C&T - o financiamento continua a ser muito insuficiente
Nota da Comissão para as questões da Ciência e da Tecnologia do PCP
17 de Dezembro de 1996

 

A Comissão para as questões da Ciência e da Tecnologia do PCP procedeu ao detalhado estudo dos elementos de informação relativos ao financiamento público do sector da ciência e tecnologia e das actividades de investigação e desenvolvimento (I&DE), contidos na proposta de orçamento de Estado para 1997. Esse estudo mostra que não há evolução significativa do quadro orçamental determinado para essas actividades, quadro esse, sem cuja alteração, a concretização das necessárias transformações de que o sector carece, não passa de uma ilusão, alimentada aliás pelo discurso oficial, corrente mas inconsequente, que sublinha a necessidade de preencher o fosso que, neste domínio, nos separa dos países economicamente mais desenvolvidos.

Grandes laboratórios

Assim, o conjunto dos "grandes laboratórios de Estado" (1) considerados pelo Ministro da Ciência e da Tecnologia (C&T), em Março deste ano, na nota que entregou aos deputados a quando da discussão do OE para 1996, receberá em 1997, em termos reais (2), menos 7,8% do que o montante inicial atribuído no ano corrente: 31,5 milhões de contos, em 1996, contra 30,1 milhões de contos, em 1997. Estes números são globais, isto é, incluem o funcionamento normal e os investimentos do plano (PIDDAC). As transferências directas do orçamento de Estado, representam cerca de dois terços do total, tanto em 1996 como em 1997. O terço restante, respeita a receitas diversas, incluindo venda de serviços, estes, com uma quebra dos valores orçamentados, entre 1996 e 1997, próxima de 7%. O peso dos fundos europeus directamente orçamentados nos laboratórios, é pouco significativo, em qualquer dos anos (6% e 3,5% do orçamento total do conjunto dos laboratórios, respectivamente, em 1996 e em 1997).

Tudo indica que, em 1997, não só não serão resolvidos como ainda se agravarão, todos os grandes problemas com que se defrontam os laboratórios do Estado: instalações degradadas; equipamentos obsoletos; quadros envelhecidos e escassez de pessoal especializado. Para além do forte investimento em recursos materiais que é necessário, impõe-se estabilizar os postos de trabalho de centenas de trabalhadores dos laboratórios, incluindo jovens investigadores, que há anos vêm preenchendo necessidades permanentes dos serviços, em situação laboral precária.

Ministério da C&T

No que respeita ao Ministério da C&T, o orçamento que é ainda apresentado como orçamento da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT) embora este organismo tenha, recentemente, sido desmembrado, merece particular atenção.

Com efeito, a parcela dos investimentos do plano no orçamento da JNICT (3) apresenta, em 1997, um acréscimo de cerca de 4,4 milhões de contos, ou seja, um aumento, em termos reais, um pouco superior a 19%, relativamente a 1996 (4). Esta é, porventura, a alteração com mais significado, que se anuncia, na afectação pública de fundos, explicitamente destinados, no quadro orçamental em discussão, a instituições e actividades de I&DE. Todavia, apesar deste acréscimo, a variação do montante global das verbas orçamentadas, é, em termos reais, de apenas +2,4%, em comparação com 1996.

Importa sublinhar que é, fundamentalmente, nas verbas do Programa PRAXIS que o aumento tem lugar (+4,2 Mc) e que, no essencial, corresponde a um reforço dos fundos europeus que aparecem atribuídos ao Programa (+3,4 Mc) (5). Ao mesmo tempo, os fundos - estes nacionais, na totalidade - destinados a cooperação internacional, passam de 2,4 para 3 milhões de contos, destinando-se a principal fatia ao pagamento da quota do CERN. Entretanto, dois programas que, ao contrário do pagamento da quota do CERN, interessam à generalidade da comunidade científica nacional, a saber, o Programa Base de Investigação Científica e Tecnológica e o Programa de Formação e Mobilidade de Recursos Humanos, recebem, em conjunto, quase menos 1 milhão de contos do que em 1996 (3,101 Mc, em 1996, contra 2,238 Mc, em 1997). De notar, ainda, que o reforço das dotações do PRAXIS, é destinado, na sua maior parte, ao reforço de "transferências correntes" para "particulares" (leia-se: bolsas), transferências que passam de 7,5 Mc para 10,2 Mc.

