Intervenção do Deputado
Joaquim Matias
Programa Polis
21 de Março de 2001
Senhor Presidente
Senhores Deputados
Senhores Membros do Governo
O Projecto de Resolução do PSD, de Maio do ano passado, reporta-se
a um período em que o Governo tinha pedido à Assembleia da República
uma autorização legislativa com o objectivo de criar um regime
excepcional aplicável às sociedades gestoras das intervenções
previstas no Programa Polis.
Objectivo do Governo esse, que consistia no fundamental em gerir centralmente
fundos comunitários descentralizados como os das Intervenções
Operacionais Regionais e centralizar competências, assumia então
formas de contornos no mínimo pouco definidos, retirando competências
às autarquias e diluindo poderes da administração em "sociedades
gestoras" com as Câmaras Municipais em minoria, um regime algo promíscuo
com a "Parque Expo", em nome de uma eficácia mais do que duvidosa
tendo em conta os antecedentes dos intervenientes.
Na altura chamámos a atenção da Assembleia para o facto
da operação que, nos moldes propostos, assumia mais foros de propaganda
do que reconversão urbanística e ambiental, com o sério
risco de retirar aos órgãos eleitos e consequentemente ao controlo
democrático, poderes que, sendo da administração pública
como o direito de estabelecer e definir o uso e a qualificação
dos solos ou expropriar por declaração de utilidade pública
e tomada de posse administrativa de terrenos, não podem nem devem ser
delegados em entidades que não estando sujeitas ao controlo democrático
dos cidadãos não têm que se pautar pelos princípios
da igualdade e da perequação.
Apresentamos então, também nós, uma proposta alternativa
que consistia, caso se tornasse necessário, por questões de cumprimento
de prazos, atribuir excepcionalmente às autarquias poderes, não
no sentido de extravasar as suas competências, mas tão só
dispensando-as de formalidades burocráticas que pudessem implicar atrasos
incomportáveis para o cumprimentos de programas, naturalmente de forma
justificada e sem prejuízo do controlo democrático.
Proposta rejeitada pelo Partido que apoia o Governo, aliado ao Bloco de Esquerda,
sem todavia explicar quais os receios políticos de conferir este "enorme
aumento" de poderes às autarquias locais.
Reportando-se o projecto de resolução à estratégia
de gestão do Programa Polis, tendo sido entretanto adoptada pelo Governo
outra estratégia bem diferente, apoiada pelo PS e pelo Bloco de esquerda
e já em marcha o projecto é ainda assim válido, a nosso
ver, como forma de avaliação dos resultados de gestão entretanto
praticados.
Em primeiro lugar importa referir que em muitas mas ainda não em todas
as cidades escolhidas para intervenção foram constituídas
sociedades gestoras cujos dirigentes a população não conhece
e foi inaugurado com a presença do senhor Primeiro Ministro um relógio
em contagem decrescente, ao jeito de quem promete a inauguração
de uma EXPO daqui a uns 3 anos.
A estratégia de intervenção não foi discutida pelos
órgãos autárquicos, nem é conhecida das populações
como se fosse possível proceder a uma requalificação urbana
e ambiental duma cidade à revelia dos seus cidadãos e dos seus
eleitos. Os projectos de execução, esses, quando existirem presume-se
que serão aprovados um a um nas Assembleias Municipais, cujos membros
serão então colocados perante o dilema "ou aprovas o projecto
assim, ou não há outro".
Em segundo lugar, importa analisar a transparência do processo nas suas
várias vertentes.
O Tribunal de Contas chumbou o contrato entre a Direcção Geral
do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano e a Parque Expo,
S.A. que tinha como objectivo a elaboração de planos estratégicos
das intervenções em 10 cidades, a DGOTDU fundamenta o ajuste directo,
acolhido pelo senhor Ministro em despacho favorável como sendo a Parque
Expo a única entidade capaz, nacional e internacionalmente, de enfrentar
o quadro de condicionalismos descritos, o que quer dizer que as outras oito
cidades não conseguirão levar por diante os projectos, por razões
óbvias. Mas sendo a entidade que manteve os especialistas das várias
valências necessárias à intervenção, vai usar
64% do valor do contrato para contratações externas.
Não se percebe aliás muito bem o papel das sociedades constituídas,
se a Parque Expo é que vai fazer toda a gestão da intervenção
incluindo a elaboração dos processos de expropriação,
cálculo de indemnizações de gestão integrada de
empreiteiros, factos que justificam o elevado valor contratual por se tratar
de custos de gestão. Então, e a sociedade? Limita-se certamente
a passar cheques.
