Resposta de Carlos Carvalhas às questões colocadas pelo semanário "Lusitano"
Setembro de 1999

 

1. Na última legislatura, o PCP, em termos de política de emigração, apostou na defesa do ensino da língua portuguesa no estrangeiro, do movimento associativo e no reforço dos Serviços especializados da Segurança Social. Essas temáticas continuarão a constituir as maiores preocupações do Partido para o novo milénio?

Continuarão seguramente a ser, não as únicas, mas duas das principais preocupações e objectivos da intervenção do PCP em defesa das Comunidades Portuguesas no Mundo, cuja realização tem a ver com a especial atenção que devem merecer duas componentes essenciais da emigração – os jovens lusodescendentes e os muitos emigrantes que estão agora a atingir a idade da reforma.
Só um forte investimento na expansão, dignificação e qualificação do ensino da língua e da cultura portuguesas na Emigração possibilitará às novas gerações de lusodescendentes o necessário suporte para uma activa ligação com Portugal como país de origem, sem prejuízo da sua natural inserção nos países de acolhimento.
E, quanto ao reforço da capacidade de resposta e de intervenção dos serviços especializados da Segurança Social portuguesa, trata-se de garantir que encontrarão por parte do Estado português a resposta eficaz e pronta que merecem, e não têm tido, quanto ao tratamento dos seus processos de reforma, sobretudo à medida que centenas de milhar de emigrantes portugueses entram na idade da reforma.

2. Com que verbas e de que forma levaria a cabo o programa de expansão e qualificação do ensino da língua portuguesa junto das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo que tanto ambiciona ver em prática?

O "programa de expansão e qualificação do ensino da língua e da cultura portuguesas", que é uma das nossas propostas quanto à área da Emigração Portuguesa no nosso Programa Eleitoral, exige a elaboração urgente de um "Livro Branco" com a participação das comunidades portuguesas em cada país e dos professores, que constitua um rigoroso levantamento das carências, dos problemas e dos meios.
Um investimento maior do Estado Português nesta área implica a contratação e destacamento de mais professores, mais e melhores meios e apoios pedagógicos e respectiva coordenação, mais apoios também ao movimento associativo, mais iniciativa junto dos Governos dos países de emigração portuguesa para que seja feita a integração curricular do ensino da língua e cultura portuguesa.
Chamamos ainda a atenção para outra medida inovadora – a necessidade de "uma política cultural especificamente orientada para as Comunidades Portuguesas", que envolva prioritariamente as novas gerações e contrarie imagens redutoras e estereótipos ultrapassados da emigração, para o que se torna também indispensável uma radical melhoria da qualidade da programação e informação na RTPI.
É evidente que o milhão e meio de contos do Orçamento do Estado para as Comunidades Portuguesas no Ministério dos Negócios Estrangeiros ou os pouco mais de 6 milhões de contos para o ensino da língua portuguesa em todo o Mundo são claramente insuficientes e definidores duma política governamental do PS, e antes do PSD, cujo discurso de simpatia para caçar o voto dos emigrantes não corresponde à tomada de medidas práticas, que custam dinheiro e mexem com prioridades. Lembramos, aliás, a este respeito, que na aprovação do Orçamento de Estado para este ano, os outros partidos inviabilizaram uma proposta do PCP para um simples reforço de 300 000 contos para a difusão da cultura e língua portuguesas.
É possível, com outra política e outras prioridades, assegurar no Orçamento de Estado o apoio às Comunidades Portuguesas que estas merecem e exigem, e além do mais correspondente à sua importância para o equilíbrio da economia portuguesa (as suas remessas representam mais para Portugal do que as remessas, em termos líquidos, da União Europeia).

3. O apoio ao regresso definitivo dos emigrantes a Portugal tem sido outro tema focado pelo Partido Comunista. De que forma concreta o levaria a cabo?

O que temos colocado é que, quer quanto aos emigrantes que optam por regressar a Portugal, quer quanto aos que mantêm com Portugal laços diversos, é indispensável assegurar serviços para os apoiar no exercício dos seus direitos e na resolução dos seus problemas, desenvolver um programa de informação sobre direitos que aproveite todos os meios de comunicação, tomar medidas de maior estímulo material à fixação e ao investimento das suas poupanças, direccionando-as designadamente para a redução das desigualdades de desenvolvimento regional.

