Professores comunistas pronunciam-se sobre questões educativas
Comunicado à Imprensa
29 de Setembro de 1998
1. A reunião nacional de quadros professores
comunistas, realizada em Coimbra no passado dia 26, ocorreu num momento em que
estão ainda bem nítidas as análises recentemente feitas ao sistema educativo
português, corporizadas em relatórios assumidos por instituições de inquestionável
rigor e competência. De entre os "males" diagnosticados, dois merecem particular
atenção: continua a ser elevadíssimo (cerca de 30%) o número de jovens que abandona
a escola sem concluir a escolaridade básica obrigatória e a qualidade das aprendizagens
dos que permanecem no sistema é baixa e está longe de corresponder às exigências
crescentes das novas sociedades. Se é verdade que esta situação não é nova,
antes resulta de distorções, atrasos e negligências de muitos anos, há também
que sublinhar que o actual Governo, nos três anos que já leva de exercício,
não mostra vontade e decisão políticas de atacar com energia e clareza as causas
deste fracasso.
Na reunião nacional de professores comunistas foi considerado que os actuais
modelos e práticas de formação dos professores para todos os níveis de ensino
se revelam inadequados e incapazes, pelo que urge repensá-lo sem subordinação
a estreitas visões de pseudo-poupança nem à força de "lobbies" instalados.
Os professores comunistas alertam para que nada se ganha, de facto, com o mascarar
da realidade, como se os "dados estatísticos" fossem o primeiro e grande objectivo
das políticas educativas. Um sucesso escolar "estatístico" baseado na desqualificação
das aprendizagens, na quebra de qualidade das práticas e da exigência pedagógicas
é um logro intencional. Não é, de certeza, o caminho para uma educação para
o futuro. Neste aspecto, o governo do PS não se distingue dos governos anteriores.
A melhoria das aprendizagens exige a generalização do uso das novas tecnologias
de comunicação (e um especial cuidado neste campo deve ser dado à formação dos
professores) e supõe a generalização dos laboratórios e instalações para as
disciplinas tecnológicas e experimentais. Mas não pode esquecer-se que a Educação
deve ser sempre uma educação para a cidadania. Os professores comunistas consideram
intolerável a indefinição e o protelamento em que caiu a área de Desenvolvimento
Pessoal e Social (DPS), área que deveria ser obrigatória e não uma mera alternativa
à formação religiosa.
Os professores comunistas consideram que a escola única de 9 anos é uma conquista
cultural e social que não deve ser posta em causa, sem prejuízo de soluções
adequadas para situações excepcionais. Mas sublinham a necessidade de desenvolver
a pluralidade de "caminhos" para os alunos do ensino secundário (10-12 anos).
O ensino tecnológico e as escolas profissionais não podem continuar a ser parentes
pobres esquecidos e marginais do sistema educativo. Sem questionar o papel que
as iniciativas particulares podem assumir neste domínio, o PCP sublinha a necessidade
da escola pública assumir, nestas áreas, o seu papel fundamental e insubstituível.
A melhoria da qualidade das aprendizagens é ainda condição necessária para o
êxito do alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos, que o PCP há
vários anos tem sustentado.
2. Na reunião nacional de professores comunistas
foi sublinhado o facto de à escola actual ser também pedido que exerça uma acção
determinante no combate à exclusão social (consequência de graves carências
económicas, sociais, afectivas e familiares) e de desencadear acções de ocupação
de tempos livres originados pela crescente ausência dos pais trabalhadores.
A satisfação destes papeis, além de condições de financiamento que não têm sido
considerados, exige o reforço da autonomia e da capacidade de decisão e organização
das escolas, autonomia que o modelo de gestão imposto pelo Ministério da Educação
realmente não promove. E que é claramente posto em causa pelas tentativas de
insustentável controlo burocrático de que o recente despacho 511/98 é um triste
exemplo.
3. Os professores comunistas alertam para a necessidade
de revalorizar o papel social da profissão docente. Não faz sentido sublinhar
a importância da Educação e ao mesmo tempo desincentivar a escolha da profissão
docente pelos jovens estudantes e não apoiar devidamente os que a exercem. Neste
domínio, o actual Governo nada fez de relevante. E os professores continuam
a ser os únicos responsabilizados pelo fracasso do sistema, como se as medidas
de política educativa do Governo, traduzidas nas deficientes condições de trabalho,
na falta de recurso e em medidas de poupança forçada, não fossem a raiz de muitas
das deficiências que o sistema escolar apresenta. Por isso se reclama que aos
professores e aos educadores seja reconhecido o elevado valor social da sua
função, traduzido por uma carreira aliciante e por salários adequados às exigências
e à função social da sua profissão. E se encara com apreensão a postura e as
propostas que o Ministério da Educação tem apresentado para a revisão do diploma
que consagrou, há nove anos atrás, sob o profundo protesto dos professores,
a estrutura da carreira docente e respectiva grelha salarial.
No âmbito das carreiras também foi criticado o facto de o Ministério da Educação
não estar a negociar de acordo com as expectativas criadas aos docentes do ensino
superior. Foram ainda analisadas algumas questões fundamentais deste grau de
ensino, nomeadamente a necessidade de uma nova lei do financiamento, as deficientes
condições de trabalho, as preocupantes taxas de insucesso escolar, a manutenção
do numerus clausus, a persistência de discriminações económicas e sociais no
acesso a este grau de ensino.
4. Na reunião nacional de professores comunistas
foi considerado indispensável a assunção de responsabilidades por parte de todos
os presentes no sentido de um empenhamento reflexivo e activo em defesa não
só da qualidade do ensino e de uma reforma educativa que se torna cada dia mais
urgente, visando o sucesso educativo dos alunos, numa escola pública e democrática,
mas também de uma política educativa que valorize a profissão docente e que
dote o país de um sistema educativo, assente em princípios descentralizadores,
que permita incrementar a gestão democrática das escolas, a sua autonomia dos
professores que nelas trabalham.
Na reunião foi destacada a necessidade de os professores comunistas se empenharem
num diálogo amplo e democrático com os seus colegas e outros representantes
da sociedade portuguesa, directamente ligados ao mundo da educação, no sentido
de promover um largo, sólido e diversificado movimento social em torno da defesa
de uma escola pública e democrática e de alta qualidade que possibilite o sucesso
educativo dos que a frequentam e de uma profissão docente revalorizadora prestigiada
junto de todas as classes e camadas sociais que caracterizam hoje a sociedade
portuguesa.