Legislativa e Planeamento no relatório de avaliação preliminar da Acção Executiva de Junho de 2005, quando afirma que "a solução para esta insuficiência pode passar por um esforço da Câmara dos Solicitadores no sentido de assegurar a colocação de profissionais em certas comarcas".
No entender do PCP, a realidade com que nos confrontamos hoje exige, não a adopção de medidas pontuais de desbloqueamento da Reforma, mas sim o repensar de todo o sistema e a alteração dos seus pressupostos, nomeadamente corrigindo a linha seguida de desresponsabilização do Estado.
Entendemos que as medidas previstas na presente Proposta de Lei poderão ser inócuas e que não garantirão maior eficácia ao sistema judicial se continuarmos a adiar a discussão dos mecanismos de redução do recurso aos tribunais e de uma verdadeira Reforma da Acção Executiva.
Disse.