4. O Partido Comunista também se tem referido a um plano de apoio ao movimento associativo das comunidades portuguesas, com a constituição de um Fundo dotado de verbas próprias no Orçamento de Estado. Tendo em conta que a Secretaria de Estado das Comunidades fica sempre com uma fatia quase insignificante desse Orçamento, acredita que na realidade existem verbas para tanto?

As mais de 2 000 associações portuguesas espalhadas pelo mundo são um elemento essencial e estruturante das próprias Comunidades Portuguesas, dão uma contribuição ímpar e muito diversificada no apoio aos emigrantes, são determinantes na criação de laços de coesão, têm um valioso papel na promoção da cultura portuguesa.
Os novos problemas e desafios que enfrentam as associações portuguesas face às transformações na própria emigração e, por outro lado, a carência de meios com que se debatem, justificam que se substitua uma política de "saco azul" para distribuição de migalhas, que não se liberta da suspeita de falta de isenção, por uma orientação de apoio isento e transparente.
A proposta que fazemos de um "plano de apoio ao movimento associativo das Comunidades Portuguesas", com a criação de um Fundo com verbas próprias no Orçamento de Estado, a definição de critérios de apoio na base da audição do movimento associativo, o fornecimento de bens culturais e a formação e destacamento de animadores culturais, pretende ser o reconhecimento efectivo pela nossa parte da importância das associações portuguesas.

5. O PCP tem lutado para que se faça uma nova eleição do Conselho Permanente das Comunidades, este ano impugnado. O que modificaria este órgão?

O PCP lutou e contribuiu na legislatura que agora findou para que fosse constituído o Conselho das Comunidades Portuguesas, como seu órgão representativo junto do Estado Português para exprimir as suas aspirações e reivindicações.
Tem sido nossa permanente preocupação que sejam asseguradas a este órgão e ao seu Conselho Permanente condições e meios que lhe permitam exercer com dignidade, eficácia e autonomia as suas funções.
Lamentavelmente não tem sido essa a postura do Governo do PS que até hoje tem procurado instrumentalizar e condicionar o funcionamento do Conselho e a actividade dos conselheiros eleitos, seja negando os meios indispensáveis à dignidade do seu funcionamento, seja procurando limitar a sua actividade ou interferir no seu funcionamento.
O PS está assim a não tirar lições do mau exemplo que representou um comportamento semelhante dos Governos do PSD em relação ao órgão que anteriormente representou a emigração portuguesa e que conduziu à sua extinção.
Não foi o PCP que criou o problema da irregularidade da eleição do Conselho nem foi o PCP que impugnou a eleição, nem tal papel lhe cabe.
A impugnação da eleição do Conselho, de que resultou já uma sentença dos tribunais reconhecendo a irregularidade, tem origem numa proposta do Governo que não garantia igualdade de direitos em matéria de elegibilidade a todos os conselheiros.
O Governo é que tem de ser responsabilizado por ter induzido uma irregularidade, e deve em consequência garantir, no caso de a conclusão do processo judicial o impor, as condições e os meios para que o Conselho das Comunidades possa repetir em condições democráticas e com inteira isenção o acto eleitoral.
Pela nossa parte podemos assegurar aos emigrantes portugueses que defenderemos o reforço do Conselho das Comunidades, que combateremos a sua instrumentalização e que promoveremos o aperfeiçoamento da legislação para reforçar a democraticidade, autonomia e representatividade deste órgão.

6. No seio do PCP discorda-se com o facto da Secretaria de Estado das Comunidades estar sob tutela do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Todavia, surgem várias propostas quanto ao assunto: colocá-la sob tutela do Ministério do Trabalho ou junto do Gabinete do primeiro-ministro. Qual das duas lhe parece mais viável?

