Situação e Perspectivas da Política Científica e Tecnológica Nacional
Intervenção da Deputada Luísa Mesquita
9 de Maio de 2001

 

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados
Senhor Ministro,

Gostaríamos de começar por afirmar que é importante e desejamos que possa ter efeito prático na actual situação do sistema Científico e Tecnológico Nacional o debate que o governo propõe à Assembleia da República.

A Constituição enuncia no seu artigo 73º que " A criação e a investigação científicas bem como a inovação tecnológica, são incentivadas e apoiadas pelo Estado, por forma a assegurar a respectiva liberdade e autonomia, o reforço da competitividade e a articulação entre as instituições científicas e as empresas".

O fundamental está dito e escrito. Afinal o que falta é cumprir.

Também o programa do governo propõe nesta matéria, um conjunto de medidas que teriam como objectivo dar passos decisivos "para vencer o atraso científico do País" e acrescenta "O crescimento dos recursos públicos para I & D permitirá a Portugal aproximar-se, neste período, do nível médio europeu de recursos humanos em investigação".
A este propósito vale a pena lembrar o Orçamento de Estado para 2001 do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Os Laboratórios de Estado, importantes instituições públicas de Investigação e Desenvolvimento, prestadores de serviços com elevado conteúdo tecnológico em domínios tão diversos como o ambiente a saúde ou a construção civil, contaram com um aumento para 2001 de 0,6%.

As verbas orçamentais previstas não cobrem, sequer, as despesas com o pessoal permanente dos 13 laboratórios, que são assim forçados a ir buscar o resto a receitas próprias.

Quanto ao PIDDAC, decresceu de 2000 para 2001 16%, apesar das carências de investimento, quer em instalações, quer em equipamentos.

É importante lembrar também que, de acordo com as estatísticas oficiais, o peso da despesa total em I&D no produto interno bruto em Portugal só não é o mais baixo de toda a União europeia porque a Grécia nos faz companhia.

Relativamente aos recursos humanos, a leitura comparada com os nossos companheiros europeus deixa-nos em último lugar.

A verdade é de todos conhecida.
O que falta é alterá-la.

A ciência e tecnologia assumem, na nossa opinião, uma capital importância para o desenvolvimento económico e social do país, para a modernização do sector produtivo e dos serviços, para a preservação e gestão dos recursos naturais.
Ao governo competia a definição de uma política com objectivos claros, prioridades e metas, considerando as dificuldades existentes.

Algumas medidas foram desenvolvidas no sentido da formação do ensino experimental das ciências e da divulgação científica mas que não alteraram a precária situação do sector.

É evidente a carência de recursos humanos, materiais e financeiros.
Continuam por resolver sérios problemas organizativos.

Não existem mecanismos de participação efectiva na tomada de decisões, não apenas da Comunidade Científica mas também das próprias instituições e pessoas colectivas e privadas, que devem protagonizar as actividades de Ciência & Tecnologia.

A prática governativa, particularmente as estratégias anunciadas, têm sido decepcionantes e incapazes de transformar e desenvolver o sistema científico e tecnológico nacional.

E hoje a situação é de facto preocupante .
As instituições de investigação, porque demasiado dependentes dos mecanismos de financiamento de projectos através de concursos, têm vindo a perder autonomia e capacidade de programação.

Alguma legislação entretanto publicada, veio confirmar, a sua inadequação às realidades do sector.

É reconhecidamente insuficiente quer o nível de actividade das empresas, em Ciência e Tecnologia, quer a articulação das medidas de investigação com o sector produtivo, reflectindo ausência de incentivos governamentais adequados e ausência de uma verdadeira autonomia das unidades de investigação para realizarem essa articulação.

O sub-financiamento nacional à actividade científica tem vindo a acentuar-se, reforçando-se, cada vez mais, a dependência dos fundos estruturais europeus sem resultados estruturantes visíveis.

O envelhecimento dos recursos humanos quer nos Laboratórios do Estado, quer nas Unidades de Investigação Universitárias é preocupante.

O governo tem vindo a optar pela crescente precarização dos vínculos laborais, com nefastos reflexos na produtividade das instituições.

No entanto, não é por falta de avaliações, de relatórios e de repetentes propostas de intervenção que o diagnóstico da situação se mantém estagnado.

Em Fevereiro de 2000,o Partido Comunista Português realizou uma audição sobre a situação dos Laboratórios do Estado com a presença de Investigadores e Técnicos destas instituições, que confirmaram as inúmeras dificuldades com que se confrontavam diariamente, na procura de um funcionamento eficiente, capaz de responder às solicitações nacionais e internacionais.

Recentemente, em Março último, pela terceira vez, a Comissão de Avaliação Internacional, escolhida pelo governo, formulou mais um relatório que enumera todas as dificuldades, todos os constrangimentos dos Laboratórios do Estado e que constitui também um teste à política do governo, no que se refere à situação e perspectivas da Política Científica e Tecnológica Nacional.

