Senhor Ministro,
Senhor Presidente,
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados,
Novo ano lectivo, novos e velhos problemas.
A abertura do ano lectivo deveria constituir num país civilizado um tempo de tranquilidade em que todos os parceiros educativos se sentissem respeitados e tivessem condições para se empenharem na concretização de uma das tarefas mais importantes da sociedade actual - a construção do acesso ao conhecimento, à formação e à qualificação de todas as crianças e de todos os jovens, através de uma escola inclusiva, não reprodutora de desigualdades e onde as questões pedagógicas fossem sempre determinantes.
Ora estes não são os objectivos do Governo e do Ministério da Educação.
E por isso, ao longo deste ano e meio de governação, a maioria PSD/CDS-PP tudo tem feito para dinamitar a escola que Abril construíu.
O Governo definiu uma trajectória de arrogância e prepotência, de voz única, a sua, onde o espaço de participação democrática dos interlocutores não existe.
E é esta actuação política, a grande responsável pela trapalhada, pelos atropelos legais e pela instabilidade que reinam no sistema educativo e consequentemente nas escolas, e mais visível no início deste ano lectivo.
O que de mais positivo acontece nas escolas, decorre cada vez mais, do empenhamento dos pais e encarregados de educação, das crianças e dos jovens e dos professores.
Têm sido eles que, no espaço educativo, têm lutado contra o empobrecimento das medidas pedagógicas e têm denunciado inúmeras artes e manhas para transformar as escolas em empresas de produção selectiva de elites privilegiadas.
E é por tudo isto que avaliar o funcionamento do sistema educativo em Portugal pelo número de escolas que abriram a 15 ou 16 de Setembro, ou pelo número de professores colocados é mera propaganda, é demagogia fácil de quem não sabe ou não quer avaliar e reflectir sobre as importantes matérias educativas que estão em cima da mesa e cujas soluções ditarão o nosso sucesso ou insucesso como país.
E a operação lançada no inicio deste ano lectivo está de tal forma fragilizada que o Governo, particularmente o Primeiro Ministro e o Ministro da Educação não conseguiram esconder as verdadeiras maleitas que afectam o sistema, apesar das pressões que a administração desconcentrada exerceu sobre os órgãos de gestão das escolas para que abrissem os estabelecimentos de ensino a 15 de Setembro.
E as escolas abriram as portas.
Agora falta iniciar as aulas.
Talvez para a semana, se os professores já estiverem todos colocados e conseguirem produzir os horários, constituir as turmas, preparar as aulas, adequar as cargas horárias antigas aos novos programas impostos pelo Governo e pôr alguma ordem nos ilegais mega-agrupamentos das escolas que o Governo, de forma prepotente, criou.
Hoje seria indispensável que o Governo
explicasse ao país porque continuam por resolver os velhos problemas
e como se justificam as novas dificuldades depois de ano e meio de governação.
Comecemos pelo desemprego docente.
Este ano, cerca de 30.000 professores qualificados para o exercício da profissão ficarão no desemprego.
Muitos deles não terão acesso ao subsídio de desemprego porque o Partido Socialista e o PSD concordaram em exigir aos docentes desempregados um tão elevado número de dias de trabalho em anos anteriores, que a maioria dos jovens professores não tem direito ao direito.
Que fez este Governo para alterar esta situação.
Nada.
Se, por exemplo, tivesse optado por melhorar a qualidade de ensino nas nossas escolas e não tivesse recusado reduzir o número de alunos por turma, e não tivesse diminuído o apoio aos alunos com necessidades educativas especiais e não tivesse recusado projectos educativos apresentados pelas escolas, o corpo docente seria rejuvenescido e estas medidas exigiriam mais professores e educadores nas escolas públicas.
No passado mês de Julho, o Governo impôs em inúmeras escolas do país agrupamentos ilegais, com órgãos ilegais, sem nenhum respeito pela opinião e vontade das escolas, das autarquias e das associações de pais.
Foram nomeadas comissões instaladoras, violando a gestão democrática dos estabelecimentos de ensino, legalmente consagrada.
A confusão foi e é total.
Há professores nomeados que nem sequer
exercem a docência em nenhum dos estabelecimentos de ensino que integram
o respectivo agrupamento.
Há educadores e professores de determinados níveis de ensino que,
sendo maioritários nos agrupamentos, não tem direito a integrar
as Comissões nomeadas pelo governo.
As escolas transformadas em sede de agrupamento viram acrescidas as suas responsabilidades mas não lhes foram reforçados os recursos humanos e financeiros.
Esta decisão ou será reavaliada com urgência, ou então poderá criar situações de ruptura com implicações gravíssimas na qualidade do ensino prestado, já no ano lectivo em curso.
Também nos últimos meses o governo determinou administrativamente o encerramento de milhares de escolas.
