Conselho das Comunidades Portuguesas
Intervenção da Deputada Luísa Mesquita
26 de Junho de 2002

 

Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados

A matéria que hoje discutimos, abordada por quatro iniciativas legislativas, assume, no momento actual, uma crucial e urgente importância.

Não é de somenos o contexto em que realizamos este trabalho.

Quer a cimeira de Sevilha, quer as alterações que têm vindo a ser produzidas, nos últimos meses, por muitos países europeus, relativamente ao cidadão emigrante/imigrante evidenciam a necessidade da manutenção, do aprofundamento e do desenvolvimento da relação de Portugal com todos os portugueses residentes no estrangeiro.

Das iniciativas apresentadas, três delas pretendem vir a introduzir um conjunto de alterações à lei 48 de 4 de Setembro de 1996, relativas ao Conselho das Comunidades Portuguesas.

Diploma legal que resultou de um lato consenso formulado em torno de diferentes propostas.

No entanto, a realidade veio demonstrar, de 1997 até hoje, algumas fragilidades e mesmo desajustamentos do quadro legal vigente que urge resolver.

Pela nossa parte, consideramos ser possível introduzir melhorias no funcionamento deste Conselho consultivo para as Comunidades Portuguesas.

Propomos meios e procedimentos facilitadores da explanação da diversidade de interesses, anseios e opiniões que emergem no seio das nossas comunidades.

Propomo-nos contribuir para o aprofundamento da democracia participativa, num tempo em que a democracia representativa nem sempre é capaz de anular a distância e o crescente alheamento que a separam do sustentáculo matricial - o eleitor e o voto.

Projectamos instrumentos para um universo que se considera ser de mais ou menos 4 milhões e meio de portugueses espalhados pelo mundo, o que significa um universo equivalente a quase metade da população portuguesa residente em Portugal.

É óbvio que não são exclusivamente os números que ditam a importância da matéria mas devem pesar na relevância das decisões e na amplitude das análises formuladas.

O Conselho das Comunidades Portuguesas que hoje conhecemos, por responsabilidade do governo do Partido Socialista, sofreu várias vicissitudes ao longo do seu primeiro e único mandato.

E a situação agravou-se, quando não se concretizou a eleição para novo mandato no tempo regulamentar previsto - Abril de 2001.

Entretanto, por decisão do Plenário Mundial, em 31 de Março de 2001, foi marcado o processo eleitoral para 25 de Novembro do mesmo ano, tendo o governo, em total desrespeito pela lei, adiando sine dia as eleições.

E é este o actual cenário.

Um Concelho das Comunidades Portuguesas que já terminou o seu mandato há mais de um ano, ferido de legitimidade e que aguarda o términos da suspensão das eleições, ditado em 2001.

O governo suspendeu e ficou à espera que as dificuldades se auto-diluíssem.

E como não desapareceram por milagre, nem por vontade pública, continuam por resolver até hoje.

Por tudo isto, é no mínimo estranho que o projecto do Partido Socialista não pretenda resolver a confusão que o seu próprio governo criou e não solucionou.

O projecto agora apresentado limita-se a trazer para a discussão a substância que, em 1996, afastava claramente o Sr. Deputado, agora primeiro subscritor e na altura, o Sr. Secretário de Estado das Comunidades, relativamente ao recenseamento eleitoral.

Dizia então o Sr. Secretário de Estado que o Sr. Deputado Carlos Luís era "um homem de pouca fé".

Hoje, é fácil concluir, que de facto, nem fé no Secretário de Estado, nem fé na estrutura, olhando para a sua proposta.

Quanto ao governo, acho que o senhor deputado tinha razão.

De 1996 até Março de 2002 pouco ou nada foi feito para melhorar a sua crença.

Agora, quanto à estrutura, podemos e devemos alterá-la, tornando-a mais eficaz e eficiente.

E porque a lei pode, deve e urge ser melhorada.

O Projecto de Lei que o PCP apresenta não tem a pretensão de proceder a uma alteração profunda da lei, antes visa contribuir para a solução de impasse em que o governo do PS colocou o Concelho das Comunidades Portuguesas.

Consideramos que as propostas que fazemos irão contribuir para um melhor funcionamento do Concelho e uma representação mais ampla das comunidades.

Como é do conhecimento geral, um dos principais problemas prende-se com a incapacidade do estado português dispor de um registo rigoroso do número de portugueses residentes no estrangeiro, inscritos nos respectivos consulados.

Este facto determinou na primeira eleição e iria determinar na segunda, se se tivesse realizado, uma distribuição de mandatos por países claramente desfasada da realidade, dado que a Portaria entretanto publicada, registava a mesma metodologia.

No que se refere ao universo eleitoral, consideramos que deve manter-se o que a lei prevê, ou seja, um órgão de consulta que deve ser eleito na base dos inscritos nos consulados e não na base dos eleitores que voluntariamente se inscreveram nos cadernos de recenseamento para votar em eleições para a Assembleia da República.

De facto, este é um conselho consultivo, emanado da comunidade portuguesa emigrante não um órgão tutelado pelo governo.

Deverá ter um universo eleitoral muito mais abrangente e não o universo estrito do recenseamento eleitoral.

É fundamental, na nossa opinião, esta separação para distinguir o âmbito e as funções do Conselho das Comunidades Portuguesas relativamente aos órgãos com competências deliberativas.

