Regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de transportes colectivos de passageiros;
Regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem;
Conversão em contraordenações de contravenções e transgressões em vigor no ordenamento jurídico nacional
Intervenção de Odete Santos
4 de Janeiro de 2006
Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Gostaria de focar mais uma vez o que o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes aqui afirmou e que penso ser muito importante. A tónica do Sr. Ministro foi: «Passa-se isto tudo a contra-ordenações para aliviar os tribunais!». Esta não pode de maneira alguma ser a óptica de um processo de descriminalização. Não pode! Não é! Porque, então, onde é que vamos parar?!…
É extraordinariamente perigoso, de facto, ter essa óptica. As amnistias foram feitas durante anos sucessivos para «aliviar» os tribunais. Perigoso! São diminuídos direitos dos cidadãos para «aliviar» os tribunais.
Um exemplo: a Lei do Arrendamento Urbano. Criam-se títulos executivos para que, de facto, nos despejos não se passe pela acção declarativa, porque a acção declarativa é demorada, é morosa, e então avança-se logo para a acção executiva, para apressar o despacho. Isto é cortar direitos dos cidadãos, com o argumento de que a justiça é morosa. E o que é que faz o Estado para que a justiça seja célere? Limita-se a encarar isto da seguinte forma: «Vamos tomar uma medida aqui, uma medida ali, para aliviar». Privatizou-se a justiça na área da acção executiva, onerando os cidadãos, que agora têm de pagar aos solicitadores de execução aquilo que é o que Estado que deve garantir: as citações e as notificações. Têm de pagar honorários!
E isto foi para tornar a justiça mais célere! Contra os cidadãos!
Não vim aqui, de modo algum, fazer uma intervenção para falar no apoio judiciário, etc., etc., porque quero cingir-me ao tema, mas esta óptica descaracteriza a justiça como um serviço público.
De facto, até somos a favor desta descriminalização, mas entendemos que a mesma deve ser encarada na óptica de que, aliás, o Professor Figueiredo Dias fala, quando refere que só cabem no âmbito do Direito Penal «lesões insuportáveis das condições comunitárias essenciais do livre desenvolvimento e realização da personalidade de cada homem». Tudo o resto não cabe no Direito Penal, que é um direito de intervenção mínima. Por isso, estamos de acordo em que, de facto, se retire esta matéria do âmbito do Direito Penal, que é o que deve fazer um Estado social e democrático nesta matéria.
Em todos os outros casos onde não há estas «lesões insuportáveis» a manutenção da criminalização de comportamentos que constituem meras violações a regras de convivência ou de organização da sociedade ou até comportamentos que afrontam concepções morais apenas de uma parte da sociedade — e, como é óbvio, estou a referir-me ao aborto — constitui uma forma de estigmatização própria de um Direito Penal de um Estado autoritário. O Código Penal de 1982 acolheu um paradigma bastante amplo de descriminalização, mas como diz o Professor Figueiredo Dias «não se foi tão longe quanto era possível, foi-se apenas até onde, politicamente, era possível». Está escrito nas suas Lições de Direito Penal . Mas ele defende uma maior descriminalização, com o que estamos de acordo.
As propostas de lei hoje apresentadas pelo Governo correspondem, de facto, à limitação mais extensa possível neste momento da intervenção do sistema formal de controlo.
Colateralmente vem a questão de os tribunais não terem de ser chamados nestas matérias, a não ser em sede de recurso. E colateralmente, só colateralmente!, é que se põe o problema de aliviar os tribunais.
E, de facto, assisti muitas vezes a juízes, quando chegam ao tribunal às 9 horas da manhã, passarem uma hora a ditar sentenças de condenação por alguém não ter pago o bilhete no comboio, por não ter pago a portagem, por isto ou por aquilo... Por aqui mesmo se vê que isto não tem dignidade de Direito Penal!
Consideramos, portanto, que as propostas de lei se justificam, e já se justificam há muito tempo. Isto é quase como «o ovo de Colombo», caramba!! Tantos governos, tanto do PS como do PSD, tiveram na pasta da justiça pessoas experimentadíssimas nos tribunais e nunca descobriram que esta era uma matéria que caía fora do âmbito do Direito Penal...!!
De qualquer forma, penso que o meu camarada José Soeiro colocou aqui uma questão muito importante.
E devo dizer que qualquer dia, quando acontecer o que me aconteceu há dois dias na ponte 25 de Abril, não pago portagem, porque é inadmissível que as empresas, para ganharem mais, não coloquem em funcionamento o número de portagens suficiente para dar escoamento ao trânsito. Nesse momento, na ponte e no acesso às Amoreiras circulava-se muito bem e era apenas antes das portagens que havia engarrafamento.
Nesse momento, era necessário haver, pelo menos, mais uma portagem em funcionamento, porque quando ela foi aberta o trânsito escoou-se.
Isto não pode ser assim e também não deveriam ser admitidas formas sucedâneas do portageiro, as quais ainda servem para as empresas embolsarem mais dinheiro, como o cartão de acesso e o identificador de «Via verde», que, devo dizer, não adquiro, nem nunca adquirirei!!
Pergunto, nestes casos, que coima é que se aplica a estas entidades que, desta maneira, desprezam os direitos dos utentes. Que coimas? Isto não está aqui referido nestes diplomas, mas também tem de ser resolvido. Ou será que estão à espera de um buzinão?!...