Financiamento Público de Instituições e Actividades de I&DE
Nota da Comissão para as Questões da Ciência e da Tecnologia
do PCP
2 de Março de 1998
A apreciação na generalidade do tratamento dado no Orçamento de Estado para
1998 às actividades de C&T (Ciência e Tecnologia), assente na comparação
dos valores iniciais orçamentados, para 1997 e para 1998, conduz à verificação
de que, no fundamental, se mantêm ao nível de anos anteriores
já de si muito baixo os recursos financeiros postos à disposição dos
agentes executores de actividades de I&DE (Investigação e Desenvolvimento
Experimental).
Analisando separadamente a evolução das despesas de funcionamento previstas
e a evolução do investimento (PIDDAC Tradicional e PIDDAC Apoios), e analisando,
por um lado, a evolução dos montantes orçamentados para os chamados grandes
laboratórios do Estado e, por outro, a evolução dos montantes a despender pelos
organismos financiadores de actividades de I&DE tutelados pelo MCT (Ministério
da Ciência e da Tecnologia) verbas a injectar no Sistema Científico e
Tecnológico (SCT) é forçoso reconhecer que não existem sinais claros
de se estar a avançar no sentido de mudanças significativas na situação do SCT,
situação que é reconhecidamente má, quer no plano dos recursos humanos e materiais
equipamentos e instalações escassos e envelhecidos, quer no que
respeita à organização e gestão desses mesmos recursos. Nada permite afirmar,
antes pelo contrário, que se esteja objectivamente a caminho de transformar
o frágil e desarticulado SCT nacional num sistema científico e tecnológico comparável
ao de outros países europeus medianamente desenvolvidos.
Ao mesmo tempo, confirma-se que para o Governo, a legislação em vigor, obrigando
à elaboração de um OC&T e à sua apresentação anual ao Parlamento para apreciação,
com o Orçamento de Estado, continua letra morta, parecendo confundir-se OC&T
com orçamento do MCT quando na realidade este último não chega a ser metade
do total da despesa do País com I&DE.
A análise dos números do OE mostra que o orçamento inicial para 1998 dos chamados
grandes laboratórios, é cerca de 8,5% superior ao de 1997, a preços constantes
deste último ano, atingindo quase 35 milhões de contos. As despesas de funcionamento
sobem 3% a preços correntes, o que traduzirá, se a execução corresponder ao
orçamentado, uma efectiva estagnação, com a agravante de que, prevendo-se um
aumento sensível (13,6%) das despesas com o pessoal vinculado, as transferências
de fundos do OE não acompanham esse aumento, fazendo descer, no conjunto dos
laboratórios, a taxa de cobertura das primeiras pelas segundas em cerca de 8
pontos percentuais (de 88% para 80%). Significa este estado de coisas que os
laboratórios disporão em 1998 de menos dinheiro para pagar a aquisição de bens
e serviços correntes necessários ao seu funcionamento (menos 10,5% em termos
reais) e para fazer algumas despesas de capital (menos 24%), constituindo estas,
cronicamente, uma fracção muito pequena do orçamento de funcionamento (4%, em
1998). De notar que a previsão do aumento das despesas com pessoal vinculado
contida nos valores orçamentados, deverá, no fundamental, ser consequência dos
processos de integração nos quadros do numeroso pessoal que se mantinha em situação
precária há diversos anos, designadamente, daquele com a designação de "bolseiro",
o que por si não corresponde, evidentemente, a qualquer crescimento real do
SCT.
Olhando agora para as dotações do PIDDAC, verifica-se a subida, no conjunto
dos laboratórios, de cerca de 5,1 milhões de contos, em 1997, para cerca de
7,3 milhões de contos, em 1998. Este crescimento, notável em comparação com
anos anteriores, decorre em grande parte do crescimento verificado nas dotações
do PIDDAC do INETI, que passam de cerca de 800 mil contos, em 1997, para 3 milhões
e 100 mil, em 1998. Importa assinalar, todavia, que este salto no financiamento
do INETI decorre da atribuição de fundos do PEDIP (mais 2,2 milhões de contos)
em grande parte destinados não ao INETI mas à construção de infraestruturas
do Pólo Tecnológico do Lumiar (1,5 milhões de contos). Tendo em conta esta nota,
verifica-se que o orçamento total dos laboratórios cresce apenas ligeiramente
acima da taxa de inflação (+2,3% em termos reais).
Vejamos agora como se apresenta a situação no que toca aos organismos financiadores
tutelados pelo MCT e que são, no nosso sistema, a principal fonte de financiamentos
abertos. No Orçamento de Estado para 1998, os fundos destinados a ser injectados
no SCT e que vão, na prática, beneficiar sobretudo os grupos universitários,
encontram-se, no fundamental, inscritos no PIDDAC da Fundação para a Ciência
e a Tecnologia (25,5 milhões de contos) e do Instituto para a Cooperação Científica
e Tecnológica Internacional (3,2 milhões de contos). Em 1997, apareciam ainda
no PIDDAC da extinta JNICT. Feita a comparação dos números, verifica-se um crescimento
dos valores iniciais orçamentados de 20,3 % entre 1997 e 1998 (mais 4,8 milhões
de contos). Para este crescimento é determinante a evolução da verba inscrita
para o programa PRAXIS XXI, que recebe mais 3,9 milhões de contos (dos quais
2,7 milhões de fundos europeus). Todos os outros programas vêem as suas dotações
ser reduzidas ou, nalguns casos, manter-se. Assim, o Programa de Formação e
Mobilidade de Recursos Humanos é reduzido, a preços correntes, em 50% enquanto
o Programa Base de Investigação Científica e Tecnológica cai para 1,5 milhões
de contos (menos 18%). O Programa de Cooperação Internacional em C&T mantém-se
com cerca de 3 milhões de contos, dos quais 2 milhões se destinam a ser transferidos
para o estrangeiro, principalmente para pagamento de quotizações em organismos
internacionais. O Fundo de Apoio à Comunidade Científica é reduzido em 17%,
sempre a preços correntes.