É natural reflectir sobre qual é o mais adequado posicionamento e inserção da Secretaria de Estado das Comunidades na estrutura do Governo.
Mas julgamos que a questão central a debater, do ponto de vista dos interesses e direitos dos emigrantes, não é a localização no Governo dessa Secretaria de Estado, mas sim qual a política de emigração que é preciso realizar.
Pela nossa parte desejaríamos que o debate durante a campanha eleitoral possibilitasse também a compreensão por parte de mais portugueses de que o perigo principal nestas eleições não é o retorno ao poder de partidos de direita como o PSD, que ninguém crê serem alternativa e que se desacreditaram durante cerca de 16 anos de governação da área da emigração.
O perigo principal a combater nestas eleições é o de um poder absoluto e uma maioria absoluta do PS que serviriam para acentuar todos os traços mais negativos da sua governação e para intensificar a escandalosa instrumentalização do aparelho de Estado e dos cargos públicos.
Contamos para isso que mais portugueses, também nas Comunidades, reforcem o seu voto na CDU, dando mais força aos que mais coerentemente se batem, não só nas eleições mas em todas as horas, por uma nova política que assegure mais desenvolvimento para Portugal com mais justiça social e que garanta mais respeito pelos emigrantes portugueses, pelos seus direitos e aspirações.

7. Quais as decisões do actual Governo que, em termos de emigração, lhe merecem as maiores críticas?

É difícil escolher apenas alguns exemplos negativos numa área em que foi grande a distância entre a retórica, as operações de imagem, os discursos, as viagens e a propaganda, e a realidade crua dos numerosos problemas que permaneceram por resolver.
Mas sublinho a postura servil, conformista e passiva do Governo português face aos Estados Unidos da América quanto às centenas de cidadãos expulsos e deportados após cumprimento de penas, sobretudo para os Açores, criando aí inevitáveis e graves problemas de integração social;
Lembro as suas propostas nos Orçamentos de Estado de verbas ridículas para o funcionamento do Conselho das Comunidades (36 500 contos este ano, só aumentados em apenas mais 26 000 contos após proposta do PCP e doutros nesse sentido);
Recordo o modo incompetente como administrou o problema do Estatuto dos Professores de Língua Portuguesa no Estrangeiro, associando às já conhecidas carências nesta área novos problemas e situações de instabilidade desmotivadoras do esforço, que deve ser valorizado, dos agentes educativos nesta área.

8. Como solucionaria estes casos?

Quanto às deportações, através de uma atitude exigente e firme na negociação de uma solução política com os Estados Unidos da América, que tenha em conta a responsabilidade da sociedade norte-americana relativamente a cidadãos que ali cresceram, foram educados, têm família e raízes, muitos dos quais não falam sequer ou falam mal o português.
Quanto ao Conselho das Comunidades Portuguesas, assegurando no Orçamento de Estado as verbas suficientes para o seu funcionamento eficaz e autónomo.
Quanto aos problemas verificados com o ensino da língua portuguesa no estrangeiro, evitando as injustiças e focos de perturbação verificados no ano escolar e garantindo no Orçamento de Estado um investimento mais significativo para esta área.

9. Numa escala de 20 valores, com que nota classificaria o desempenho do Secretário de Estado das Comunidades, José Lello?

Nestes 4 anos passados desde as últimas eleições, os emigrantes portugueses sabem, por experiência própria, que o Governo do PS não resolveu nem respondeu à maioria dos seus problemas, privilegiando sobretudo a promoção da imagem, as relações públicas e a propaganda. Mesmo as medidas tomadas nalgumas áreas, correspondendo aliás a propostas de há muito defendidas pelo PCP e pela CDU, como quanto à organização dos serviços consulares, foram concretizadas de modo parcial, lento e pouco coerente.
A avaliação da política governativa nesta área não pode, por isso, atingir um patamar positivo, mesmo que mínimo, é em nossa opinião globalmente medíocre.

10. Depois de nas últimas eleições o PCP ter obtido menos votos, acredita que é desta vez que vão conseguir eleger um deputado pela emigração?

