A extraordinária dimensão atingida pela chamada “crise dos cartoons”, para lá das suas mais imediatas motivações e visíveis protagonistas, é inseparável da ofensiva mais geral do grande capital e do imperialismo, ofensiva que nos últimos tempos tem tido novas e graves expressões para as quais o PCP considera necessário chamar a atenção dos trabalhadores e do povo português.
Trata-se desde logo, no plano económico e social, das políticas de liberalização, desregulação laboral, privatização e desmantelamento das funções sociais do Estado de que a “Directiva Bolkenstein” sobre a liberalização dos serviços é o mais recente exemplo. Trata-se da multiplicação de medidas de cariz securitário, envolvendo crescentes ataques a direitos, liberdades e garantias democráticas fundamentais ao mesmo tempo que se desenvolvem impunemente actividades e concepções racistas, xenófobas e de extrema-direita. Trata-se sobretudo de inquietantes desenvolvimentos da política militarista e intervencionista do imperialismo.
O PCP chama especialmente a atenção para os seguintes factos recentes:
- Os EUA, apesar dos colossais déficits que ameaçam explodir numa crise financeira de enormes proporções, acabam de anunciar um orçamento militar record e a sua intenção de prosseguir e intensificar guerras de agressão e a ocupação de países soberanos que se não verguem aos seus ditames;
- A NATO alarga a área da sua intervenção a todo o mundo, para socorrer os EUA a braços com crescente resistência, reforça o seu contingente militar de ocupação do Afeganistão, projecta uma intervenção militar no Sudão, prepara grandes manobras militares em África e a criação de uma aliança militar estratégica no Atlântico Sul;
- As ameaças provocadoras dos EUA contra Cuba e contra a Venezuela sobem de tom, com Condoleeza Rice a apelar descaradamente à criação de uma “frente unida” contra a Venezuela ao mesmo tempo que a UE insiste em inaceitáveis campanhas contra Cuba;
- Israel, com o apoio dos EUA e outras grandes potências, depois de ter estimulado o crescimento do Hamas contra a OLP, invoca agora a sua vitória eleitoral para novas medidas destinadas a vergar pelo sofrimento o povo palestiniano, a isolá-lo politicamente e a eternizar a ocupação ilegal da Palestina;
- Acelera-se a militarização da UE com a implementação ilegal de disposições contidas na chamada “constituição europeia” derrotada pelo “Não” francês e holandês. Com a vitória de Ângela Merkel e a formação da “grande coligação” na Alemanha as grandes potências da União Europeia estão a claudicar diante das exigências do imperialismo norte-americano no Médio Oriente e Ásia Central. O seu alinhamento com os EUA na ocupação do Iraque e do Afeganistão e agora a sua participação activa na escalada intervencionista em relação ao Irão e à Síria representa uma situação nova de grande gravidade.
É neste contexto que é necessário situar a chamada “crise dos cartoons”. Na sua origem imediata não é a liberdade de imprensa e expressão que estão em causa, mas acções provocatórias de carácter racista e xenófobo que insultando e identificando o Islão com o terrorismo procuram atiçar a tensão, alimentar e explorar acções radicais – como os actos contra diversas embaixadas ou as inaceitáveis declarações de responsáveis iranianos sobre o Holocausto – que possam servir de pretexto para o prosseguimento da estratégia de agressão e guerra imperialista contra países soberanos e a criminalização das forças e povos que lhe resistem.
É aliás necessário chamar uma vez mais a atenção para as tentativas de relançar o anticomunismo, perseguir e ilegalizar partidos comunistas, criminalizar a sua ideologia. Tal é o caso da “resolução anticomunista” do Conselho da Europa. Apesar dos propósitos mais reaccionários e revanchistas dos seus promotores terem sido derrotados, é necessário prosseguir a denúncia dos seus objectivos anti-democráticos e expressar activa solidariedade para com aqueles partidos que, como nas Repúblicas Bálticas e na República Checa são já vítimas de perseguição anticomunista. Isso é tanto mais necessário quando simultaneamente se assiste a brutais tentativas de reescrita da história do movimento comunista e operário, ao branqueamento e mesmo promoção do fascismo e do nazismo, à banalização de práticas criminosas como o sequestro, a tortura e a criação de prisões secretas. As novas revelações sobre os crimes praticados pelas forças de ocupação britânicas e norte-americanas no Iraque e a afrontosa recusa dos EUA de se conformar com relatórios da própria ONU e pôr termo ao campo de concentração de Guantanamo, são particularmente inquietantes.
O PCP alerta para os sérios perigos que esta situação comporta. Apela aos trabalhadores ao povo português, e em particular à juventude, para que intensifiquem a sua luta contra o militarismo e a guerra e exijam que o governo português ponha fim à sua vergonhosa política seguidista em relação ao imperialismo, se demarque claramente dos projectos de agressão no Médio Oriente, faça regressar a Portugal os contingentes militares que se encontram no Afeganistão, na Bósnia, no Kossovo…
O PCP considera particularmente importante o prosseguimento da luta pela retirada das forças de ocupação do Iraque, e expressa o seu apoio à concentração unitária convocada para 18 de Março, em Lisboa, por ocasião do 3º aniversário do desencadeamento da guerra.