Uma outra proposta decorre das inúmeras críticas formuladas à existência dos círculos eleitorais por países ou grupo de países.

Num caso favoreceu a concentração de portugueses nos países com vários consulados, no outro criou círculos eleitorais com um número de países e áreas geográficas tão dispersas que é humana e financeiramente impossível a um eleito deslocar-se durante o mandato de 4 anos a todos os países.

Propomos por isso uma representação por áreas consulares.

O nosso projecto de lei acolhe ainda a opinião de muitos conselheiros relativamente:

Propostas diversas que no seu conjunto têm um objectivo enformador comum - garantir uma melhor participação e uma mais elevada representatividade.

Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados

Esta é a nossa contribuição para a solução de um problema que não criámos mas que queremos ver resolvido com urgência.

Mas consideramos que é possível fazer mais e melhor.

O diploma legal em vigor pode ser melhorado mas dificilmente dará substância às muitas sugestões apresentadas pelos conselheiros e pela generalidade da comunidade.

Porque algumas das propostas, construídas progressivamente à medida que a realidade demonstrava a fragilidade dos mecanismos legais disponíveis, questionam a própria matriz da lei.

E estas são razões que sustentam a apresentação do nosso segundo Projecto Lei que Cria os Órgãos Representativos dos Portugueses Residentes no Estrangeiro.

Se com o primeiro projecto pretendemos colaborar na procura de uma solução urgente, com este propomo-nos construir um edifício mais duradouro.

O nosso projecto pretende garantir a criação de uma estrutura mais participativa, mais representativa e mais autónoma.

Só estes pressupostos serão capazes de viabilizar um conhecimento mais aprofundado da realidade e dos inúmeros problemas com que se debatem as comunidades portuguesas no estrangeiro.

O nosso texto assenta prioritariamente nas Comissões Consulares, compostas por membros eleitos por sufrágio directo e secreto, dos portugueses maiores de 18 anos, residentes na respectiva área consular.

Compete a estes eleitos, nomeadamente, designar os seus representantes nas Comissões de Acção Social e Cultural - previstas desde 1997 - mas que até hoje não foram incrementadas.

Os outros órgãos são o Conselho de País e o Conselho Mundial.

O Conselho de País é composto por todos os membros eleitos para as Comissões Consulares e reúne, ordinariamente, uma vez por ano.

O Conselho Mundial é composto por membros eleitos pelo Conselho de País, numa relação proporcional ao número total de eleitores inscritos no respectivo país e reúne, ordinariamente de dois em dois anos.

Estamos convictos que a ser criada esta estrutura por patamares diferentes de intervenção, encontrar-se-á um espaço de consulta, de reflexão e de debate relativo às políticas de emigração e das comunidades portuguesas mais amplo, mais rico, mais eficiente e mais democrático.

Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados

Finalmente algumas considerações sobre a Proposta de Lei do governo.

A noção com que se fica, logo após uma primeira leitura é que o PSD não aprendeu com a sua própria história.

O PSD extinguiu em 1997 o Conselho das Comunidades Portuguesas contra a vontade expressa dos emigrantes.

Em 1990, com o decreto-lei n.º 101/90 criou uma estrutura governamentalizada que nunca funcionou porque os emigrantes portugueses e as suas organizações nunca com ela se identificaram.

Em 2002, a Proposta de Lei do governo cai exactamente nas mesmas tentações.

Perante uma estrutura de cúpula, já por isso redutora e de alcance muito restrito, vinculada a uma reunião de 4 em 4 anos, o governo aproveita para diminuir ainda a sua autonomia, tutelando claramente o seu funcionamento.

Vejamos alguns exemplos.

Na actual lei o Conselho, reunido em plenário, marca a data em que decorrem as eleições para o mandato seguinte.

De acordo com a Proposta de Lei passa a competir ao governo, particularmente à tutela, a marcação e a organização das eleições.

Na actual Lei o Conselho reúne sob a forma de plenário em Portugal, de 4 em 4 anos e, extraordinariamente, quando convocado pela tutela.

De acordo com a Proposta do Governo, o Conselho só reúne quando convocado pelo governo.

O governo quer perder mais uma oportunidade de criar as condições mínimas e indispensáveis à audição dos problemas concretos dos emigrantes portugueses.

Sem assegurar essas audições, não será possível encontrar respostas concretas para as questões concretas.

Muitas foram as promessas formuladas pelo PSD, ao longo da campanha eleitoral.

Algumas já foram renegadas, esquecidas ou silenciadas pelo actual Governo.

Hoje estão criadas as condições para que assim não seja.

Só num quadro de ampla participação democrática é possível equacionar políticas e medidas concretas relativas ao ensino da língua portuguesa, à difusão da cultura, à reestruturação da rede consular, ao apoio social, ao movimento associativo, à igualdade de tratamento ou à defesa dos direitos adquiridos pelos emigrantes portugueses nos países onde residem e onde trabalham.

É disto que se trata.

E por isso é tão importante uma estrutura capaz de potenciar a intervenção destes portugueses sem nenhuma instrumentalização.

Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados

Estamos disponíveis para em sede de especialidade e no decurso de uma reflexão ampla e aberta discutir todas as iniciativas legislativas.

A matéria em causa exige na nossa opinião este procedimento.

Disse.