Nas últimas eleições para o Parlamento Europeu verificou-se uma menor votação global nas candidaturas por parte dos portugueses residentes nos países da União Europeia e uma maior participação eleitoral destes nos países de residência, situação que influenciou a menor votação conseguida na emigração pela CDU.
A distinta natureza das próximas eleições para a Assembleia da República define um quadro diferente para a participação e o voto dos emigrantes portugueses.
Temos razões para acreditar na possibilidade de uma significativa subida da votação dos emigrantes portugueses na CDU e para isso estamos a trabalhar.
Os candidatos da CDU nos dois círculos eleitorais da Emigração são homens e mulheres profundamente conhecedores dos problemas das Comunidades Portuguesas, todos eles emigrantes ao contrário das listas apresentadas por outras forças políticas, todos eles com provas dadas numa constante intervenção em defesa das aspirações e direitos da Emigração Portuguesa.
Os emigrantes portugueses sabem que podem sempre contar com o PCP e a CDU, em todas as horas e não apenas nas eleições. Conhecem-nos por isso.
É portanto com profunda convicção que lhes dizemos, nesta campanha eleitoral, que traduzam esse reconhecimento em votos. Porque mais votos na CDU na Emigração e a eleição de deputados da CDU é o caminho mais seguro para que não fique tudo na mesma e para que se dê força a uma nova política em Portugal, que respeite mais e melhor as Comunidades Portuguesas.

11. Como está a decorrer a campanha eleitoral do Partido junto da emigração? Tem alguns planos para ultrapassar certas dificuldades no que concerne em levar à prática a sua campanha eleitoral em determinados países, como é o caso dos Estados Unidos? Como leva a sua palavra junto dos portugueses aí residentes?

A nossa campanha na emigração é prioritariamente orientada para um intenso esforço de contacto directo com os portugueses da diáspora, visando o debate dos problemas das Comunidades Portuguesas, a avaliação crítica da governação em Portugal, a apresentação das nossas propostas para a necessária viragem, pela esquerda, da política portuguesa e a divulgação das "10 medidas para uma nova política de apoio às Comunidades Portuguesas" que constitui a base da política que propomos para esta área.
As limitações que condicionam a nossa acção nalguns países, a que se somam a evidente desproporção de recursos com outras forças políticas, condicionam sem dúvida o alcance da nossa mensagem a alguns sectores da emigração portuguesa. Mas não desistimos de prosseguir a comunicação das nossas ideias e propostas.
Como um contributo para que a RTPi cumpra com as suas obrigações de serviço público quanto às Comunidades Portuguesas, os candidatos da CDU tomaram a iniciativa já há bastante tempo de propor a realização atempada, de debates entre representantes das candidaturas de cada um dos círculos eleitorais da emigração.
Consideramos que a RTPi deveria, tal como a RDPI, assumir um papel mais activo na informação eleitoral, garantindo de modo isento e plural a divulgação das posições das diversas candidaturas, incluindo a CDU. Os portugueses espalhados pelo Mundo que vêm a RTPI podem verificar como esta não cumpre ainda esse papel.

12. O PCP é um Partido com um discurso direccionado para o povo. Tendo em conta que em Portugal, como na maior parte do mundo, a maioria dos eleitores pertence à classe trabalhadora e não ao patronato, como explica os resultados eleitorais diminutos relativamente à realidade apresentada? No que é que esse discurso tem falhado?

A pergunta reporta-se a um dos problemas mais complexos da vida de uma sociedade: ou seja, o facto de as opções de representação política e eleitoral se apresentarem divorciadas ou distintas dos interesses sociais dos eleitores.
O discurso de um partido pode responder melhor ou pior a esse desafio e a essa questão, mas na base dela estão múltiplos factores sociais, culturais e políticos que não são superáveis por artes mágicas, antes só podem resultar de um longo esforço de esclarecimento e de um processo em que largos sectores de trabalhadores compreendam que as opções de voto devam ser vistas, não como um assunto separado das suas aspirações e lutas, mas como um momento privilegiado para as afirmar.
É neste sentido que estamos dirigindo um especial apelo aos trabalhadores para que votem em quem - como o PCP e a CDU - sempre esteve a seu lado e não nas forças - como o PS - que realizam uma política que não respeita quem trabalha, antes tem agredido muitos dos seus interesses e aspirações.

