Regime de acesso no ensino superior
Intervenção do deputado Bernardino Soares
15 de Janeiro de 1999
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
O sistema educativo português encerra em si profundos mecanismos discriminatórios e de desigualdade no acesso e no sucesso
educativo. Não são só as dificuldades resultantes das diferentes condições socio-económicas; são também entraves do próprio
sistema, sucessivamente adoptados Por diferentes governos.
O acesso ao ensino superior é um momento em que esses obstáculos são particularmente visíveis. O regime de acesso ao ensino
superior é neste quadro uma peça fundamental e é aqui que também o Governo PS actua limitando a entrada no ensino superior
público.
A questão central nesta matéria é a orientação política em relação à questão do numerus clausus. E o Governo não quer eliminar o
numerus clausus no acesso ao ensino superior público.
E se é certo que houve um crescimento muito ligeiro das vagas do ensino superior público, especialmente no subsistema politécnico,
o número de estudantes que continua ano após ano a ficar de fora é muito elevado. De resto, seriam precisas décadas para que, a
este ritmo se pusesse fim ao numerus clausus.
Mas o Governo do PS aprimorou-se nas formas de diminuir as possibilidades de acesso ao ensino superior público. É que todos os
anos diminui o número de candidatos ao ensino superior o que demonstra que a política educativa para o ensino secundário tem
também como objectivo impedir que um maior números de alunos chegue aos graus mais elevados de ensino. É por isso que se
desvaloriza a avaliação contínua em favor das provas globais ou que se deixam degradar as condições físicas e humanas de ensino.
O regime de acesso ao ensino superior que hoje estamos a analisar demostra com clareza as intenções do Governo em relação à
questão do numerus clausus. Nem sequer adopta a formulação da Lei de Bases do Sistema Educativo, no sentido da diminuição
progressiva do numerus clausus. É inaceitável que o Governo, ao arrepio até da Lei de Bases, legisle no sentido da manutenção e do
carácter intocável das limitações quantitativas no acesso ao ensino superior.
Pela nossa parte, para além de propormos hoje a eliminação dessa norma, apresentámos já um Projecto de Lei para a eliminação
gradual mas a curto prazo do numerus clausus no acesso ao ensino superior.
Pela nossa parte não estivemos também de acordo com transferência para os estabelecimentos do ensino superior das
competências para determinar o acesso e a seriação dos candidatos a cada instituição. Nesse sentido o Governo ultrapassa mesmo
aquilo que ficou expresso na última alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo, impondo um carácter eliminatório às provas de
ingresso, o que agrava ainda mais a desvalorização do ensino secundário e concentra num só momento determinada grande parte
da decisão sobre a entrada ou não no ensino superior.
Com este regime de acesso o Governo reafirma a sua política de elitização e limitação do acesso ao ensino superior, num claro
desrespeito pelas necessidades educativas do país e pelo direito de acesso aos diversos níveis de ensino que a todos assiste.
Contra isso se bate o PCP, na defesa do direito à educação para todos.