Autoriza o Governo a legislar em matéria de direitos dos consumidores de serviços financeiros, comunicações comerciais não solicitadas, ilícitos de mera ordenação social no âmbito da comercialização à distância de serviços financeiros e submissão de litígios emergentes da prestação a consumidores de serviços financeiros à distância a entidades não jurisdicionais de composição de conflitos, a fim de transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2002/65/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Setembro de 2002, relativa à comercialização à distância de serviços financeiros prestados a consumidores
Intervenção de Agostinho Lopes
19 de Janeiro de 2006

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

Uma nota prévia ao debate desta proposta de lei.

Dado tratar-se de matéria directamente relacionada com os direitos dos consumidores e se a listagem de entidades referidas na exposição de motivos da proposta de lei está conforme com as audições realizadas, julgamos que teria sido adequada a audição directa e explícita das associações específicas de defesa dos consumidores.

O Governo dirá, em sua defesa, que essas associações foram ouvidas no quadro da audição do Conselho Nacional do Consumo, mas, à semelhança de outras entidades presentes nesse Conselho, teria sido curial, na nossa opinião, ouvi-las, como referi, de forma directa e explícita, até porque, no próprio articulado do anteprojecto de decreto-lei que vem anexo à proposta de autorização legislativa se reconhece a estas organizações de defesa dos consumidores legitimidade activa para poderem requerer a apreciação da conformidade legal da actuação de um qualquer prestador de serviços financeiros.

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

Importa, entretanto, sublinhar o nosso acordo quanto aos princípios gerais que presidem ao conjunto de normas que o Governo pretende integrar na legislação relativamente aos direitos dos consumidores de serviços financeiros, quanto ao regime legal a observar pelas comunicações comerciais não solicitadas e quanto à definição dos ilícitos de ordenação no âmbito da comercialização à distância da generalidade dos serviços financeiros.

Aliás, a legislação que o Governo pretende agora produzir vem apenas colmatar uma evidente lacuna que subsiste desde que entrou em vigor o Decreto-Lei n.º 143/2001, o qual introduziu normas de protecção dos consumidores nas relações comerciais estabelecidas e contratualizadas à distância para a generalidade dos bens e serviços, mas que, então, deixara sem qualquer enquadramento legal a comercialização em idênticas circunstâncias dos serviços financeiros, apesar de estes, pela sua natureza desmaterializada, constituírem, porventura, alvo privilegiado desse comércio à distância.

Neste contexto, o Governo vem agora propor, entre outras medidas, que as comunicações à distância passem a ser objecto de assentimento prévio dos consumidores, que as informações comerciais de qualquer natureza sejam produzidas obrigatoriamente em língua portuguesa e que recaia sempre, e de forma irrenunciável, sobre o prestador do serviço o ónus da prova do cumprimento das obrigações de informação perante os consumidores.

Para além de um conjunto preciso de normas de observação obrigatória, que, como já foi sublinhado, integra um vasto leque de informações a prestar para o estabelecimento de um contrato desta natureza, os consumidores passarão ainda a ter direito à resolução livre da generalidade dos contratos estabelecidos à distância, sem que seja necessária a indicação de motivo especial e sem que haja lugar a qualquer tipo de penalização ou de indemnização, bastando para o efeito que tal resolução seja comunicada em prazos razoáveis, entre 15 e 30 dias.

Não obstante o acordo genérico que nos merecem os princípios gerais invocados para a introdução na legislação deste conjunto de normas, há alguns aspectos que, em nossa opinião, devem ser melhorados ou integrados para optimizar o futuro enquadramento legal.

Uma primeira nota tem a ver, precisamente, com as excepções criadas ao princípio da livre resolução contratual. Não se entende por que fazem, por exemplo, parte destas excepções — artigo 22.º do projecto de decreto-lei — os contratos de crédito que envolvam, a diversos títulos, bens imobiliários.

Uma segunda nota tem a ver com o exercício cabal e eficiente das competências fiscalizadoras por parte das diversas entidades a quem essas competências estão cometidas, cujas obrigações para uma ampla publicitação das respectivas acções não estão sequer contempladas, mormente quanto à necessidade de elaborar e publicitar relatórios dessa actividade fiscalizadora. Noutro plano, também não estão previstas obrigações precisas a desenvolver em matéria de publicidade e de informação pública dos novos direitos dos consumidores criados por esta legislação, da qual, quanto a nós, depende muito do seu êxito e utilidade.

Uma terceira e última nota tem a ver com os meios para a resolução extrajudicial de litígios, cuja criação fica prevista e é anunciada no projecto de decreto-lei, mas sem que haja qualquer compromisso sobre prazos para a respectiva concretização, o que, na realidade, pode comprometer boa parte da eficácia do edifício normativo que agora se pretende criar.

Resolvidas que estejam as questões enunciadas — tudo depende, naturalmente, da abertura do Governo e da maioria que o suporta —, consideramos que o conjunto de regras a introduzir para a defesa dos consumidores dos serviços financeiros estabelecidos à distância poderão merecer o nosso acordo.