Há assim um reforço da concentração de recursos financeiros no programa PRAXIS
XXI, onde se concentram também os fundos estruturais europeus. No interior deste
programa verifica-se uma quebra de 1,8 milhões de contos na dotação para "bolsas"
que passa para 8,4 milhões de contos, e um substancial reforço dos dinheiros
a transferir para o financiamento de actividades de I&DE em instituições
particulares (de 1 para 3 milhões de contos) e sobretudo em instituições públicas
(de 3,8 para 7,9 milhões de contos). A importância do crescimento destes números
tem, naturalmente, que ser vista em termos absolutos e confrontada com a sua
pequenez. E, no caso das transferências para instituições públicas, tem o significado
de substituição de financiamentos não assegurados pelos ministérios da respectiva
tutela.
Importa ainda referir a dotação de um milhão e 500 mil contos consignada ao
"apoio à reforma de instituições públicas ou de interesse público de investigação"
que aparece inscrita no orçamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
O montante desta dotação, cuja finalidade não está clara, contribui para tornar
mais evidente a pequenez das restantes dotações, afinal destinadas a alimentar
um sistema que se admite estar em funcionamento.
Finalmente, anota-se o facto de as despesas com o pessoal dos três organismos
que sucederam à JNICT, crescerem globalmente 50% em relação à correspondente
despesa orçamentada em 1997 para este último organismo (1,1 milhões de contos
em 1998 contra 700 mil no ano que terminou).
O quadro orçamental acima descrito mostra que não há razões para esperar que
em 1998 possam ter lugar alterações significativas da situação do SCT nacional.
Como noutra ocasião foi sublinhado não é possível transformar ou dar início
a uma transformação do sistema que vise a efectiva melhoria do seu desempenho
enquanto não se manifestar vontade política de aumentar progressiva mas significativamente
o investimento no sistema dando-lhe o tratamento de excepção correspondente
à sua importância estratégica. A título de referência, seria significativo
um aumento global de 20 milhões de contos, dos quais 10 milhões como dotações
directas nos orçamentos de funcionamento dos laboratórios e outros 10 milhões
a injectar no sistema através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Só
assim será possível fazer com que vivam, em lugar de vegetar, linhas de investigação
e projectos que se arrastam penosamente ano após ano em regime de sub - financiamento
crónico.
O indispensável incremento dos recursos financeiros a disponibilizar para
fazer funcionar o sistema, e rentabilizar o dinheiro gasto, deverá ser acompanhado
de novas regras de gestão, a aplicar por gestores competentes. Importa destacar,
como particularmente importante, o estabelecimento de novas carreiras de pessoal
técnico; a possibilidade de recrutamento de pessoal dentro das disponibilidades
orçamentais e a possibilidade de realização de outras despesas correntes sem
necessidade de classificação económica a priori.
Nada disto depende ou sequer tem a ver com a mirífica reforma das instituições públicas de investigação cujo parto, difícil, está prometido para 1998 pelo MCT, depois de ter estado garantido em 1997: "em 1998, será consagrada a reforma do sistema de ciência e de tecnologia, a par da expansão e qualificação das instituições e das condições de formação e de emprego científico". Falar em consagração de qualquer coisa, sobremaneira polémica e da qual nenhuma concretização viu ainda a luz do dia, é, apesar de tudo, menos grave do que a "expansão e qualificação" que se promete a seguir de qualquer coisa mal definida numa frase em que o português escorreito que se desejaria ler se atrapalha numa construção duvidosa.
PRINCIPAIS NÚMEROS DA DESPESA E DO FINANCIAMENTO PÚBLICOS DAS ACTIVIDADES DE INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA E DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO
1997 |
1998 |
Variação |
|
"Grandes Laboratórios" | |||
Despesas de Funcionamento | |||
Pessoal |
16712 |
18987 |
+14% |
Outras |
10025 |
8541 |
- 15% |
Total Desp. Funcionamento (transfer.fundos do Orçam.Estado) |
26737 (15243) |
27528 (15678) |
+3% (+3%) |
PIDDAC | 5113 |
7344 |
+44% |
Total "Grandes Laboratórios" | 31850 |
34871 |
+9% |
Organismos financiadores tutelados pelo MCT | |||
Despesas de Funcionamento | |||
Pessoal |
678 |
1076 |
+59% |
Outras |
1962 |
1443 |
- 26% |
Total Desp. Funcionamento | 2640 |
2519 |
- 5% |
PIDDAC | |||
Progr. Formação e Mobil.Recursos Humanos | 398 |
200 |
- 50% |
Cooperação Internacional em C&T | 3014 |
3176 |
+5% |
Progr. Base de Inv. Científica e Tecnológica | 1840 |
1505 |
- 18% |
Fundo de Apoio à Comunidade Científica | 300 |
250 |
- 17% |
PRAXIS XXI | 17467 |
21374 |
+22% |
Apoio à reforma de Inst. Públ. ou de int. público de investigação | |
1500 |
|
Outros Programas e diversos | 789 |
646 |
- 18% |
Total PIDDAC | 23808 |
28651 |
+20% |