Sport TV
Intervenção do deputado António Filipe
24 de Setembro de 1998
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
De tudo o que se tem dito e escrito à volta do aparecimento de canais de televisão codificados e da transmissão de acontecimentos desportivos, num debate a que tem sobrado em demagogia o que tem faltado em seriedade e rigor, importa salientar dois pontos que são aqueles que, do nosso ponto de vista, estão verdadeiramente em causa:
Primeiro ponto: O Governo decidiu patrocinar em Portugal a instalação de portagens nas televisões. Com esta novidade, que para o Secretário de Estado nos coloca no pelotão da frente em matéria de quem quer televisão que a pague, os portugueses, que estavam habituados a ver televisão em regime aberto, suportando apenas os custos da difusão por cabo, caso quisessem e pudessem optar por esse tipo de serviço, passaram a ter de pagar mais, para ter acesso aos novos canais, suportando um custo que, se para os assinantes da televisão por cabo está longe de ser meramente simbólico, já para quem o não seja, se afigura manifestamente dispendioso.
Nada temos a objectar quanto à existência de canais temáticos, destinados a corresponder especificamente ao gosto de determinados sectores do público por determinado tipo de programação, seja em matéria de cinema, de desporto, de programação musical ou de divulgação cultural ou científica.
Não pomos sequer em causa a legitimidade da existência de canais codificados, que aliás a legislação aprovada pelos Governos do PSD já previa, desde que tal existência se traduza num acréscimo da programação disponível e não seja assegurada à custa da subtracção de programas anteriormente oferecidos por canais que emitem em regime não condicionado.
A questão, para nós, não está na lei da televisão, nem sequer na existência de canais codificados, embora não tenhamos qualquer simpatia por essa opção. O que não é admissível é a opção do serviço público de televisão de abdicar da sua programação, por forma a obrigar os utentes a pagar algo que até à data era transmitido sem encargos.
Vêm agora o Governo e a RTP afirmar que nos últimos anos o serviço público de televisão transmitiu futebol a mais e não é essa a sua vocação. Não discutimos isso. Mas não deixa de ser curioso que tais concepções só tenham vindo ao de cima depois da RTP se ter envolvido no negócio da televisão codificada, e que se tenha transformado hoje em deplorável aquilo que até à época passada era uma boa forma de enfrentar a concorrência.
O que é deplorável é que a empresa concessionária do serviço público de televisão, com a benção do Governo, se tenha metido num negócio que a leva a alterar a sua programação, em função, não daquilo que considera mais adequado, mas de interesses comerciais que a envolvem e que são estranhos ao serviço público que lhe compete assegurar.
Uma outra questão que tem sido suscitada é a das condições de igualdade de acesso aos novos canais codificados, na medida em que para os subscritores da TV por cabo esse acesso é menos dispendioso do que para os restantes cidadãos, obrigados a recorrer a parabólicas.
Esta disparidade é real e suscita uma preocupação legítima. Só que a sua resolução não passa por falsas soluções, estilo "bacalhau-a-pataco" como a que o PSD agora tirou da cartola, de pretender obrigar a Sport TV a dar parabólicas de borla, a quem não tenha acesso à televisão por cabo.
A proposta do PSD assenta no tremendo equívoco de confundir o operador de televisão com o transportador do sinal através das redes de televisão por cabo, que são realidades absolutamente distintas. Qualquer novo canal de televisão destinado a emitir por cabo, de âmbito nacional, está à partida apto a emitir para todos os que, em função da capacidade de cobertura das empresas que asseguram o transporte do sinal por cabo, a ele tenham acesso e, para além disso, queiram e possam pagar esse serviço. A questão tem que ver sobretudo com a capacidade e/ou a vontade das empresas autorizadas a assegurar a televisão por cabo (cujas autorizações não têm âmbito nacional, antes correspondem à soma das autorizações concedidas a nível regional) para cobrirem efectivamente a generalidade da população da área que se comprometeram a abranger.
E isto não diz respeito apenas aos canais codificados. É inquestionável que quem tem acesso às redes de televisão por cabo pode aceder a um conjunto significativo de canais de televisão em melhores condições de custo e de recepção, incluindo não apenas canais de desporto, mas também canais temáticos de diversa natureza e canais generalistas de outros países. As empresas que obtiveram do Estado a autorização para a distribuição da televisão por cabo em determinada região devem assegurar a respectiva acessibilidade à generalidade da população abrangida. E deve o Estado assegurar, não apenas que o território nacional fica adequadamente coberto, mas que as empresas autorizadas cumprem efectivamente as obrigações que assumiram.
Esta é uma questão que nos preocupa e que deveria preocupar o Governo e o PSD. E vamos por isso propôr que, em audição parlamentar, nos sejam dadas informações rigorosas quanto ao grau de cobertura do território nacional pelas redes de televisão por cabo e quanto às medidas que estão a ser encaradas para que a generalidade da população tenha, a breve prazo, acesso a essas redes.
Uma palavra final, quanto ao problema das transmissões desportivas nacionais para as comunidades portuguesas. Reconhecemos obviamente a sua importância e pensamos que essas transmissões devem em qualquer situação, ser salvaguardadas. Em directo ou em diferido, conforme se revelar mais adequado. É que não ignoramos que nem todos os emigrantes portugueses residem no mesmo fuso horário e que, evidentemente, as horas que convém a uns, seguramente não convém a outros.
Disse.