Naturalmente que o decréscimo dos alunos, a desertificação de algumas regiões que as opções políticas dos diversos governos ajudaram a determinar são dados a avaliar, mas não podem ser a única matriz para extinção e encerramento de estabelecimentos de ensino.
Porque o reordenamento da rede escolar não pode decorrer da poupança de recursos, mas sim de um processo sério de requalificação dos diferentes níveis do sistema.
Porque uma medida desta natureza tem que salvaguardar em primeiro lugar a segurança das crianças, particularmente do 1º ciclo, tem de garantir o acesso a outros estabelecimentos de ensino com melhores condições de sucesso escolar e tem de assegurar meios financeiros às autarquias para pôr em prática estas medidas.
Ora pouco ou nada disto foi feito.
Também as muitas crianças que deveriam ter acesso ao ensino especial, mais uma vez, foram ignoradas por este governo.
Já nem falo da legislação
que está a ser preparada e que determina que para ter acesso ao ensino
especial é necessário que a deficiência seja acentuada e
permanente.
É uma decisão política inqualificável e no Ano Europeu
da Pessoa com Deficiência é um total desrespeito pela civilização
e pelo desenvolvimento.
Segundo a Associação de Pais para a Educação de Crianças Deficientes Auditivas, o Ministério da Educação não assegurou os serviços dos intérpretes de língua gestual nas escolas do ensino primário, básico e secundário com deficientes auditivos.
Se se repetir o que aconteceu o ano passado, talvez para Dezembro estejam colocados os especialistas em, língua gestual. Poupando assim o Governo, os próximos meses.
É assim, por exemplo, na escola Básica, Quinta de Marrocos em Benfica, onde os 35 alunos, surdos profundos, não têm direito ao conhecimento, por determinação deste Governo.
Mas há outra novidade, igualmente insustentável.
O Ministro da Educação não colocou professores do ensino especial no pré-escolar, porque considera que isso é uma responsabilidade do Ministro Bagão Félix.
Enquanto as tutelas brincam asa caridadezinhas, a educação pré-escolar em Portugal passa a ser, como há 40 anos atrás, não a primeira etapa da escola básica, mas um privilégio para alguns ou uma esmola para outros.
Se a tudo isto acrescermos os custos com os manuais escolares e outro material pedagógico, será fácil adivinhar como difícil será o ano lectivo para a grande maioria dos portugueses.
Há manuais escolares com aumentos superiores a 20%
Falamos da escolaridade obrigatória, gratuita e para todos.
Mas os pais ficaram a saber que enquanto o governo não cumpre os seus deveres constitucionais, os direitos são violados e o governo propõe que as famílias recorram a empréstimos de longa duração para pagar as dívidas do estado.
Mas se é este o ano lectivo que espera os milhares de jovens e crianças portuguesas do pré-escolar ao ensino secundário, não é muito diferente o ano lectivo que aguarda os jovens do ensino superior.
Também neste sector novos e velhos problemas não resolvidos e até agravados questionam o direito à educação.
O sub-financiamento não só se
mantém, como aumentará pelo menos até 2006, por imposição
do programa de estabilidade financeira, aprovado pela maioria e pelo PS.
A situação é de tal forma grave que este ano as inscrições
e matrículas duplicaram os custos, na tentativa de encontrar recursos
financeiros disponíveis para fazer funcionar as escolas superiores.
Há até uma faculdade pública que obriga ainda ao pagamento de um extra de 1250 euros para comprar produtos médicos e instrumentos clínicos que serão usados para prestação dos cuidados de saúde nas consultas externas que a Faculdade disponibiliza.
Se a tudo isto acrescentarmos as propinas, cujo custo poderá duplicar e a insuficiente acção social escolar, o desemprego, os baixos salários, o congelamento salarial decretado pelo Governo, não será difícil adivinhar qual o futuro de um País que é já hoje aquele que possui a mais baixa taxa de diplomação.
No entanto, Portugal gasta menos de metade da média da OCDE com o Ensino Superior.
E a desorientação é tanta que se reduziram milhares de vagas no Ensino Superior Público e Privado em nome da redução do número de alunos, mas, ao que se sabe, a Universidade da Madeira foi a única que viu acrescido o seu número de vagas, apesar de ter ficado com um quarto de vagas por preencher em 2002/2003.
E a ciência e a investigação também não fogem à regra da redução de custos.
A Associação de Bolseiros de Investigação Científica denuncia que pela primeira vez o número de bolsas ficou abaixo de mil.
Assim se vê como é falso o discurso da prioridade ao investimento na qualificação dos portugueses.
Senhor Presidente
Senhor Ministro
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados
Novo ano, novos e velhos problemas.
Novo ano, educação mais cara para os portugueses.
Novo ano, ataque à Escola Pública, à gestão democrática, aos direitos dos trabalhadores docentes e não docentes.
Novo ano, menos recursos humanos e financeiros.
O País pagará caro por esta política.
Porque o desenvolvimento custa dinheiro.
Disse.