Alteração do regime jurídico da avaliação de impactes ambientais
Intervenção do deputado Pimenta Dias
31 de Março de 1999

 

Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Srªs e Srs Deputados,

A alteração do quadro legislativo nacional que regula a avaliação de impactes ambientais é uma necessidade há muito sentida. Pode-se dizer que remonta à data em que foi publicado o primeiro diploma legal sobre esta matéria.

Isto porque o Decreto-Lei nº 186/90, de 6 de Junho, para além de transpor mal para a ordem jurídica interna a directiva comunitária 85/337/CEE, cedo se mostrou desajustado à salvaguarda dos valores que pretendia acautelar, ou seja, a prevenção de perturbações irremediáveis no meio ambiente. Daí que, ao longo de quase uma década, a legislação sobre a avaliação de impactes ambientais pouco tenha contribuído para evitar erros graves e a delapidação de parte do nosso património natural e construído. E - em abono da verdade - é bom que se diga que os diversos Governos nem sempre souberam dar o exemplo.

Ao longo da VI e VII legislaturas foram apresentadas nesta Câmara - pelo PCP e o PEV, mas também pelo PS - várias iniciativas para alterar e melhorar o referido quadro normativo. Todas foram rejeitadas. Na anterior legislatura pelo PSD, na actual pelo PS. No início desta legislatura o Partido Socialista teve a oportunidade de encetar um processo de revisão da legislação sobre a avaliação de impactes ambientais, aproveitando uma iniciativa do PEV. Ao fim de dois anos de discussão, optou pela sua inviabilização. Pelo meio, o Governo lá foi fazendo uns remendos com a publicação do Decreto-Lei nº 278/97. Entretanto, perderam-se mais de dois anos.

Só praticamente no fim da legislatura é que estamos a discutir uma autorização ao Governo para legislar no sentido da alteração do regime jurídico da avaliação de impactes ambientais. Curiosamente, quando já foi ultrapassado o prazo para a transposição para a legislação interna da nova directiva comunitária. Definitivamente, este Governo e o partido que o suporta não se têm manifestado muito preocupados com a necessidade de prevenir agressões ao ambiente e garantir o equilíbrio dos ecosistemas.

Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Srªs e Srs Deputados,

Numa altura em que está em discussão pública o projecto de decreto-lei que resultará da autorização legislativa que estamos a discutir, importa balizar os aspectos que, na opinião do PCP, merecem ser considerados na revisão da legislação sobre a avaliação de impactes ambientais.

Em primeiro lugar, a necessidade dos estudos de impactes ambientais serem suficientemente credíveis. Ora essa credibilidade é tanto maior, quanto maior for a independência de quem os realiza.

Sendo o promotor do projecto o principal interessado nos benefícios que pretende retirar do mesmo é compreensível que ao promover o estudo de impactes ambientais tente desvalorizar os efeitos do mesmo no meio ambiente. É, portanto, fundamental que na elaboração dos estudos, o promotor esteja acompanhado por uma entidade independente que possa promover estudos alternativos quando as medidas de minimização propostas não salvaguardem, devidamente, os valores ambientais existentes.

Em segundo lugar, a necessidade de garantir um maior envolvimento e participação efectiva das populações na discussão pública da avaliação de impactes ambientais. Infelizmente o que tem sucedido é que a discussão pública tem sido encarada como mero formalismo legal.

Em regra, as populações interessadas só se apercebem do processo de avaliação quando é tomada a decisão sobre a execução dos projectos. Os exemplos são muitos e os resultados estão à vista de todos. Ou não foi isso que se passou com a co-incineração dos resíduos perigosos nas cimenteiras ? Ou não foi isso que se passou com a maioria de projectos sujeitos a avaliação de impactes ambientais entretanto realizados ?

É, portanto, fundamental que na discussão pública sejam envolvidas as autarquias locais e as universidades mas também as associações de defesa do ambiente e as colectividades em geral. É nestas últimas, de resto, que as populações se encontram com maior frequência e pode ser promovida a sua participação cívica.

Mas, para que as populações participem nos processos de decisão e se envolvam na sua decisão, é necessário aperfeiçoar os mecanismos de acesso e consulta aos documentos da administração e desburocratizá-los. Nesta matéria não basta legislar bem. É também necessário que os interessados conheçam os normativos legais que podem utilizar na defesa dos seus direitos.

Em terceiro lugar, é necessário que todo o processo de avaliação de impactes ambientais seja conduzido por uma comissão, que integre representantes da Administração Pública, mas também representantes das autarquias onde o projecto vai ser executado, das associações de defesa do ambiente e técnicos independentes de reconhecida capacidade.

O país não entende que continuem a ser feitos relatórios de avaliação de impactes ambientais, cujas conclusões são depois postas em causa por sectores da comunidade científica.

Em quarto lugar, é fundamental que se entenda que os impactes negativos no meio ambiente não resultam apenas de grandes projectos. Há pequenos iniciativas que por vezes causam maiores danos no ambiente, sem que os respectivos projectos sejam objecto de estudo de impacte ambiental. A valorização das autarquias locais em todo o processo pode evitar erros que, na maior parte dos casos, são irrecuperáveis.

Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Srºs e Srs Deputados,

Os valores ambientais que herdamos dos nossos antepassados têm que ser preservados e transmitidos nas melhores condições às gerações futuras. Os processos de avaliação de impactes ambientais e a forma como são conduzidos são fundamentais para atingir esses objectivos.

Para isso não basta que exista uma lei. É necessário que essa lei seja a melhor possível.

Esperamos, por isso, que o quadro normativo resultante desta autorização legislativa, não encare, como até hoje, as avaliações de impactes ambientais como meros processos burocráticos, que apenas servem para atrasar obras e empreendimentos, cujos resultados são conhecidos à partida.

Que o Governo aproveite os poucos meses que restam desta legislatura para fazer legislação que, de uma vez por todas, credibilize e dê consistência aos estudos de impactes ambientais.

Disse.