Intervenção do
deputado Octávio Teixeira

Tratamento dos resíduos industriais

25 de Fevereiro de 1999



Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

É hoje por demais claro que a decisão do Governo de optar, como forma preferencial de tratamento dos resíduos industriais perigosos, pela co-incineração em unidades cimenteiras, foi um precipitado erro.

Erro e precipitação porque não é aceitável que uma decisão desta natureza possa ser feita em cima do joelho, sem estar sustentada em estudos científicos credíveis e suficientemente aprofundados. A discussão que nos últimos tempos se travou a este nível, mostra que são diversas as opiniões sobre os riscos de perigosidade desta solução para as populações.

Há quem defenda, com argumentos técnico-científicos, que a co-incineração em unidades cimenteiras próximas de aglomerados populacionais pode conduzir à ocorrência de pesados prejuízos na Saúde Pública e no Ambiente. A possibilidade de ocorrência destes perigos deveria ter sido dirimida, no plano técnico-científico, antes de o Governo tomar a opção que tomou. E o Governo não o fez!

Mas o Governo não errou, apenas, quando fez a opção. O Governo tornou a errar politicamente ao assumir uma posição autista face à clara manifestação de vontade expressa, designadamente, pelas populações de Souselas e de Maceira e pelas autarquias respectivas.

Erro político que se agravou com o desdém com que tratou as recomendações do Provedor de Justiça e a jactância com que ignorou a Resolução da Assembleia da República, aprovada em 20 de Janeiro sob proposta do PEV, que recomendava ao Governo a suspensão do processo até que estudos credíveis fossem realizados.

Eventualmente, o Governo terá considerado que ceder à razão seria desautorizar a Ministra do Ambiente. Mas não era disso que se tratava. Aliás, se desautorização da Ministra houve, ela veio do próprio Governo, quando nos dias seguintes ao anúncio da escolha dos locais para a co-incineração, em toda a comunicação social quem apareceu a dar a cara pelo Governo foi o Ministro dos Assuntos Parlamentares e não a Ministra da tutela. Aí sim, a Ministra terá sido publicamente desautorizada.

O que estava em causa com a Resolução da Assembleia da República era o Governo ter a (sempre necessária) humildade democrática para reconhecer os erros cometidos e emendá-los. O Governo assim não o quis entender.

Por isso, natural é que agora venha ser obrigado a ouvir a Assembleia da República através de uma lei e a cumprir o que ela determinar.

Na opinião do PCP, e em perfeita coerência com toda a nossa intervenção neste processo, o que essa lei deve impor ao Governo terá de enquadrar-se no âmbito dos objectivos constantes da Resolução de 20 de Janeiro, que aqui obtiveram um alargado consenso.

Ora, contrariamente ao que é referido na exposição de motivos do projecto de lei do PSD, a Resolução aprovada não "apontou para a imediata revogação da opção pela co-incineração". Diferente e expressamente, a Resolução recomendava, apenas e tão só, a suspensão do processo.

A opção pela imediata revogação da opção pela co-incineração constava, isso sim, de um projecto de resolução do PSD ... que não chegou a ser debatido. E torna a constar deste projecto de lei do PSD.

Mas, para o PCP, ontem como hoje, se foi precipitadamente irresponsável a opção do Governo pela co-incineração sem estudos credíveis que a sustentassem, igualmente seria irresponsavelmente precipitado que, nas mesmas circunstâncias, se fizesse a opção de co-incineração nunca, em tempo algum e em local algum neste nosso País.

Ora, o PCP não alinha com precipitações e irresponsabilidades políticas. Venham elas do Governo ou do PSD!

Do mesmo modo que a posição do PCP perante a errada decisão do Governo, ao contrário do que parece ser a posição do PSD de acordo com a sua "exposição de motivos, não decorre de "a outorga das actividades (de co-incineração) às cimenteiras se traduzir na criação de um quase monopólio de facto, que se estende desde o pré-tratamento dos resíduos à co-incineração, o que manifestamente põe em causa os princípios de uma sã concorrência no mercado"!!

Para o PCP, a questão não é a de quem eventualmente vai beneficiar económica e financeiramente com a hipótese da co-incineração.

Para nós a questão de fundo, a questão central, é a de saber se a co-incineração em quaisquer unidades industriais localizadas junto de aglomerados urbanos é ou não prejudicial à saúde das populações. Se a co-incineração agrava ou não os desequilíbrios ambientais nessas localidades. Em suma, se as populações, se as pessoas, são lesadas ou não na sua qualidade de vida!

E como é isto, e só isto, que nos move, a posição do PCP é clara e transparente: votaremos favoravelmente uma lei que, por uma lado, atribua a prioridade primeira à redução, reutilização e reciclagem dos resíduos industriais e, por outro lado, que a opção a fazer sobre a forma de tratamento dos resíduos industriais remanescentes seja sustentada por estudos credíveis e sérios quanto ao seu impacto ambiental e quanto aos riscos para as populações.

Por isso nunca votaríamos uma opção cega pela co-incineração ou pela não co-incineração.

E, por isso, votaremos uma lei que suspenda o processo até que esses estudos sejam feitos, em tempo adequado, sem precipitações mas igualmente sem demoras injustificadas.

Disse.