Vícios de orientação

A afectação de fundos públicos para a ciência e a tecnologia, acima descrita, não esconde, mais uma vez, certos vícios de orientação que se não forem superados tornarão inviável o desenvolvimento de um Sistema Científico e Tecnológico que permita uma resposta nacional a necessidades dos sectores produtivo e dos serviços, e agravarão a desvitalização em termos científicos e técnicos, e mesmo, institucionais, de muitos serviços e organismos de Estado que realizam actividades de I&DE e prestam serviços essenciais, de elevado conteúdo científico e técnico.

É particularmente negativa a orientação que consiste em prosseguir a redução dos já insuficientes orçamentos próprios dos laboratórios e institutos, impondo o recurso à procura de financiamentos, mais ou menos aleatórios, dependentes de processos de concurso de cujo desfecho as próprias actividades correntes vão ficando cada vez mais dependentes.

Por outro lado, continua a insistir-se na institucionalização do trabalho precário através da atribuição de bolsas, sem direitos. Com efeito, as referências ao rejuvenescimento dos laboratórios, não são acompanhadas de qualquer abertura à contratação de pessoal permanente, o que é aliás confirmado pela estagnação dos valores orçamentados para as correspondentes despesas. As próprias condições de formação dos bolseiros de investigação estão postas em causa, na medida em que, proporcionalmente, se investe pouco - muito menos do que seria necessário - em instalações e em equipamentos, e também no desenvolvimento de infraestruturas técnicas, que são uma das carências fundamentais dos nossos centros de investigação.

Promessas incumpridas

Interessa ainda referir que a afirmação contida nas Grandes Opções do Plano para 1997 de que a despesa interna total do País em I&DE atingiria, em 1996, 0,9% do PIB, não tem nenhuma base objectiva. Desde logo, porque a este respeito apenas se permitem conjecturas, já que os últimos dados oficiais apurados se referem a 1992, sendo então o valor encontrado, 0,6% do PIB. O cálculo, feito, tomando os valores do orçamento de Estado para 1997; estimando em 30% do total o valor percentual da despesa correspondente às empresas e às chamadas "instituições privadas sem fins lucrativos"; e adicionando, ainda, para que a comparação com estimativas anteriores seja possível, uma parcela correspondente ao valor estimado para o financiamento de actividades de I&DE no ensino superior, chega-se, para 1997, ao índice 0,7% do PIB (6) .

A Comissão para as questões da C&T do PCP anota ainda o facto de o Governo não estar a dar cumprimento à obrigação legal de apresentar ao Parlamento um Orçamento de Ciência e Tecnologia, e, designadamente, de elaborar "uma proposta de distribuição sectorial, por ministério, do orçamento de ciência e tecnologia a integrar no Orçamento de Estado" (7). Ao contrário do que sucedeu em Março deste ano, o documento entregue aos deputados, em comissão, pelo Ministro da C&T, com data de 28 de Outubro último, é completamente omisso relativamente aos serviços e organismos não dependentes do Ministério, como se este nada tivesse a ver com aqueles.


(1) INSA, IM, IH, INIA, IPIMAR/IIPM, IGM, INETI, LNEC, ITN e IICT

(2)Considerando uma taxa de inflação de 3,25% em 1996. À excepção do INIA e do INSA, todos os laboratórios e institutos considerados apresentam dotações orçamentais ou quase iguais ou sensivelmente inferiores às dotações iniciais de 1996, com quebras que atingem mais de 20%, em termos reais, nos casos do IGM, IICT e INETI, 13% no IM, 9% no IH e 7% no LNEC

(3) O orçamento da JNICT proposto para 1997, eleva-se a 26,45 milhões de contos, dos quais 2,64 Mc são despesas de funcionamento; os valores correspondentes, para 1996, são, respectivamente, 21,98 Mc e 2,56 Mc

(4) Valor obtido comparando os valores da soma das dotações dos "grandes laboratórios do Estado" e da JNICT nos dois anos em análise: 53,51 MC, em 1996, e 56,56 MC, em 1997

(5) O montante dos fundos europeus atribuídos ao PRAXIS, passa de 9,854 Mc, em 1996, para 13,255 Mc em 1997

(6) Em anos anteriores (o último ano foi 1995) a Secretaria de Estado da C&T considerou como valor estimado para o financiamento de actividades de I&DE no ensino superior um montante correspondente a, aproximadamente, 30% da despesa total de funcionamento das universidades (96 Mc em 1997). Este valor, seria a fracção dos salários do pessoal docente correspondente ao tempo dedicado a actividades de I&DE. Para valor do PIB em 1997, tomou-se o valor adiantado pelo Governo

(7) Portaria nº 72/89 de 2 de Fevereiro, Diário da República - I Série nº 28, págs. 427-429.