Os resultados da avaliação permitem aferir da urgência de medidas nestas instituições, indispensáveis em inúmeras situações de prestação de serviços especializados, como por exemplo na avaliação dos recursos pesqueiros ou na informação climatológica e sismológica.

Ou em situações de emergência, como o acidente de Castelo de Paiva ou no caso do urânio empobrecido.

Ou ainda, quando se definem políticas e se tomam medidas em questões específicas como a B.S.E., e febre aftosa, a co-incineração de resíduos perigosos, e é necessário contar sempre com apoios científicos e técnicos actualizados.

É esta também a opinião dos avaliadores, quando afirmam que as mais recentes crises nacionais e internacionais demonstram a necessidade de existirem estruturas ágeis e eficientes e que o governo deverá envidar esforços para melhorar o serviço público dos Laboratórios do Estado, de modo que eles sejam capazes de enfrentar os desafios do novo século.

Muitas destas recomendações agora propostas, já o foram em 1997, quando da primeira avaliação.

Por exemplo, as Lei Orgânicas destas instituições, instrumento fundamental para melhorar o seu funcionamento, foram propostas por sucessivas avaliações, determinadas por legislação governamental e até agora, só o Laboratório Nacional de Engenharia Civil tem a lei aprovada.

As restantes estão ou em fase de consulta ou de produção e outras nem se sabe como estão.

Outros exemplos, poderíamos enunciar, do atraso na execução de medidas fundamentais, várias vezes propostas, outras tantas prometidas e sistematicamente proteladas.

No relatório da Comissão de Avaliação Internacional, a análise caso a caso, destas instituições, dá um cenário pouco atraente.

Por exemplo, a falta de recursos financeiros é preocupante no INIA, no IPIMAR, no LNIV, no LNEC, no IICT e muito grave no INSA e no IM, cujas dificuldades financeiras põem em causa as obrigações nacionais e internacionais.

Esta ausência de recursos impede a renovação de equipamento, a resposta adequada à diversidade das matérias, impede a contratação de novos quadros, em suma, paralisa o funcionamento.

Por exemplo a falta de recursos humanos científicos e técnicos e o envelhecimento dos quadros cria dificuldades ao funcionamento do IPIMAR, do LNIV, do IGM, do INETI, do LNEC e do IN.

E se este é o cenário dos Laboratórios de Estado, longe, não anda, o dia a dia dos Centros de Investigação Universitários.

Apesar da importância que todos lhes reconhecem, não têm sido objecto das necessárias intervenções.

O crescimento da despesa em I & D no Ensino Superior tem sido sobretudo determinado pelo crescimento da despesa de pessoal.

A grande maioria destas unidades conservam equipamentos e infra-estruturas de origem que, naturalmente se encontram degradadas e desactualizadas.

O actual programa, o SAPIENS, sucessor do PRÁXIS, parece ter como objectivo o financiamento de infra-estruturas e equipamentos básicos mas, em 2000, nada aconteceu e até agora nada se sabe.

Nos últimos anos têm surgido inúmeras unidades de I & D, no entanto de 1999 para 2001 o orçamento de estado não tem reflectido essa realidade, antes, abrandou o esforço financeiro.

Relativamente aos recursos humanos, há uma clara preponderância dos docentes sobre os investigadores e bolseiros.

Nestas Unidades de I & D não há , na prática possibilidade de criar emprego científico, dado que não existem quadros de investigação nem verbas para contratações.

Por outro lado, o governo tem impedido, na prática, a comunidade científica de se fazer ouvir em termos de representação institucional.

O Conselho Superior da Ciência e Tecnologia, criado em novos moldes, na anterior legislatura, há mais de 4, continua sem reunir, por não se encontrar constituído.

Cabendo nesta matéria, responsabilidades acrescidas à tutela.

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados
Senhor Ministro,

Urge formular a política nacional de Ciência e Tecnologia e concretizar medidas que tenham em conta as necessidades do país, as carências e as potencialidades do sistema.

A realidade tem demonstrado:
· a importância determinante do sector público e das responsabilidades do estado no fomento das actividades de I & D;
· a necessidade de um desenvolvimento sustentado do sistema e da coordenação dos vários sub-sistemas;
· a necessidade de mecanismos de participação democrática da comunidade científica nas definições das políticas;
· a necessidade de acrescidos recursos financeiros e humanos;
· a necessidade de uma lei de financiamento das instituições públicas de I & D, contemplando um financiamento- base regulado por parâmetros objectivos e um sistema de financiamento por contratos-programa e por projectos.

Senhor Ministro apetece-me plagiar o poeta e lembrar-lhe que os átomos não foram fabricados de propósito para si.

Já cá estavam
Estão
E estarão

Disse.