Estatuto Fiscal Cooperativo
Intervenção de Lino de Carvalho na Assembleia da República
7 de Maio de 1998

 

Senhor Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Senhores deputados,

Finalmente, embora com grande atraso em relação às promessas eleitorais, temos presente uma proposta de lei visando criar um Estatuto Fiscal específico para o Sector Cooperativo. Nada mais justo, atenta a relevância constitucional e social do cooperativismo. O comando constitucional que determina que "a lei definirá os benefícios fiscais e financeiros das cooperativas, bem como condições mais favoráveis à obtenção de crédito e auxílio técnico" (nº 2 do artº 85º da CRP) tarda a ser concretizado. E se com esta proposta de lei é dado um primeiro passo (embora parcial) com vista a dar resposta à primeira parte do texto constitucional ainda fica a faltar a concretização de legislação que dê corpo ao acesso ao crédito e ao auxílio técnico.

Com a Reforma Fiscal de 1988 foi revogada a legislação que estabelecia um quadro de benefícios fiscais para as cooperativas. Desde então, exceptuando algumas medidas avulso, não foi reconstruído um quadro global de benefícios fiscais e financeiros que desse cumprimento à Constituição e respondesse ás necessidades e legítimas expectativas do sector.

Neste contexto, a proposta de lei que o Governo nos apresenta agora merece - e desde já o dizemos - o nosso acordo global sem prejuízo das críticas e das alterações que em sede de especialidade entendemos formular e propor.

O elenco dos dispositivos que merecem o nosso distanciamento é múltiplo.

Desde logo, a ausência de referência e aplicação específica do Estatuto Fiscal às cooperativas de grau superior, designadamente as Federações e Confederações que, em nossa opinião, cumpridos os preceitos cooperativos, devem ter um tratamento fiscal idêntico a outras organizações associativas de representação profissional e social, tanto em matéria de IRC como de IVA;

Depois, o nosso total desacordo que a isenção de sisa e a redução de contribuição autárquica fiquem dependentes de prévia deliberação casuística das Assembleias Municipais respectivas e, ainda por cima, com o objectivo de considerar esta deliberação "como renúncia à compensação" prevista na Lei de Finanças Locais. Não estamos perante um incentivo fiscal ou financeiro direccionado para uma autarquia específica, da iniciativa dela própria, com vista, por exemplo, a promover o investimento e o emprego na área do respectivo município caso em que seria compreensível uma disposição deste género. Trata-se, pelo contrário, de um benefício genérico, para ser aplicável a todo o sector cooperativo e em todo o território nacional. Porque razão há-de ficar sujeito a prévia deliberação de cada Assembleia Municipal? A razão é simples: é que o Governo, como diz na proposta, o que pretende é evitar o cumprimento da Lei de Finanças Locais não compensando as autarquias pelo benefício que pretende conceder ao sector cooperativo. Esta é que é a razão verdadeira, conceder benefícios fiscais à custa do bolso alheio.

É necessário também não excluir dos apoios fiscais (designadamente quanto à redução da taxa do IRC) todas as operações com terceiros. Porque, estando o PCP de acordo quanto ao facto de não se permitir que a forma cooperativa seja usada fraudulentamente para encobrir e beneficiar de apoios fiscais autênticas actividades empresariais privadas e com fins lucrativos a verdade é que há ramos do sector cooperativo em que as operações com terceiros constituem o cerne da sua actividade e no integral respeito pela lei e pelos princípios cooperativos. É o caso das cooperativas de produção e muitas de transformação.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

O governo deveria aproveitar este diploma para intervir noutros ramos do sector cooperativo e para dar um estímulo global a alguns sectores produtivos cooperativos. Estou a referir-me à necessidade de ser reestruturado o Sistema de Crédito Agrícola Mútuo - reorientando-o prioritáriamente para o apoio ao sector agrícola, tributando os excedentes consolidados do Sistema e não Caixa a Caixa, não lhe exigindo o cumprimento de ratios idênticos ao sector financeiro privado - e à necessidade de se utilizarem os instrumentos fiscais para apoiar a promoção da produção nacional, designadamente agrícola. Mas é evidente que tudo isto passa por uma Reforma Fiscal que, de acordo com as últimas notícias vindas a público, o Governo, atento já ás próximas eleições legislativas, decidiu adiar para lá de 1999.

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados,

Tímido, insuficiente e carecido de bastantes melhorias em sede de especialidade a proposta de lei em apreço constitue contudo, como disse, um primeiro passo que globalmente merece o nosso acordo. Esse será, pois, também o sentido do nosso voto.

Disse.