13. O líder do PSD, caso seja eleito primeiro ministro, promete reduzir a percentagem do IRS que o Estado cobra a cada português, o que, aliás, é uma medida que o PCP também propõe. Todavia, o seu Partido também pretende combater as evasões fiscais, o que parece ser algo bastante difícil de se conseguir. Até hoje, todas as forças partidárias se referiram a isso mas não encontraram soluções viáveis. Como poria fim, por exemplo, às evasões fiscais de certas profissões liberais bem remuneradas sem prejudicar outras muito mais desfavorecidas?

Propor a baixa de impostos, designadamente do IRS, e não apresentar propostas de alargamento da base tributária (através quer do combate à evasão fiscal, quer da forte redução dos benefícios fiscais existentes, quer da tributação de alguns tipos de rendimentos actualmente não tributados) é pura demagogia. Ou, em alternativa, é propor, sem o assumir pública e expressamente, a redução dos salários na função pública e a diminuição das dotações orçamentais para a saúde, a educação e outras funções sociais que ao Estado incumbem.

14. O PCP aposta na redução dos benefícios fiscais às aplicações financeiras e no combate efectivo à tributação das operações de venda de títulos em bolsa ou fora dela e das operações cambiais não suportadas em transacções comerciais. Se estas medidas fossem postas em prática, o que ganhariam os portugueses e que consequências teriam para a economia portuguesa, já que afectariam os cidadãos com maior poder de investimento?

Não há qualquer justificação económica, e muito menos social, para que os rendimentos e mais valias das operações financeiras e especulativas estejam livres de imposto. É inaceitável, por exemplo, que a taxa de IRC paga sobre os lucros declarados do sistema bancário seja da ordem dos 20%, ao mesmo tempo que as empresas industriais e comerciais pagam 34%. Do mesmo modo que a tributação de 0,2% ou 0,1% sobre as vendas de títulos e operações cambiais não poria em causa os mercados financeiros.
As consequências para a economia só poderiam ser positivas, abrindo a porta a mais investimento na actividade económica produtiva e geradora de emprego. Os ganhos para os portugueses seriam enormes: essa receita fiscal acrescida (de muitas dezenas de milhões de contos) permitiria baixar de forma significativa a tributação em IRS, e canalizar mais recursos para as funções sociais do Estado.

15. Paulo Portas, líder do CDS/PP, defende maiores pensões de reforma. O PCP também, contudo acusa o CDS/PP de apenas querer ganhar votos à conta de tal proposta para depois pressionar a privatização da Segurança Social e do único banco público de Portugal. Caso tais privatizações acontecessem que consequências teriam para os portugueses? Não sendo assim, e de acordo com as informações de que a nossa Segurança Social está quase falida, como seria possível aumentar as pensões de reforma sem colocar em risco as reformas futuras daqueles que hoje são trabalhadores activos?

Deixe que lhe exponha o nosso pensamento:
O "modelo" neo-liberal de privatização da Segurança Social, que com variantes aparece a ser defendido pelos representantes do grande capital financeiro e, no plano político, pelos responsáveis do PSD, do PP e do governo do PS, não tem nada de positivo a oferecer aos beneficiários da Segurança Social, nem dispõe de qualquer vantagem na abordagem dos problemas com que o sistema está confrontado.
Aos beneficiários da Segurança Social o "modelo" privatizador neo-liberal promete muito, mas oferece de facto muito menos do que o sistema público. Menos direitos e menos protecção social. Menos garantias em comparação com as que a Segurança Social, organizada e apoiada pelo Estado, estará em condições de proporcionar. E benefícios menores, porque a gestão privada prossegue objectivos de natureza lucrativa.
Quanto aos problemas do equilíbrio financeiro, o "modelo" privatizador também não apresenta qualquer vantagem. É incapaz de equacionar a necessidade de alargamento e aperfeiçoamento da base contributiva. E a capitalização de recursos constitui uma técnica a que o próprio sistema público pode recorrer, de uma forma mais segura e com mais vantagem para o país.
Quando o PCP apresenta propostas concretas de aumento de pensões, designadamente em relação às mínimas do regime geral (contributivo), à pensão social e à pensão dos trabalhadores agrícolas, fá-lo de modo consciente e responsável, e acompanhada de medidas de reforço da sustentabilidade financeira da Segurança Social.
Repare no que propomos no nosso Programa Eleitoral para reforçar e aperfeiçoar o financiamento do sistema público de Segurança Social: assegurar o financiamento pelo Orçamento do Estado dos regimes não ou pouco contributivos e da acção social, recuperar as dívidas das entidades patronais à segurança social, dar combate de forma eficaz a todas as formas de evasão contributiva, adoptar medidas para garantir a inscrição de todos os trabalhadores na Segurança Social, aperfeiçoar a relação entre as prestações recebidas e o esforço contributivo, alargar a base contributiva do regime geral dos trabalhadores por conta de outrem, acrescentando uma contribuição anual das entidades empregadoras, cujo volume de negócios ultrapasse um valor a fixar por lei, elaborar o orçamento e a conta da segurança social de forma a serem autonomizadas as receitas de cada regime e explicitadas as despesas, adequar as fontes de financiamento, por forma a distinguir o que deve ser financiado por contribuições e receitas próprias, e o que deve ser financiado pelo Orçamento do Estado.
Em todos os casos que haja estabelecimento de taxas contributivas inferiores à taxa social única, o Estado deve transferir para o orçamento da segurança social o montante dos apoios que concedeu.

