O ensino superior público e a
ciência e tecnologia
Intervenção da Deputada Luísa Mesquita na Assembleia da
República
21 de Fevereiro de 2003
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhoras Deputadas,
Coloco-lhe algumas questões que me parecem determinantes para sabermos se o Governo tem ou não tem alguma política relativamente a duas áreas cruciais para o desenvolvimento do País que são o ENSINO SUPERIOR PÚBLICO E A CIÊNCIA E TECNOLOGIA para além do aumento das propinas e do estrangulamento das instituições de Ensino Superior e de Investigação.
O Senhor Ministro está quase há um ano em funções e tem-se limitado a repetir o preocupante diagnóstico destas áreas sem conseguir adiantar uma linha relativamente às políticas que tem para estes sectores.
A sua acção tem estado reduzida à azáfama dos cortes orçamentais, sustentada por acusações e suspeições, aos docentes, aos alunos e aos responsáveis das instituições quer de ensino, quer de investigação.
Comecemos pelo Ensino Superior.
Não por aquilo que faz mas por aquilo que vai dizendo na comunicação social o Senhor Ministro demonstra algumas dificuldades em compreender que, em termos constitucionais, o ensino superior é um bem público de acesso universal e não um reino privado de trânsito facilitado a algumas elites financeiras.
E porque é um bem público, exige do Governo a responsabilidade social do seu funcionamento, da sua qualidade e do seu financiamento.
O Senhor Ministro tem vindo a pôr em causa a gestão e a credibilidade das Instituições de Ensino S. Público, ignorando os constrangimentos financeiros que os Governos do PS E do PSD têm decretado.
Hoje existe uma fórmula de financiamento que pôs fim a compadrios e à ausência de rigor na afectação dos dinheiros públicos.
A fórmula deve ser aperfeiçoada no sentido da maior objectividade, transparência e convergência, o que implicará a ponderação de outros indicadores para além dos existentes.
E o Senhor Ministro sabe o que pretende alterar?
A segunda questão prende-se com os objectivos da Lei recentemente publicada.
Uma lei musculada que centraliza na tutela todos os poderes para agir e que abre, escandalosamente, a porta ao financiamento do ensino privado com verbas do Orçamento de Estado.
Considera ou não o Senhor Ministro que o desenvolvimento, o ordenamento e a qualidade do Ensino Superior têm que ter como objectivo um verdadeiro sistema nacional público de Ensino Superior, capaz de responder às necessidades sentidas e antecipáveis do País e simultaneamente criar condições para a mobilidade entre áreas e níveis.
Ainda de acordo com a mesma lei o sistema actual do Ensino Superior é binário.
Erradamente, na nossa opinião.
E coloco já a terceira questão.
Porque não um único sistema?
Com igual exigência de qualidade
Com igual dignidade
Com igual acesso a recurso
Não considera o Senhor Ministro que a diversidade se deveria colocar ao nível de cada uma das instituições, sem as discriminações existentes?
Não considera o Senhor Ministro que a articulação em rede do ensino Universitário e Politécnico, quer no âmbito territorial, quer no âmbito temático constituiria uma importante resposta à racionalização e à partilha dos recursos humanos e financeiros.
Finalmente a questão da autonomia das instituições.
Tem vindo o Senhor Ministro a afirmar que é preciso rever a autonomia e acrescentar-lhe a responsabilidade.
Considera ou não que as autonomias administrativa, financeira e patrimonial devem ser preservadas?
Devem ou não ser alargadas aos Institutos Superiores Politécnicos?
Nós consideramos que sim, assegurando e enunciando os critérios e a existência de recursos internos para o seu exercício.
Considera ou não o Senhor Ministro que as dificuldades existentes se prendem particularmente com a gestão orçamental, nomeadamente ao nível do Orçamento de Estado e não com os estabelecimentos de ensino?
Quanto à Ciência e Tecnologia Senhor Ministro começava por lhe lembrar, que em 1988, se consagrou em lei que no prazo de 10 anos a despesa nacional de I&D deveria atingir 2,5% do PIB.
Estamos em 2003, já lá vão 15 anos e o seu governo decretou a diminuição, apesar de estarmos muito longe desse nível de despesa.
Só os Laboratórios de Estado levaram uma redução em termos reais de 15%.
Foi suspensa a autonomia financeira sem nenhum respeito pelos compromissos nacionais e internacionais assumidos pelas instituições.
A obsessão das restrições orçamentais levou à fusão inexplicável de alguns institutos. E parece que outros estão na calha
Há alguma avaliação posterior às fusões, dado que anteriormente não foi feita? Quais os resultados?
Vai ser reduzido o número de trabalhadores que vêm de anteriores institutos agora fundidos, e colocados no desemprego?
E porque de trabalhadores contratados se trata, vinculados precariamente à Administração Pública, quais foram os esforços que o senhor Ministro desenvolveu junto do seu governo e particularmente do Ministro do Trabalho para integrar na listagem vinda a público, medidas sociais de apoio ao pessoal docente do ensino superior e ao pessoal de investigação que o Senhor Ministro decida despedir ou leve as instituições a fazê-lo por falta de meios.
Não pensou nisso.
Nós pensámos e apresentámos ontem um projecto de lei que garante o subsídio de desemprego a estes trabalhadores.
Terceira questão, Senhor Ministro.
Como deverá saber foi realizada uma avaliação externa e independente às Instituições Públicas de I&D que aconselhava o governo a tomar algumas decisões.
Ou entendia que estes institutos não faziam falta e portanto deixá-los-ia desaparecer por si, ou então se considerasse que deveria manter estas infra-estruturas teria de investir a curto prazo.
No último relatório de Março de 2001 apontavam-se duas prioridades:
• Reforço da autonomia das instituições
• Necessidade urgente de rejuvenescer e aumentar os recursos humanos, pondo fim ao congelamento de novas admissões.
Porque razão o seu governo fez exactamente o contrário.
Retirou a autonomia às instituições.
Extinguiu e fundiu institutos com um único objectivo – reduzir o investimento e os recursos humanos e financeiros – .
Finalmente Senhor Ministro penso que saberá que os bolseiros de investigação constituem uma parcela fundamental dos recursos humanos disponíveis e que asseguram cada vez mais, o regular funcionamento das Instituições de I&D.
O Presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia admite que os bolseiros devem constituir metade, pelo menos, dos recursos humanos do sistema científico.
Sabe quantos bolseiros existem em Portugal a responder a necessidades permanentes do sistema?
E sabe naturalmente que os bolseiros possuem um estatuto que lhes nega direitos sociais como por exemplo, as férias.
Não considera o Senhor Ministro que este estatuto tem que ser urgentemente alterado, porque indigna é a situação dos bolseiros de investigação.
Ou o Senhor Ministro subscreve a afirmação do seu Secretário de Estado que afirmou – que os bolseiros “devem ir à vida”.
Disse.