Relatório Elisa Damião
sobre ciências da vida e biotecnologia - uma estratégia para a
Europa
Intervenção de Ilda Figueiredo
20 de Novembro de 2002
Saúdo, na sua ausência, a Deputada Elisa Damião e espero a sua rápida recuperação. Mas discordo do seu relatório aqui apresentado pelo Deputado Carlos Laje. Registe-se que o relatório transcreve, na íntegra, as posições e interesses das grandes multinacionais da biotecnologia, agro-químicas e agro-industriais, como fica demonstrado se compararmos o relatório com o posicionamento da UNICE .
Ora nós defendemos a manutenção da moratória de facto , que existe desde 1998, sobre a aprovação de novos organismos geneticamente modificados (OGM) na cadeia alimentar, e rejeitamos liminarmente o apoio do relatório ao levantamento da moratória, o que consideramos um autêntico "crime ambiental ".
Para além das profundas questões éticas e de direitos humanos, relacionadas com a mercantilização e patenteação da vida e do património natural, é preciso ter em conta que a libertação de OGM no meio ambiente constitui um factor irreversível e incontrolável, com consequências directas na poluição da actividade agrícola (convencional/biológica), na regressão da bio-diversidade e efeitos incalculáveis ao nível dos ecossistemas. Isto quer dizer que não haverá a tão apregoada e falsa " liberdade de escolha ", quer para os agricultores (biológicos/convencionais), quer para os consumidores.
Por outro lado, reforça a dependência dos agricultores e das políticas alimentares dos Estados face às multinacionais. Ora, é chocante o grau de ingerência e pressão relativamente aos países em vias de desenvolvimento visando a introdução de OGM na sua cadeia alimentar. É mistificatório e inaceitável que, mais uma vez, se insista na tese de que as carências alimentares e a fome no mundo podem ter uma solução tecnológica, quando a questão, como é sublinhado em múltiplos fóruns e organizações internacionais, é política e de políticas. Basta recordar a tão celebrada "revolução verde" , de algumas décadas atrás.
Estamos empenhados na promoção do desenvolvimento científico e tecnológico da Humanidade, mas devemos sempre ter em conta o princípio de precaução. Deve, por isso, haver campanhas de esclarecimento e não de propaganda, como a apresentada neste relatório, que branqueia os riscos dos OGM, e apresenta-os sob a "capa verde", e como solução para a fome no mundo, quando se sabe que mais de 70% da opinião pública europeia rejeita/desconfia dos OGM.
A investigação em biotecnologia deve ter preponderantemente uma componente pública e ser globalmente conhecida e acompanhada pelos poderes públicos, com a acepção dos riscos e oportunidades, posta ao serviço dos povos, e não subordinada e dominada pelos interesses privados daqueles que pretendem mercantilizar tudo, incluindo a vida.