16. O PCP sempre se assumiu como um Partido defensor da igualdade de direitos para homens e mulheres. Nesse sentido, porquê repor a idade da reforma das mulheres nos 62 anos?

Para o PCP não há nem nunca houve, qualquer contradição entre as duas questões. Esta falsa contradição fundamentou o aumento da idade da reforma das mulheres dos 62 para os 65 anos pelo governo do PSD.
A igualdade de direitos e de oportunidades está muito longe de fazer parte do dia a dia da mulher trabalhadora. A grande maioria das trabalhadoras assumem em exclusividade a responsabilidade com a educação dos filhos e a vida familiar. É uma dupla tarefa que pesa sobre elas. Os elevados ritmos de trabalho em muitos sectores de actividade com grande peso de mão-de-obra feminina é uma realidade que está muito longe de ser alterada.
A grande maioria das trabalhadoras tem ao longo da vida um imenso desgaste quotidiano e são sujeitas a muitas discriminações negativas. É, portanto justa a promoção de uma medida de discriminação "positiva" que lhe possa propiciar melhores condições na velhice.

17. A Educação foi a "paixão" de António Guterres, uma "paixão" pouco ardente segundo as críticas, mas "paixão". Bastava que o primeiro ministro tivesse defendido a gratuidade dos livros escolares durante a escolaridade obrigatória para que essa paixão tivesse valho a pena? Julga que essa medida por si defendida controlará mais eficazmente o insucesso escolar dos nossos alunos?

