Interpelação à Mesa para exprimir o mais vivo protesto e condenação pelas decisões tomadas tendo em vista o início das operações militares da NATO de ataque contra a Jugoslávia
Intervenção do deputado João Amaral
24 de Março de 1999

 

Sr. Presidente, tomo a palavra para exprimir, em nome do PCP, o mais vivo protesto e condenação pelas decisões tomadas tendo em vista o início das operações militares da NATO de ataque contra a Jugoslávia, à margem de todas as regras do Direito internacional, incluindo a Carta das Nações Unidas.

Nessas decisões, pesou determinantemente o interesse dos Estados Unidos e a política dos seus dirigentes e agentes políticos, que dominam o sistema de decisão política da NATO, que controlam a máquina de guerra da NATO no terreno, e que falam como donos do aparelho diplomático de contacto através do Sr. Richard Holbrooke. A milhares e milhares de quilómetros de distância, os Estados Unidos ditam à Europa a condução das crises político-militares como nunca o fizeram, nem nos piores anos da «guerra fria».

Os ataques militares anunciados são feitos contra um país soberano e sobre o seu território. Nem sequer com o caso da Bósnia há comparação possível, porque não há acordo algum nem há mandato das Nações Unidas. A intervenção militar é absolutamente à revelia do Direito internacional. A partir de agora, como é, Sr. Presidente? A NATO vai intervir no Afeganistão e na Arábia Saudita para defender os direitos humanos? Os Estados Unidos estão legitimados para atacar os dirigentes políticos de que não gostam? O que é que vale, a partir de agora, a soberania? Esta operação rasga de forma brutal um património conquistado historicamente, de regras do Direito internacional.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É o regresso à política da canhoeira.

O que se espera? A Jugoslávia não é um deserto e o seu exército está fortemente motivado em nome de valores pátrios. A NATO, em nome da guerra, leva a guerra à Europa. A realidade é que toda a gente sabe que esta operação de guerra não dá a mínima contribuição para a solução dos problemas; pelo contrário, os problemas vão agravar-se sobre os escombros e os cadáveres que os bombardeamentos inevitavelmente causarão. As bombas servem para ser imposto o modelo de uma NATO máquina de guerra, agindo sem mandato da ONU, na base dos interesses dos Estados Unidos e dos seus seguidores. As bombas servem para enterrar a ONU e a OSCE, como organizações excrescentes e manipuláveis face à política dos Estados Unidos e da NATO.

Sr. Presidente, para quem se reveja na argumentação dita «humanitária» para justificar esta guerra à Jugoslávia, é bom lembrar o incentivo dado pelos Estados Unidos, e não só, aos grupos separatistas e é bom lembrar a conivência com as acções terroristas, como é bom lembrar que havia uma acordo de Outubro que garantia a presença da OSCE no terreno…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … e que, em Rambouillet, os jugoslavos subscreveram um acordo que, depois, foi retirado pelo Grupo de Contacto, por pressões dos kosovars.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Só através de uma solução política que salvaguarde os legítimos direitos das populações do Kosovo, nomeadamente a albanesa, e que respeite a soberania jugoslava, será possível encontrar uma solução com capacidade para garantir estabilidade e confiança duradouras.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por este caminho, de violação da soberania e de aviltamento da ONU e do Direito internacional, não se garantirá a paz, seja onde for, na Europa ou fora dela. Quanto à posição de Portugal, deixo aqui, de forma clara e frontal a oposição do PCP ao envolvimento das Forças Armadas portuguesas e a condenação firme da participação do Governo nas decisões de agressão.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Uma situação como esta exige uma clarificação de todos os órgãos de soberania, desde Assembleia da República até ao Sr. Presidente da República.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

E, seguramente, reclama que os portugueses e as portuguesas, ciosos dos valores democráticos e da importância da soberania e independência nacional, juntem a sua voz na condenação deste mundo de guerra sem Direito internacional, que se está a querer impor à comunidade internacional.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, neste momento, reúne a Cimeira de Berlim, é bom que os responsáveis da União Europeia compreendam a responsabilidade que têm neste processo, se não tiveram palavra alguma de condenação desta situação!

Aplausos do PCP.