Ainda sobre a Parque Expo, cujas virtudes, segundo as palavras do senhor Ministro,
"interessa disseminar", há que referir os resultados finalmente
positivos, provenientes do aumento de vendas de terrenos para habitação
e das alterações efectuadas em planos de pormenor que aumentam
o número de fogos disponíveis com prejuízo do Regulamento
Geral das Edificações Urbanas.
Será que é isto que se pretende? Ou é apenas contribuir
modestamente para tapar parte do défice da Parque Expo à custa
das verbas do Polis?
Em terceiro lugar e ainda no que concerne à transparência, é
o próprio Gestor do Programa, Nunes Correia, quem anuncia que o Programa,
cujas obras ainda mal começaram, vai precisar de mais 40 milhões
de contos, ou seja, mais 25%, verba a retirar do Programa Operacional do Ambiente.
Mas diz mais:
O Programa vai ser aberto a mais duas a quatro cidades, curiosamente na sua
componente fechada, porque sobre as componentes abertas não se conhece
o estabelecimento de quaisquer normas com vista a aceitar candidaturas de cidades
às diferentes linhas do programa, e será que haverá verba
para financiar essas linhas? Não parece viável com a gestão
que tem vindo a ser efectuada.
É mais fácil, por reivindicação, os Municípios
conseguirem integrar-se em linhas fechadas do que concorrerem a linhas abertas
como a Região Autónoma da Madeira que se integrou entre Angra
do Heroísmo, Évora, Sintra e Porto, cidades com área classificadas
como Património Mundial, mesmo não possuindo alguma área
com essa classificação.
Senhor Presidente
Senhores Deputados
Senhores Membros do Governo
Não sendo, nesta altura, razoável fazer e desfazer sociedades
gestoras e empresas municipais para a gestão do Programa Polis, o certo
é que o Ministério do Ambiente que detém a maioria do capital
das sociedades gestoras que foram criadas, tem obrigação de reformular
rapidamente a sua estratégia de gestão do Programa, acautelando
a defesa do interesse público, respeitando os poderes autárquicos,
fazendo cumprir às sociedades gestoras as normas contratuais relativas
às empreitadas, clarificando os processos por forma a salvaguardar a
transparência de gestão dos dinheiros públicos, proporcionando
por fim uma autêntica requalificação urbana e ambiental
das cidades com a participação dos cidadãos e abdicando
de meras operações propagandísticas, sem conteúdo
prático e útil para as cidades.
Disse.
(...)
Sr. Ministro,
Não vou falar no seu Programa Polis, senão tinha de perguntar-lhe
que horas são em Aveiro ou o que é que fazem as sociedades gestoras
se a Parque EXPO faz tudo e elas se limitam a assinar cheques.
As questões que lhe vou colocar têm a ver com requalificação
urbana e ambiental.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que não é possível,
nem em Portugal nem em qualquer outra parte do mundo, fazer programas de requalificação
ambiental nas cidades sem ter em atenção a redução
dos gases de efeito de estufa, problema para o qual Portugal não tem
nada. Partiu de uma situação privilegiada mas está hoje
numa posição que os estudos apontam como tendo de ser ultrapassada.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro: num programa de requalificação urbana
e ambiental qual é, quantitativamente, a proporção para
redução de gases de efeito de estufa?
Em segundo lugar, não perfilhamos o seu conceito de que do poder local
vem tudo mal feito e de que tudo o que é bom vem do poder central. Pensamos
o contrário, porque, senão, eu teria de perguntar-lhe o seguinte:
então os efeitos disseminadores dos bons exemplos que o Sr. Ministro
quer espalhar pelo País é o da Sociedade Parque EXPO - e não
estou a referir-me à exposição internacional de Lisboa,
estou a referir à Sociedade Parque EXPO 98, S.A. -, que transgride o
Regulamento Geral das Edificações Urbanas para aumentar e multiplicar
os prédios a vender para benefício próprio, como faz qualquer
construtor, de segunda classe, diga-se de passagem?
Outra questão diz respeito à disseminação dos exemplos
do poder central. Quero referir-me aos planos de ordenamento do território,
que são a base de uma política urbanística e ambiental
correcta.
Para não ir buscar mais exemplos, refiro, designadamente, um plano especial,
o de ordenamento da albufeira do Alqueva, que o Sr. Ministro congelou. Isso
está a permitir que se façam vendas e especulações
de solos e que quando chegar a altura de estabelecer o princípio da perequação
não haja possibilidades de o fazer. Porquê, Sr. Ministro?! Porque
o plano de ordenamento da albufeira do Alqueva, um plano especial, cuja elaboração
é da competência do seu ministério com a participação
das autarquias, está, pura e simplesmente, metido na gaveta.
São estes exemplos que não devem disseminados, até porque,
em grande parte destas questões, os exemplos maus têm vindo do
Governo e os exemplos correctivos têm vindo das autarquias locais.