O PCP continua a considerar como um pilar estratégico da política de Defesa Nacional a doutrina constitucional que circunscreve defesa nacional e segurança interna como realidades diferentes, apesar do enfoque que os ideólogos do “bloco central” têm dado ao conceito de segurança nacional, com o objectivo de o tornar realidade. Esta continuada e persistente tentativa de mistura de conceitos, subvertendo o quadro constitucional, procura sustentação em compromissos externos como o Conceito Estratégico da Nato, a continuada política de militarização da Europa ou as medidas de carácter político-militar já tomadas pela UE e outras que se anunciam. No fundo, compromissos externos que espartilham a nossa estratégia e que tudo justificam como é o caso do envio do contingente militar para o Afeganistão, de costas voltadas para a AR e demonstrando que, afinal, sempre há dinheiro para alguma coisa e que as missões militares no estrangeiro não são atingidas pelas restrições orçamentais. Diz-se que projecta a imagem de Portugal, argumento que, por exemplo, já não se aplica quando se trata do ensino e divulgação da língua portuguesa no estrangeiro ou do funcionamento dos consulados e outras representações diplomáticas onde a diplomacia económica parece ter dado lugar à economia da diplomacia.
Atingidos são os trabalhadores, em particular os da administração pública e respectivos corpos especiais designadamente os militares, sobre quem recaem drásticos sacrifícios, envoltos numa operação de manipulação da opinião pública, procurando atirar trabalhadores do sector privado contra os da administração pública e os cidadãos contra os juízes, os professores, os agentes das forças de segurança e os militares.
No caso das Forças Armadas, a concretizarem-se as medidas de combate
ao défice anunciadas pelo Governo elas consubstanciam, de forma mais
ou menos subtil, a equiparação do estatuto dos militares ao regime
geral da função pública, uma situação perigosa
do ponto de vista conceptual e geradora de instabilidade na instituição
militar.
Não se podem manter especiais deveres e suprimir direitos nem equiparar
funções militares a civis sem pôr em causa o Estatuto da
Condição Militar e abalar, ainda mais, a coesão e a estabilidade
das Forças Armadas.
A construção do edifício não começa pelo telhado, por isso não eram estas as medidas que os militares esperavam e que a instituição necessita.
As expectativas não estavam no estrangulamento das carreiras, na desarticulação
das áreas da segurança social e da saúde nomeadamente da
medicina militar e no congelamento de remunerações e suplementos.
Será mesmo caso para perguntar ao Governo se ao suspender, durante dois
anos, o pagamento do subsídio da condição militar tenciona
também suspender a condição militar durante o mesmo período?
Quanto ao sistema de avaliação de mérito dos militares
trata-se de um caso paradigmático, porque aqueles que nos últimos
dez anos não conseguiram fundir num único sistema os três
existentes, na Marinha, no Exército e na Força Aérea, o
que certamente seria mais fácil dados os pontos em comum, pretendem agora,
como que por um toque de mágica, integrá-los num sistema mais
global de avaliação de desempenho da Administração
Pública.
As expectativas estavam na reorganização das Forças Armadas,
na reformulação e modernização de vários
instrumentos nomeadamente de âmbito estatutário e regulamentar,
no implementar a reorganização operacional, a racionalização
do dispositivo e a reestruturação dos sistemas de saúde
e de ensino militar.
Por tudo isto tem razão de ser a inquietação que os militares e as suas associações vêem manifestando nomeadamente em diversas iniciativas públicas!
Mas, como se chegou aqui, a esta crise nas Forças Armadas e no País?
De quem são as responsabilidades?
É verdade que o Primeiro-Ministro, o Ministro da Defesa e outros ministros
deste Governo não são os mesmos dos governos de Guterres, mas
o Partido Socialista é só um e tem de responder pelas políticas
que promove. Quatro exemplos que podiam ser quarenta:
- Não sabia o PS, quando aprovou o fim do SMO, as consequências dessa decisão nomeadamente no plano financeiro?
- Não sabia o PS, quando o Governo de Guterres fez o negócio com o CDS/PP que levou Paulo Portas a aprovar a Lei de Programação Militar (LPM) e os socialistas, como contrapartida, aprovaram a populista proposta do líder do CDS “das pensões aos ex-combatentes”, que era impossível pagar e que nem sequer era possível estimar os custos?
- Não sabia o PS, quando o Governo de Guterres comprou aos EUA os aviões F 16, tão velhos que vieram encaixotados, que fazer o upgrade destes aviões custava mais de 60 milhões de contos? E não sabia quanto ia custar isto é, quanto vai custar a sua manutenção, se e quando estiverem operacionais bem como a formação dos respectivos pilotos? E quando comprou estes aviões para constituir uma 2ª esquadra de F 16 não sabia já das dificuldades financeiras para assegurar a manutenção plena da 1ª esquadra?
- Não sabia o PS, quando aprovou (com os votos do CDS) a LPM com o “altíssimo valor de 215 milhões de contos para seis anos, com a previsão de mais 263 milhões para os seis anos seguintes” não perceberam qual ia ser o resultado? Não perceberam que não estavam a ter em conta a realidade económico-financeira do país mas tão só os compromissos externos e os interesses dos EUA e da Nato, e não correspondia então, como não corresponde hoje, a uma visão estratégica realista para Portugal?
A culpa não pode morrer solteira porque pelo caminho houve inércia, incapacidade, falta de coragem e a subserviência do PS, PSD e CDS aos interesses das multinacionais do armamento e ao complexo militar-industrial norte-americano.
O PCP, reafirmando a sua disponibilidade para intervir num processo de reestruturação e modernização da instituição militar, assente numa estratégia de matriz nacional, manifesta a sua oposição à descaracterização do Estatuto da Condição Militar e à violação de direitos e valores que são património dos militares.