Dois pontos que gostaria de esclarecer.
O primeiro, diz respeito à nossa avaliação da situação existente na área educativa quatro anos depois da tão proclamada "paixão" do Governo.
É um facto que aumentaram os recursos públicos disponibilizados para a área da educação, mas isso não significa que tenha sido assegurado o bom aproveitamento desses meios. Também houve alterações quanto ao estilo governativo, que deixou de caracterizar-se pela arrogância e pela ignorância que haviam sido a imagem de marca dos ministérios da educação da responsabilidade do PSD.
Entretanto quanto aos principais problemas do sector, a verdade é que a situação, no seu conjunto, não evidenciou melhorias significativas. Saliente-se o baixo nível de instrução da população; as taxas de escolarização no 2º e no 3º ciclos escolares ainda longe dos 100%; a baixa frequência no ensino secundário; a permanência dum elevado insucesso escolar e educativo; o abandono escolar; a dificuldade sentida por muitas escolas de encontrarem respostas adequadas aos problemas de aprendizagem dos seus alunos; os insuficientes passos dados no domínio do apoio sócio-pedagógico e da orientação escolar e profissional; a sobrecarga curricular, designadamente a programática; a indeterminação subsistente no secundário, com a falta de clarificação e aperfeiçoamento das suas vias, somada à questão da baixa frequência que continua a verificar-se; a insuficiência do investimento público e da intervenção ao nível do ensino superior, indispensáveis para enfrentar a falta de condições e os problemas existentes.
Os últimos anos na área da educação acabaram, assim, por ser, fundamentalmente, de continuidade da política anterior. Com efeito, tem sido realmente escassa a intervenção orientada para os problemas estruturais, de cuja resolução depende a efectiva democratização e a qualidade deste bem maior que representa a educação pública.
Tem sido positiva a expansão que se regista na educação pré-escolar. Mas ainda aqui a grande novidade democratizadora, que foi a da gratuitidade da sua componente educativa, foi da iniciativa da Assembleia da República — particularmente dos deputados do PCP — que a impôs em lei apesar dos votos contrários do PS. E a verdade, também, é que na prática o Governo não está a assegurar o cumprimento generalizado da gratuitidade da educação pré-escolar, nem a garantir a expansão da rede pública que a deve suportar.
O segundo, diz respeito à questão de como compreendemos o sucesso educativo e escolar dos jovens, o sucesso do sistema.
As elevadas taxas de retenção em todos os níveis de escolaridade, o abandono precoce da escolaridade obrigatória e a baixa qualidade das aprendizagens, constituem sintomas da crise do sistema educativo. Urge desenvolver uma política que, conjugando diversos factores e de forma combinada, faça com que cada escola se transforme num lugar de sucesso educativo real para todos.
O PCP defende a implementação do turno único em todas as escolas, o que significa a utilização de uma parte do dia para actividades lectivas e do tempo restante para o acompanhamento das aprendizagens e para a concretização de outras actividades, adequação da população escolar à capacidade de cada escola de forma a possibilitar a diversificação de actividades, a fixação do número máximo de 25 alunos por turma, o desenvolvimento da rede dos serviços de psicologia e orientação, a fixação de um número máximo legal de alunos por professor (6 turmas), a revisão dos currículos para corresponder às necessidades do desenvolvimento da sociedade e da formação integral dos jovens, o desenvolvimento de uma educação multicultural que dignifique os valores das diferentes culturas de que dos jovens e promova o respeito mútuo, a definição de currículos e programas nacionais que estabeleçam as margens de autonomia para a introdução de componentes locais, o aperfeiçoamento do sistema de avaliação dos alunos, a redefinição das funções e objectivos do ensino geral e tecnológico, do ensino profissional e da formação profissional, a melhoria da qualidade da formação inicial e contínua de professores e de outros profissionais de educação, o aperfeiçoamento das carreiras docentes e definição de carreiras de outros técnicos de educação, mediante negociação com os respectivos sindicatos, a criação de incentivos à fixação de professores em zonas desfavorecidas, a criação e/ou alargamento de serviços técnicos especializados, a dotação das escolas de pessoal em número suficiente para garantir o seu bom funcionamento, a promoção da formação de pessoal não docente, valorizando a sua função educativa.
A gratuitidade dos livros escolares que defendemos poderá também contribuir para combater o insucesso escolar. Mas a sua razão de ser radica igualmente, numa outra dimensão da política educativa, que encarecemos de forma particular.
Em nosso entender a criação de condições de igualdade real de oportunidades de acesso e de sucesso educativo para todos os portugueses continua a ser uma causa de grande significado social. É por isso necessária uma escola pública de qualidade e a criação de um conjunto de condições e de medidas de discriminação positiva que promovam o acesso à escola independentemente da origem sócio-económica e sócio-cultural das crianças e dos jovens, independentemente da região do país onde nasceram ou onde vivem.

18. Como é possível ao Estado Português aumentar a comparticipação dos medicamentos essenciais ou necessários ao tratamento de doenças crónicas, por exemplo, quando tem uma dívida tão exorbitante com as unidades farmacêuticas?

Em nossa opinião é possível alargar a lista de medicamentos para doenças crónicas comparticipados a 100% pelo Estado, o que significa evidentemente acréscimo de despesa pública, porque são igualmente possíveis (e urgentes) outras medidas de sinal oposto, que permitiriam uma considerável poupança de recursos, sem pôr minimamente em causa a qualidade dos medicamentos prescritos aos utentes.
É disso que estamos a falar quando, por exemplo, propomos a utilização de genéricos, a prescrição por substância activa, ou até a dispensa gratuita de medicamentos prescritos nas unidades do SNS nos casos em que o seu fornecimento nas farmácias fique mais caro ao Estado.